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Críticas a Nobel para Harold Pinter

Augusto Valente14 de outubro de 2005

Já é quase tradição: também em 2005 a decisão da Academia Sueca é combatida. Para parte do mundo literário, a época do dramaturgo inglês de 75 anos já passou. Além do que ele nunca haveria sido mesmo "um dos grandes".

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Harold Pinter (*1930), dramaturgo inglêsFoto: AP

A entrega do Prêmio Nobel da Literatura ao dramaturgo britânico Harold Pinter gerou polêmica nos meios literários europeus. O crítico Denis Scheck, da rádio Deutschlandfunk, classificou a premiação como uma "ofensa à literatura mundial": "É preciso considerar se não se deveria mudar o nome do prêmio para 'medalha dos saltimbancos'". Segundo o redator e tradutor, o júri "passou vergonha", pois há numerosos autores vivos que "este ano saíram novamente de mãos vazias".

Sua colega austríaca Sigrid Löffler, editora da revista Literaturen, falou de "uma escolha bizarra". Ela não teria escolhido Pinter "nem de longe – além do mais ele está demodé".

Uma opinião reforçada por Franz Wille, redator da revista Theater heute, publicada em Berlim. Segundo este, Pinter está praticamente ausente das programações teatrais alemãs, portanto este Nobel estaria chegando 30 anos atrasado. Nas décadas de 60 e até 70, seus textos forneceram importantes impulsos formais e temáticos, porém "as últimas peças estão bem abaixo em termos de qualidade", afirmou Wille.

Críticas à Academia Sueca

O periódico suíço Tages-Anzeiger considerou "peculiar" a escolha. Pinter não seria realmente um autor de porte: "Há muito ocupa um lugar na história do teatro, como irmão menor, inofensivo, de Beckett, seu modelo e antecessor como Prêmio Nobel". Censurando o Nobel em si: "As decisões estranhas, discutíveis, grotescas mesmo, se acumulam, a lista dos grandes esquecidos é cada vez maior. O prêmio tem mais de 100 anos, o estatuto da Academia, mais de 200. Ela deveria agora nos surpreender com uma auto-renovação corajosa".

O ponto de vista do holandês De Volkskrant parece expressar um preconceito básico contra o valor literário dos textos cênicos: "O comitê do Prêmio Nobel mostrou no passado que também deseja valorizar o papel social da literatura, a consciência escrita dos autores. Para tal se poderia citar numerosos contemporâneos. Porém são escritores de prosa ou poetas, até mesmo ensaístas. Mas não dramaturgos".

Alegria para os amigos

O júri da Academia ressaltara, ao justificar a escolha, que o dramaturgo "revela os abismos ocultos sob a conversa vazia do dia-a-dia, penetrando no espaço fechado da repressão". Numa entrevista à agência de notícias dpa, Marcel Reich-Ranicki, um dos críticos literários mais populares da Alemanha, confirmou essa caracterização da obra pinteriana, "a representação do cotidiano de indivíduos solitários, ameaçados por algum tipo de elementos ou poderes misteriosos e indefinidos".

Marcel Reich-Ranicki
Crítico Marcel Reich-RanickiFoto: AP

Ranicki considerou a premiação "boa, correta", embora concordando que a homenagem "chega um pouco tarde demais" para o literato de 75 anos. Trata-se de um "dramaturgo típico", que não teve sucesso apenas diante da crítica: "Sua obra não é escrita com as costas para o público".

Prêmio Nobel da Literatura em 2004, a autora austríaca de teatro Elfriede Jelinek, declarou-se "felicíssima" com a escolha do colega inglês: "Mais um de esquerda e um dramaturgo maravilhoso. Já vou começar a festejar".

Júbilo também por parte da Academia das Artes de Berlim, da qual Harold Pinter é membro desde 1982 Referindo-se ao premiado, a instituição citou o diretor teatral Peter Zadek: "Suas peças são mistérios de advertência moral, comparáveis às tragédias gregas". Günter Grass e Imre Kertész, Prêmios Nobel de 1999 e 2002, respectivamente, também pertencem à Academia de Berlim.

Profeta da resistência antiamericana

Nascido em 10 de outubro de 1930 em Hackney, Londres, Harold Pinter é autor de peças de enorme sucesso como Traição, A festa de aniversário e Volta ao lar, assim como dos roteiros cinematográficos para A mulher do tenente francês e Uma estranha passagem em Veneza.

Ao lado dos elementos existenciais, absurdos ou metafísicos de sua obra – herdados da dramaturgia do irlandês Samuel Beckett (1906-1989) –, Pinter tem se destacado pela luta contra a pena de morte, tortura, guerra e repressão. Certa vez declarou: "O futuro é o pretexto de todos os que não querem se envolver com o presente".

Para além de sua atividade literária, o dramaturgo londrino ficou notório por seu discurso de 10 de setembro de 2001, na Universidade de Florença. Ele criticara a política dos Estados Unidos, expressando "profunda repulsa" contra a superpotência, uma "máquina mundial brutal e maligna". E acrescentou, irado: "A resistência contra os Estados Unidos crescerá".

No dia seguinte – data do atentado contra o World Trade Center e o Pentágono – suas declarações tomariam caráter profético.