O atual plano de limitar a presença de público nos estádios ainda está em vigor na Alemanha, mas quase ninguém mais acredita em sua implementação. Para o "Der Klassiker" entre Borussia Dortmund e Bayern de Munique no próximo sábado (04/12), seria permitida,de acordo com esse plano, a presença de 67 mil espectadores. Só que diante do alarmante quadro da nova onda do coronavírus, com seu exponencial crescimento de infecções diárias, fica difícil imaginar uma arena praticamente lotada, com torcedores lado a lado tomando conta da maior parte das arquibancadas.
É bem mais provável que haja um decreto que autorize novamente a realização de jogos da Bundesliga somente com portões fechados, a exemplo do que foi feito na temporada passada. Os Geisterspiele (jogos-fantasma) estarão de volta, mais cedo ou mais tarde. De preferência, mais cedo, diga-se de passagem. Na rodada que passou, por exemplo, Leipzig e Leverkusen já se enfrentaram numa arena completamente vazia por ordem da secretaria de saúde local.
Christian Seifert, CEO da Liga Alemã de Futebol (DFL), reiteradamente declarou que o futebol seguirá as ordens emanadas das autoridades governamentais. Essas, por sua vez, se reunirão por videoconferência nesta terça-feira (30/11) para definir os próximos passos a serem dados visando conter a pandemia.
A expectativa é haver uma determinação que restrinja ao máximo todo e qualquer tipo de grandes aglomerações, inclusive eventos esportivos de qualquer natureza e especialmente os jogos de futebol.
"É inadmissível que haja estádios lotados", afirmou sem meias-palavras Christian Lindner, chefe do Partido Liberal Democrático (FDP), num programa de TV, ao se referir ao jogo entre Colônia e Borussia M'Gladbach, que, no último sábado, contou com a presença maciça de 50 mil espectadores, com a casa completamente lotada.
Essa partida reacendeu o debate sobre os jogos-fantasma. Muitos políticos e especialistas se manifestaram inconformados com o que aconteceu em Colônia. Markus Söder, governador da Baviera, exige uma redução drástica de público nas arenas ou até sua exclusão completa. Karl Lauterbach, especialista em saúde pública dos social-democratas, exige tolerância zero com público nos estádios, unindo sua voz à do governador bávaro.
Bayern: infecções, vacina e críticas
É nesse complexo contexto que acontecerá o maior clássico do futebol alemão da atualidade no próximo fim de semana.
O confronto vale a liderança na tabela de classificação. O Bayern tem apenas um pontinho de vantagem sobre o Dortmund, além de passar por uma fase conturbada devido a repetidas infecções pelo coronavírus de seus jogadores e membros da comissão técnica.
Recentemente foram atingidos pelo coronavírus o técnico Julian Nagelsmann e os jogadores Stanisic, Süle, Choupo-Moting e Kimmich. Esse último se fez notar por suas dúvidas quanto à vacina no que diz respeito a eventuais efeitos colaterais de longo prazo. Até o momento, não há notícia de que suas dúvidas foram dirimidas e de que finalmente ele tenha se vacinado.
Não é apenas o coronavírus que perturba os bávaros. Na última assembleia geral dos membros associados do clube, realizada em 25 de novembro, torcedores ultra se manifestaram ruidosamente em plenário, exigindo o fim das relações comerciais do Bayern com o Catar por conta das reiteradas violações dos direitos humanos no país e condições análogas à escravidão impostas aos milhares de trabalhadores estrangeiros trazidos pelo governo para construir os luxuosos estádios a serem utilizados durante a Copa do Mundo de 2022.
Borussia: covid-19 e contusões
Enquanto isso, também no Borussia Dortmund nem tudo é um mar de rosas. Na atual temporada, três jogadores já contraíram a covid-19. Meunier e Brandt estão recuperados, mas Hazard foi diagnosticado positivo na última sexta-feira, está de quarentena e é dúvida para o "Der Klassiker".
Para completar, o elenco dos aurinegros se vê às voltas com contusões de jogadores importantes desde o início da atual campanha. Houve momentos nos quais praticamente em todos os setores do time o técnico Marco Rose teve que lançar mão de jogadores reservas ou até jovens das equipes de base para conseguir colocar o time em campo.
Para a importante partida fora de casa contra o Wolfsburg na rodada passada, por exemplo, o treinador, além de não poder contar com Hazard, teve que abrir mão dos meio campistas Reyna e Bellingham, do lateral Guerreiro e do zagueiro Morey. Em condições normais, todos eles seriam titulares no time.
Menos mal para o Dortmund que o prodígio norueguês Erling Holland, após longa ausência por contusão nos flexores do quadril, voltou aos gramados decorridos 27 minutos do segundo tempo. O placar anotava 2x1 para o Dortmund, mas o Wolfsburg pressionava pelo empate.
Até que, nove minutos depois, com um cruzamento perfeito, Brandt acionou Halland, que não se fez de rogado e acrobaticamente definiu o jogo: 3x1.
Evitar o mal maior
De todo modo, clássico é sempre clássico. E este entre Dortmund e Bayern poderá ficar marcado por fatores extracampo imponderáveis. A decisão sobre a presença ou não de torcida no Signal Iduna Park, palco do "Der Klassiker", deverá ser tomada nesta terça-feira.
A cidade de Dortmund faz parte do estado da Renânia do Norte-Vestfália, cujo governador, Hendrik Wüst, já se manifestou: "Estádios lotados de um lado e de outro, pacientes sendo transportados pela Força Aérea de uma cidade para outra porque não há mais UTIs disponíveis, é uma situação insuportável. Isso não combina."
Há, portanto, fortes indícios de que a Bundesliga sofrerá novas restrições. O que se discute é a sua amplitude. Há vozes que pleiteiam um lockdown para o futebol, ou seja, a interrupção pura e simples dos campeonatos por um período pré-determinado. Outra alternativa seria a volta dos Geisterspiele (jogos- fantasma), experiência relativamente bem sucedida durante a temporada 20/21.
No fim das contas, trata-se de uma escolha entre os dois males do dito popular: "Vão-se os anéis, mas ficam os dedos". A escolha deverá ser pelo mal menor (jogos sem público) para evitar o mal maior (a interrupção do campeonato).
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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit é publicada às terças-feiras.
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