'Doping é comum no ciclismo'
29 de maio de 2007A prática de doping é amplamente difundida no ciclismo alemão e também em outras modalidades olímpicas, afirmou Peter Danckert, presidente da Comissão de Esportes do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão), em entrevista à DW-WORLD.
Ele disse esperar que, com a recente onda de confissões de ciclistas alemães, o mundo esportivo reconheça que não se trata de casos isolados, mas que "o doping em massa está na ordem do dia".
Na semana passada, ex-integrantes da antiga equipe de ciclismo Telekom, atual T-Mobile, confessaram terem feito uso da substância proibida EPO. Entre eles estão Erik Zabel e Rolf Aldag.
Danckert também avaliou que a nova lei antidoping, que deverá ser aprovada em julho pelo Parlamento, oferecerá maneiras mais eficientes de combater a prática.
DW-WORLD: Como o senhor reage às recentes confissões de doping de ciclistas da Telekom?
Peter Danckert: As novas confissões não são uma surpresa para mim. Já há algum tempo eu sabia que o doping é amplamente difundido, não apenas na Alemanha, mas também no ciclismo internacional. É de se esperar que haja mais confissões nos próximos dias e meses. Também acredito que as confissões não se limitem às fronteiras da Alemanha.
Quais os maiores desafios na luta contra o doping?
Estamos lidando com doping generalizado no ciclismo e em outros esportes olímpicos que não estão em evidência no momento. Estamos trabalhando com sistemas deficientes de análise. Os laboratórios de testes estão ficando para trás e tentando de forma muito meticulosa, apesar da carência de recursos financeiros, rastrear o que a indústria farmacêutica estão colocando no mercado.
Torna-se cada vez mais evidente para mim, quando faço um apelo por regras que incluam anistia, que há amplos grupos dentro da cena esportiva organizada que não querem nem mesmo isso, por razões que eu não entendo.
Há uma considerável carência de informação em relação à extensão do doping, às estruturas e à participação de médicos, diretores, técnicos e possivelmente até patrocinadores. O primeiro objetivo deve ser obter um quadro da situação que seja o mais compreensível possível.
Para mim, sanções são uma prioridade secundária. Não posso esperar de atletas na ativa que cometam suicídio profissional ou social com uma confissão – e eu nem mesmo posso oferecer nada a eles por isso. Eles precisam de uma segunda chance e apenas podem tê-la se tiverem a oportunidade de se explicar abertamente, sem temer sanções.
Algumas organizações esportivas, como a Federação Alemã de Esportes Olímpicos (DOSB), disseram que sanções são mais efetivas que penalidades legais. Por que, para você, as sanções são menos importantes?
Por um lado, devem existir medidas legais efetivas. Nós as teremos quando a lei que está agora em debate for aprovada, no início de julho, porque então a posse de quantidades médias de substâncias proibidas será punida por lei, o que permitirá às autoridades uma abordagem nova e mais efetiva.
Por outro lado, precisamos de compreensão por parte das organizações esportivas. Elas precisam reconhecer que o seu sistema de sanções não está sendo muito eficiente. Elas repetidamente tiveram casos em que os testes de doping deram positivo apenas por coincidência. E se os testes não forem eficientes, o fato de haver relativamente poucos testes positivos não é prova de que não ocorra doping, mas de que os métodos de investigação de doping são ineficientes.
Você está satisfeito com a nova lei antidoping que deverá ser aprovada no início de julho na Alemanha?
Para ser honesto, ela não preenche totalmente as minhas expectativas. Eu desejaria medidas mais amplas. Mas política é assim. Se você tem um parceiro numa coalizão, precisa discutir com ele e encontrar uma solução. "Política é a arte do possível", como diz o ditado.
Temos uma lei a caminho que, acredito, oferecerá abordagens adicionais de investigação no futuro. O Departamento Federal de Investigações (BKA) assumirá responsabilidades, a possibilidade de punições será mais ampla, o controle telefônico se tornará possível e talvez também um programa de leniência. Se a área esportiva fizer a sua parte, as chances de que a situação melhore são boas.
O que o setor esportivo pode fazer? E como o esporte e o governo podem trabalhar juntos?
A minha esperança é que, após as declarações de quatro ciclistas profissionais e dois médicos nos últimos dias, o mundo esportivo tenha reconhecido que esses não são casos isolados, mas que o doping em massa está na ordem do dia.
Esses não são casos isolados, mesmo olhando além das fronteiras da Alemanha. Estive recentemente em Roma e conversei com especialistas em doping que me disseram que também na Itália a prática é amplamente difundida, não apenas no ciclismo, mas também em outros esportes olímpicos.
Há déficits consideráveis em muitas áreas que somente podem ser corrigidos com a ajuda da área esportiva. Por exemplo, temos de convencer os patrocinadores a destinar 1% da sua verba de patrocínio – o que só na Alemanha soma 2,6 bilhões de euros – para a Agência Nacional Antidoping. Assim, poderá ser feito mais em favor da prevenção, dos testes em treinamento e competições e das análises de doping.
É dessa forma que o mundo esportivo pode se envolver – mas ele tem de querer.
Em muitos casos, não são apenas os atletas que estão envolvidos em casos de doping, mas também treinadores, diretores e mesmo médicos. Em que medida essas pessoas também deveriam estar sujeitas a penalidades?
Muita coisa foi obtida por meio de alterações nas leis farmacêuticas que determinam as penalidades legais para o doping. Antes, apenas a venda de substâncias ilegais era passível de punição. Agora, com a nova lei a ser aprovada em julho, a posse de quantidades médias de substâncias ilegais também poderá ser punida. Para a polícia, os promotores e mais tarde para os juízes, essa é uma maneira adicional e muito eficiente de combater o doping.
Não é apenas o atleta que está envolvido, mas também o técnico, os diretores, os médicos e todos aqueles ao redor do atleta e que até agora eram legalmente intocáveis. Isso será diferente no futuro e, com o Departamento Federal de Investigações, teremos uma autoridade muito eficiente para cuidar do assunto.