Costura ecológica
21 de outubro de 2011A Qmilch (trocadilho com Kuhmilch, leite de vaca. Em alemão, "Q" = [ku]) ocupa todo um andar numa antiga fábrica em Hannover. Entre paredes brancas e chão preto, nada distrai a atenção. Pois afinal, no mundo da moda, as cores pertencem às roupas, e não ao ambiente de trabalho.
O vestuário fabricado com o alvo elixir é a mais nova criação de sua proprietária, Anke Domaske. Nascida em Leipzig, numa família tradicionalmente interessada pela moda, ela abriu sua primeira grife aos 19 anos: Mademoiselle Chichi, abreviada MCC.
No entanto, isso não bastou para a jovem interessada pelas ciências. "Pensei: vou aprender algo sólido, nunca se sabe se a outra coisa vai dar certo". Assim Domaske defende a opção de estudar Biologia na universidade. E durante seis anos viveu assim: viajando todas as manhãs para Göttingen e voltando à noite para sua empresa.
Chique que vem da proteína láctea
A MCC foi alcançando cada vez mais êxito, vestindo até mesmo atrizes de Hollywood, como Mischa Barton. E ao concluir o curso de Biologia, em 2009, Domaske decidiu-se, enfim, pela moda.
"Foi mais ou menos aí que ficamos sabendo sobre as fibras do leite. Mas a coisa só era possível usando química, com impacto para o meio ambiente. Mas achamos tão legal, queríamos produzir uma fibra natural." E assim a designer resolveu unir suas duas paixões – a moda e a biologia –, para fundar uma segunda empresa: a Qmilch.
Junto com seus seis colaboradores, Domaske entrou no laboratório e começou a experimentar. Antes dela, outros produtores de moda já haviam tentado fazer algo com a proteína láctea, mas as tentativas nunca resultaram num tecido que fosse, ao mesmo tempo, resistente e "ambientalmente correto".
E foi justamente a equipe tão desigual de Domaske a alcançar a façanha. "Viemos todos de disciplinas diferentes, sou a única com bagagem de ciências naturais. E nem estudei nada relacionado à produção têxtil", comenta. Segundo ela, foi tudo uma questão de sorte, mas sobretudo de paciência. A equipe inventava uma receita e experimentava. É impermeável? Não rasga? Após centenas de experimentos, chegaram aos resultados desejados, e surgiu a fibra Qmilch.
Fibra láctea revolucionária
O resultado já está patenteado e é revolucionário. Embora se tente, há anos, inserir um pensamento ecológico no setor da moda, é difícil a implementação de procedimentos compatíveis com o meio ambiente no setor.
Para a produção do algodão, por exemplo, é necessário um enorme volume de água. Em primeiro lugar para as próprias plantações, em segundo, para a confecção das roupas. Pois muitas substâncias químicas entram na produção de camisetas multicoloridas, por exemplo. E no fim é preciso muita água para lavar os tecidos. Até o momento, quase não há tinturas naturais de boa qualidade, mesmo para o setor de moda ecológica.
A fibra do leite, ao contrário, é produzida com apenas dois litros de água. Além disso, a empresa Qmilch só usa restos da indústria de laticínio. Numa máquina grande são misturados restos da proteína láctea caseína, água e de outras substâncias naturais, como cera de abelha.
"[A máquina] funciona como um grande moedor de carne, com duas espirais dentro, onde a massa é aquecida até se tornar maleável. No fim, estão duas fiandeiras por onde passa a massa. E aí se obtém uma fibra mais fina do que um fio de cabelo", explica a designer. A fibra é então enviada para uma tecelagem e, por fim, para o fabricante de tecidos.
Boa notícia para alérgicos
O protótipo já está exposto num cabide na sede da Qmilch. Embora só se componha em 25% das novas fibras, a diferença é gritante: a peça é leve e sedosa. Por isso Cleópatra só se banhava com leite!
O alto grau de tolerância do tecido foi, de qualquer forma, uma das razões que levaram Domaske a desenvolver a fibra. Muitos amigos seus são alérgicos, não podendo nem usar uma simples camiseta sem apresentar reações alérgicas. "É um problema sério. Queríamos ajudar essas pessoas, esse foi o ponto de partida", diz ela.
O mercado de tecidos para alérgicos é enorme. Cada vez mais gente reage ao sem número de produtos químicos encontrados por todos os lados no dia-a-dia: nas roupas, nas roupas de cama, nos assentos dos carros. O interesse dos setores afins em relação à fibra desenvolvida pela Qmilch foi proporcionalmente grande.
Montadoras de automóveis, hotéis e técnicos ligados à medicina já contataram Domaske pelo telefone. No próximo ano, a Qmilch inicia sua produção em Hannover, e a fibra do leite não será utilizada somente em sua grife própria, mas também por outros clientes. Antes disso, no entanto, a designer de apenas 28 anos terá que encontrar um novo espaço para sua empresa. Provavelmente numa nova fábrica desativada, com paredes brancas e chão preto.
Autora: Johanna Kutsche (sv)
Revisão: Augusto Valente