Criado há 10 anos, TPI não é reconhecido pelas grandes potências
11 de abril de 2012O Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia completa dez anos nesta quarta-feira (11/04). Em março último, uma década após sua fundação, a instituição emitiu sua primeira sentença, condenando o ex-líder miliciano congolês Thomas Lubanga pelo recrutamento de centenas de crianças-soldados. O veredicto foi comemorado como marco histórico por ativistas de direitos humanos.
A sentença de Lubanga finalmente fez valer a mensagem emitida ao mundo com a criação do TPI em abril de 2002, a partir de um tratado assinado por 120 Estados: a impunidade deve e pode ser eliminada. Ao Tribunal, porém, só é permitido julgar indivíduos e não Estados.
O tribunal penal independente foi fundado a partir do Estatuto de Roma, um tratado sobre o direito penal internacional. O TPI acompanha crimes de guerra, genocídios e crimes contra a humanidade. Ele entra em ação quando delitos graves não podem ser punidos em âmbito nacional ou quando Estados pedem por isso. Além disso, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) pode conferir ao TPI o mandato de persecução penal em casos individuais.
Direitos humanos x poder
"O começo foi lento e difícil", recorda-se Hans-Peter Kaul, juiz alemão do TPI. O estatuto de fundação do Tribunal foi admitido em 1998. Mas somente quatro anos depois, após 60 Estados terem ratificado o documento, ele entrou em vigor. Kaul foi um dos cinco primeiros a entrar no prédio então ainda vazio em Haia.
Entre os 120 Estados-membros do TPI estão, além da Alemanha, todos os outros países da União Europeia (UE). A lista de não membros, entretanto, mostra uma fraqueza da instituição: grandes potências como os Estados Unidos, a China e a Rússia não estão presentes. Índia, Paquistão, alguns países árabes, Irã, Israel, Sudão e Coreia do Norte também não reconhecem o Tribunal.
Já na fase da fundação do TPI, os Estados Unidos eram um dos seus principais opositores. Através de acordos bilaterais com Estados que reconheciam o TPI, o governo dos EUA tentou assegurar que nenhum cidadão norte-americano fosse encaminhado ao tribunal. Por algum tempo, falou-se em uma verdadeira campanha de neutralização pela administração Bush. Ela tinha o objetivo de impedir que países interessados em ingressar no Tribunal assinassem o Estatuto de Roma.
Foco na África
Ao longo dos últimos dez anos, o TPI – em que trabalham cerca de mil funcionários de 70 nacionalidades – abriu 28 processos. Seis deles foram suspensos. O Tribunal já analisou 15 casos em sete Estados africanos e persegue supostos criminosos em Uganda, na República Democrática do Congo, no Quênia, no Sudão, na República da África Central, na Costa do Marfim e na Líbia.
Nesses países, foram emitidos 23 mandados de prisão, mas apenas seis pessoas foram detidas. A falta de apoio dos Estados para as detenções é um dos maiores problemas do TPI. Críticos consideram o foco sobre a África restrito demais.
O argentino Luis Moreno-Ocampo, promotor-chefe do tribunal internacional, defende a instituição. A obrigação do órgão é investigar crimes que ninguém acompanha, declarou à emissora holandesa RNW.
Entretanto, o poder do TPI não tem grande alcance na África. Apesar de um mandado de prisão internacional contra ele, o presidente do Sudão, Omar al-Bashir, por exemplo, circula livremente pelo continente.
"Os governantes sabem que podem ser perseguidos caso cometam crimes", rebate Ocampo. Para o promotor-chefe, constante alvo da crítica, seu papel não é compreendido. Ele afirma que seu trabalho não é político, mas de natureza jurídica. "Tenho de esclarecer a lei a atores políticos."
Em junho de 2012, termina o mandato do polêmico argentino. A jurista Fatou Bensouda, de Gâmbia, o substituirá e assumirá o cargo de promotora-chefe. Segundo Ocampo, a africana deverá sofrer mais pressão por parte dos Estados africanos.
Primeira condenação
O processo principal contra o ex-líder congolês Lubanga havia sido aberto em 2009. Críticos reclamam da demora de todo o procedimento. "Todo tribunal dessa dimensão precisa de tempo para desenvolver seu modo de atuar", contesta Jens Dieckmann, advogado de defesa do TPI.
A condenação de Lubanga foi histórica. "Pela primeira vez, as vítimas desempenharam um papel especial em um processo penal desse tipo, foi uma situação particular. Antes de tudo, o tribunal teve de decidir sobre os direitos das vítimas, a partir de várias queixas individuais", aponta Dieckmann. Também os direitos dos advogados de defesa na determinação de provas precisaram ser esclarecidos em detalhe, antes da abertura do processo e da condenação.
Fica em aberto, porém, qual será o resultado efetivo para as vítimas após a condenação. Caso o réu não possa pagar indenizações, há um fundo disponível para isso no TPI. "Isso será mais teste para o sistema", diz Dieckmann, advogado de defesa de vítimas de seis países africanos. As vítimas não esperam apenas indenizações, elas querem que a verdade venha à tona.
O especialista em Direito Richard Dicker, da organização de direitos humanos Human Rights Watch, no entanto, adverte para a instrumentalização do tribunal: "Os governos reconheceram o papel do TPI na solução de crises e conflitos, mas alguns o tratam como um instrumento que pode ser manipulado à vontade para alcançar objetivos políticos".
LPF/dw/dpa
Revisão: Roselaine Wandscheer