Compra em massa de títulos pelo BCE provoca críticas
22 de janeiro de 2015O presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, manteve a palavra: há dois anos e meio, em 26 de julho de 2012, num discurso em Londres, ele prometeu aos representantes dos bancos de investimentos que faria tudo para salvar o euro.
Depois de diversas tentativas – taxas de juros quase zeradas, programas de crédito e uma gigantesca injeção de verbas – o BCE agora recorre praticamente ao último recurso: comprar em massa títulos de dívida pública dos Estados em crise da zona do euro.
Na coletiva de imprensa em seguida à sessão do conselho do BCE, nesta quinta-feira (22/01), em Frankfurt, Draghi anunciou a decisão de adquirir mensalmente títulos de Estados e empresas num valor total de 60 bilhões de euros.
"O programa vai, no mínimo, até setembro de 2016. Vamos mantê-lo, de qualquer forma, até termos alcançado de forma duradoura a meta de uma inflação em torno dos 2%", explicou o economista italiano.
Esperanças de reaquecimento
Estima-se que, com isso, o BCE estará injetando nos mercados 1,1 trilhão de euros – mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) da zona de moeda única. A fim de implementar esse gigantesco projeto, a instituição imprimirá novas células, com as quais comprará títulos de risco, por exemplo, de dívidas estatais ou empresariais. O plano é que os institutos financeiros repassem esse dinheiro às empresas e consumidores, na forma de crédito.
"O BCE tem esperanças de que isso contribua para o reaquecimento econômico da Europa", explicou o ministro alemão da Economia, Sigmar Gabriel, à margem do Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça.
"Naturalmente precisamos todos apoiar essa dinâmica", prosseguiu, e Berlim faz isso com seu respaldo ao programa de investimentos da Comissão Europeia. "Pois não se pode delegar exclusivamente ao BCE a tarefa de zelar pelo crescimento e emprego."
Mandato extrapolado?
De fato: diferentemente do americano Federal Reserve, o Banco Central Europeu tem como missão manter os preços estáveis, e não impulsionar a economia. Por esse motivo, a política monetária do BCE atrai as atenções da Corte Federal de Justiça alemã (BGH) e da Corte Europeia de Justiça, impondo a questão se a instituição não estaria extrapolando o seu mandato.
Henning Vöpel, diretor do Instituto de Economia Mundial de Hamburgo (HWWI, na sigla alemã), confirma que o BCE se impõe como uma espécie de "governo secreto da zona do euro", o que"não pode dar certo a longo prazo".
Em entrevista à DW, ele disse observar com extremo ceticismo a anunciada aquisição de títulos. Pois, além de já se ter recorrido a numerosos outros instrumentos, os juros estão muito baixos.
"E vemos que o dinheiro chega, de fato, aos bancos, mas não às empresas, através de créditos, ou aos consumidores. Nesse aspecto, é questionável se esse instrumento vai, de fato, influenciar positivamente a demanda de crédito."
O diretor do HWWI vê, como motivação para a iniciativa, antes uma tentativa de sustentar a cotação dos títulos de dívida pública, em prol de economias combalidas como a da Grécia.
"Deflação é fantasma"
O presidente da federação alemã das caixas de poupança DSGV condenou o programa do BCE como "erro", falando à emissora de TV ZDF. Pois, segundo ele, o fantasma da deflação – com sua espiral de preços em queda e retração da demanda – não se confirma na prática.
"Pelo contrário, o comportamento do consumidor privado alemão é robusto. A política dos bancos, centrais e outros, não dispõe dos instrumentos para fomentar as estruturas nos Estados-membros [da zona do euro]. Ou seja: o BCE assume uma tarefa que, na verdade, não lhe cabe."
Para aplacar um pouco seus críticos, durante o anúncio em Frankfurt Mario Draghi também enfatizou que somente uma parte dos riscos do programa recairá sobre a eurozona.
A comunidade monetária participa das garantias nas compras de títulos de instituições europeias, que perfazem 20% das aquisições. As compras de títulos estatais, por sua vez, serão proporcionais à participação dos diferentes países do euro no capital do BCE. Assim a instituição dirigida por Draghi comprará principalmente títulos públicos alemães, seguidos de franceses e italianos.