Câmara aprova texto-base da PEC dos Precatórios
4 de novembro de 2021A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (04/11), em primeiro turno, o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que altera o teto de gastos e viabiliza o financiamento do Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, em ano eleitoral.
Em vitória para o governo, o texto foi aprovado por 312 votos a 144, apenas quatro votos a mais que os 308 necessários para admitir uma emenda à Constituição. Outros 57 deputados não votaram.
Após ato editado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado do governo, parlamentares em viagem autorizada pela Casa puderam votar de maneira remota, o que beneficiou a aprovação da proposta. A oposição ainda se dividiu, e somente o PDT deu 15 votos favoráveis ao texto.
Para fazer passar a medida controversa e em meio à pressão de partidos, o governo precisou fazer alterações no texto e chegou a ameaçar cortar emendas de deputados que não votassem a favor da PEC, segundo relatou o jornal Folha de S. Paulo.
O próximo passo é votar os destaques, que são sugestões de alteração em pontos do texto-base, e depois o segundo turno, o que pode ocorrer ainda nesta quinta ou na próxima terça-feira. Em seguida, a proposta é enviada ao Senado, onde precisará do apoio de 49 dos 81 senadores.
O que propõe a PEC
A PEC dos Precatórios foi uma saída encontrada pelo governo para ampliar o seu limite de gastos em 2022, ano de eleições, sem cortar outras despesas. Essa estratégia, que abriria um espaço de mais de R$ 90 milhões no Orçamento do próximo ano, é baseada em dois pilares.
O primeiro é permitir que o governo federal atrase o pagamento de algumas de suas dívidas judiciais, os precatórios. Isso ampliaria em mais de R$ 44 bilhões o espaço no Orçamento de 2022, segundo estimativas do governo.
Precatórios são dívidas do governo com sentença judicial definitiva, podendo ser em relação a questões tributárias, salariais ou qualquer outra causa em que o poder público seja o derrotado.
O segundo pilar é alterar a forma como o teto de gastos é calculado. Hoje, considera-se a inflação dos últimos 12 meses até junho do ano anterior para definir o teto do ano seguinte. A proposta do governo é considerar a inflação de janeiro a dezembro, e fazer um cálculo retroativo desde o início do instrumento de ajuste fiscal. Isso criaria uma folga de mais R$ 47 bilhões para o ano que vem.
Essas mudanças são interpretadas por operadores do mercado financeiro – dos quais muitos apostaram na candidatura de Jair Bolsonaro em 2018 pelo compromisso expresso por ele e por Guedes com o ajuste fiscal – como um desrespeito à regra do teto de gastos.
Para eles, o teto é fundamental para que o governo indique sua disposição de reduzir o déficit e seguir capaz de honrar o pagamento de sua dívida.
Por que o governo quer alterar o teto
Segundo o governo federal, cerca de R$ 50 bilhões da folga no Orçamento devem ir para o programa Auxílio Brasil, que substituirá o Bolsa Família e visa pagar no mínimo R$ 400 por mês às famílias beneficiadas. O Bolsa Família pagava, em média, R$ 190 por mês antes de ser extinto pelo governo Bolsonaro.
A discussão sobre a substituição ou ampliação do Bolsa Família era ativa no governo e no debate público desde o início do auxílio emergencial, em abril de 2020, que demonstrou os efeitos benéficos de uma maior transferência de renda no combate à pobreza e no desempenho da economia.
Porém, nesse período o governo e o Congresso não fizeram reformas ou cortaram despesas que permitiriam a ampliação do programa. Pelo contrário, foi ampliado o valor destinado a emendas parlamentares e não houve redução de subsídios a setores da economia e nem o enfrentamento de privilégios salariais de parte do funcionalismo público.
Como consequência, quando Bolsonaro confirmou que criaria o Auxílio Brasil, não havia espaço no Orçamento do ano que vem para financiá-lo e, ao mesmo tempo, respeitar o teto de gastos.
O teto de gastos foi criado no governo Michel Temer com a justificativa de reduzir a dívida pública, mas seu modelo desperta controvérsia entre economistas. Ele estabelece que o governo não pode gastar mais do que gastou no ano anterior, corrigido pela inflação.
Os efeitos políticos
A mudança no teto de gastos é defendida por uma ala importante do governo, que considera crucial ampliar as despesas no ano que vem para aumentar a chance de Bolsonaro se reeleger. Pesquisas eleitorais mostram que o presidente seria derrotado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Com a folga no Orçamento viabilizada pela PEC e o pagamento do Auxílio Brasil, o Planalto espera ampliar a popularidade de Bolsonaro, especialmente nas regiões mais pobres do país, onde Lula tem suas maiores taxas de intenção de voto.
Com a verba extra, seria possível ainda ampliar o valor das emendas parlamentares, importantes para Bolsonaro conquistar o apoio de deputados e senadores, e ainda criar outros programas. Em outubro, o presidente prometeu que daria também um auxílio a caminhoneiros para compensar pela alta do diesel.
ek (DW, Agência Câmara, ots)