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Desabrigados alemães têm de vencer vícios e burocracia para receber ajuda

Kate Bowen (cv)9 de outubro de 2006

A Alemanha é um país rico com um confortável sistema de bem-estar social. Mas drogas, excesso de burocracia e falta de motivação contribuem para manter desabrigados nas ruas.

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Na Alemanha, cerca de 345 mil pessoas vivem nas ruasFoto: Bilderbox

Maik é alto, loiro, bonito e... desabrigado! "Tenho vergonha de estar sentado aqui", diz a tabuleta de papelão ao seu lado. "Se eu tivesse apenas um pouquinho de dinheiro para me locomover... Precisar de dinheiro para comprar o bilhete de trem até Ludenscheidt, se me chamarem para ir ao tribunal", explica.

Maik passou vários anos na cadeia e está, no momento, em liberdade condicional. Para piorar a situação, também está muito endividado: segundo ele, os 340 euros (mais de 900 reais) que recebe do governo não são suficientes para arcar com todas as despesas.

De acordo com estimativas da entidade alemã de ajuda aos desabrigados (BAGW), há cerca de 345 mil moradores de rua no país (último levantamento de 2004). Mas, embora o sistema de bem-estar social alemão seja um dos mais generosos do mundo, muitos abrigos passam noites com camas vazias.

Não é por falta de apoio: formalidades, vícios e falta de motivação é que muitas vezes contribuem para que esses desabrigados continuem nas ruas.

"Oferecemos muito, mas nosso apoio nem sempre é aceito", diz Norbert Müller, diretor da Casa Prälat Schleich em Bonn, um abrigo administrado pela organização católica Caritas que oferece acomodações a curto e a longo prazo.

Mas, para muitos, o custo da ajuda é alto demais, explica Müller. Não apenas porque o abrigo ficaria com uma pequena parte do dinheiro que eles recebem do Estado, mas também porque a estadia requereria que eles se mantivessem sóbrios, evitassem drogas e cumprissem tarefas domésticas como os demais residentes.

Papelada intimida

Da wo er hinschaut schauen sie weg
Pedinte com o cartaz 'Tenho fome' aguarda ajuda no centro de BonnFoto: DW/Kate Bowen

Outro obstáculo é como fazer para usufruir da ajuda social disponível. "O governo talvez faça o suficiente, mas também cria dificuldades. Muitas vezes, eles tornam as coisas realmente difíceis", diz Helmut, da organização Mob, que administra um abrigo em Berlim e publica a revista Strassenfeger (Varredores de Ruas), cuja venda é destinada ao amparo de desabrigados.

Ajudar a encarar tanta burocracia é um dos principais serviços oferecidos por abrigos e outras organizações. Norbert Müller conta que seus funcionários freqüentemente têm que acompanhar residentes a repartições públicas para auxiliá-los a se registrar e receber o dinheiro da ajuda social.

Müller estima que em Bonn, uma cidade com pouco mais de 300 mil habitantes, existam entre 40 e 60 pessoas que vivem e dormem nas ruas, sem contar aqueles que encontraram refúgio em abrigos e outras instituições.

Segundo ele, as estatísticas do município estimam que haja até 100 pessoas, já que a definição de "desabrigado" do município também inclui os que encontraram moradias temporárias.

Total de desabrigados caiu significativamente

Estatísticas nacionais indicam que o número de desabrigados caiu drasticamente nas últimas décadas. A BAGW estima que havia 920 mil moradores de rua na Alemanha em 1995. Porém, esses dados incluíam também imigrantes da ex-Alemanha Oriental e da antiga União Soviética que ainda não haviam encontrado moradia depois da queda da Cortina de Ferro.

"Na década de 90, o mercado imobiliário era ruim e faltava moradia na Alemanha", diz a porta-voz da BAGW, Verena Rosenke. "Além disso, medidas preventivas foram ampliadas significativamente desde então."

Ao longo dos últimos dez anos, foram criadas diversas organizações – muitas delas privadas ou ligadas à igreja – para oferecer assistência aos que estavam ameaçados de despejo, antes que perdessem completamente seus apartamentos, acrescenta Rosenke.

Vício em drogas é freqüente

Obdachlose am Bonner Hauptbahnhof
Escadas da estação central de Bonn são o local preferido dos viciados em drogasFoto: DW/Kate Bowen

Niko, outro desabrigado, estava tão drogado que mal podia manter os olhos abertos. O jovem de 22 anos conta que passou algum tempo num abrigo, mas as pessoas lá estavam tão "no fundo do poço" que ele só voltaria para evitar que congelasse.

Mas a verdade é que Niko não obteve permissão para permanecer no local – que possivelmente exigiu que estivesse sóbrio – e provavelmente acabou dormindo na rua naquela noite, talvez num banco ou no vão de alguma porta.

O vício em drogas é o maior problema de muitos desabrigados, especialmente em Bonn, diz Müller. Ele calcula que cerca da metade dos moradores de seu abrigo eram viciados.

Em busca de um sonho

Mas há histórias de sucesso. Um jovem de 20 anos de idade, que preferiu se manter anônimo, conta como foi parar temporariamente em um abrigo de Bonn, tentando fugir das drogas e da influência negativa de seu antigo círculo de amizades. Hoje, ele já está lá há oito meses e se empenha em completar o Ensino Médio.

A vida numa residência transitória só para homens não é fácil. Os 16 moradores fazem turnos na limpeza e na cozinha, com tarefas destinadas não apenas a atender às necessidades imediatas do grupo, mas também a garantir que os moradores adquiram conhecimentos básicos que necessitarão quando tiverem sua própria casa.

E a casa própria é o maior sonho deles. "O que todo mundo quer é ter controle sobre sua própria vida", diz o jovem. "Eu só penso em terminar o ensino médio e estar pronto para ter minha própria casa."