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Dialeto berlinense ignora a gramática

Dorothea Topf (sm)24 de junho de 2016

Além de sua predileção por neologismos, o dialeto berlinense não faz muita questão de declinações e outras regras gramaticais. Este é o primeiro artigo da série sobre dialetos alemães.

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Symbolbild Vereinigung Deutschland Zusammenschluss Zusammenwachsen Entwicklung
Foto: picture-alliance/CHROMORANGE / Ullrich Gnoth

Em Berlim podem ser ouvidos praticamente todos os dialetos alemães e idiomas estrangeiros. Mas o que mais chama a atenção de quem chega à capital alemã é a chamada "Berliner Schnauze", uma expressão que indica que os berlinenses não têm papas na língua e, a bem da verdade, não hesitam na grosseria. Mesmo assim, não há quem duvide de que o autêntico berlinense tem o coração aberto.

Se você pisar no pé de alguém sem querer, não deve se admirar ao receber uma resposta na ponta da língua, num tom de voz que dificilmente poderá ser ignorado: "Mönsch, kannst nich uffpassen, Olle!" (Orra, não dá para prestar atenção?!!). Boas maneiras não são exatamente o forte dos berlinenses… Mas, com o tempo, as pessoas se acostumam ao humor que impera na cidade e até acabam aderindo a ele.

Para desaprender todas as declinações

Para os estrangeiros preocupados em falar um alemão correto, Berlim é de lavar a alma. É que o berlinense costuma confundir "mir" e "mich", além de dizer "ick", "dit" e "wat", em vez de "ich" (eu), "das" (isto) e "was" (o que).

O genitivo praticamente não existe. Tudo é facilmente regrado com a preposição "von": "Die Mutter von dis Mädchen ist dit ejal", em vez de "Der Mutter dieses Mädchens ist das egal" (Pra mãe da menina tanto faz). Como se percebe, o berlinense não faz a mínima questão de declinar as palavras…

Entre tantas práticas desregradas, existem algumas normas, no entanto. Em vez do ditongo "au", o berlinense usa o "o" longo: "lofen", em vez de "laufen" (correr); "rochen", em vez de "rauchen" (fumar). No lugar do ditongo "ei" (pronunciado "ai"), fala-se o "e" longo: "keener" e não "keiner" (nenhum), "Beene" e não "Beine" (pernas). E, por fim, vem a famosa história do "g", inexistente no dialeto de Berlim e sempre substituído pelo "j": "Et jibt keen richtjet und keen falschet Berlinern. Wichtig is nur, dit et ne lebendje Sprache is – n Teil von unsere Identität – und nich irjendwat Uffjesetztes".

Am Gendarmenmarkt in Berlin
Gendarmenmarkt, no centro de Berlim, com a Catedral FrancesaFoto: Herschelmann

Ou seja: "Es gibt kein richtiges und kein falsches Berlinerisch. Wichtig ist nur, dass es eine lebendige Sprache ist – ein Teil unserer Identität – und nicht irgendetwas Aufgesetztes." Traduzindo: Não há berlinense correto nem errado. O importante é que é uma língua viva, parte da nossa identidade, e não algo imposto de fora.

Mas as coisas não são bem assim... A base do dialeto berlinense é uma mistura do "märkisches Platt" (o baixo-alemão falado em Brandemburgo) com o alemão padrão e o saxônio. Outros ingredientes vêm do iídiche, do holandês e do eslavo.

Em todas as épocas, assim como hoje, os habitantes de Berlim eram em grande parte migrantes. Por volta de 1700, os huguenotes refugiados da França representavam um quinto da população berlinense. E, até hoje, não são apenas as "Buletten", os bolinhos de carne, que remetem à influência francesa, mas também inusitados neologismos, como "Lameng" ("à la main") ou "Fisimatenten" ("visitez ma tente").

Aquecedores de memória e almofadas comestíveis

Norbert Dittmar, linguista da Universidade Livre de Berlim, analisou a atual variante berlinense e pôde constatar que, pela língua, ainda dá para saber exatamente quem morava no lado oriental e no lado ocidental na cidade. Uma barreira linguística ainda marca a fronteira da cidade dividida pelo Muro durante quase 30 anos.

Outra coisa que caracteriza o dialeto berlinense é o exagero e a mania de inventar palavras. Isso resulta em neologismos adoráveis, como "Jedächtniswärmer", ou seja, "Gedächtniswärmer", "aquecedor de memória", que significa "boina". Ou então "Sitzkissen", "almofada", para apelidar o pão tipicamente turco, uma espécie de pão sírio, só que mais grosso.

Toda esta criatividade talvez possa ser atribuída ao fato de o berlinense ser um povo de migrantes. Seu dialeto contém tudo isso: a sobriedade prussiana, a prolixidade francesa, a autoironia judaica, a presença de espírito dos intelectuais, fragmentos holandeses e evidentemente a linguagem do submundo.

Jardim de infância no bairro Kreuzberg
Foto: picture-alliance/dpa

Apesar desta tendência cosmopolita perceptível na língua, Berlim não deixa de ser, no entanto, um aglomerado de vilarejos no interior prussiano: Charlottenburg, Moabit, Treptow, Pankow, Marzahn e evidentemente Kreuzberg. Cada um desses bairros tem um centro próprio e sua própria fala.

A música: "Nach meine Beene is ja janz Berlin verrückt"

"Ich hab noch einen Koffer in Berlin" ("Ainda tenho uma mala em Berlim"), já cantava a berlinense Marlene Dietrich nos anos 1920, dando um toque dialetal a suas canções. Até hoje, Dietrich, Claire Waldoff e Zara Leander são diretamente associadas a Berlim e seu dialeto.

Acompanhe a canção "Nach meine Beene is ja janz Berlin verrückt" ("Toda Berlim é louca pelas minhas pernas"), cantada por Velia Krause:

Jüngst sprach zu mir mal meine olle Tante:
"Du, Mädel, höre mal vernünftig zu,
ick rate Dir im Juten als Verwandte –
lass bloß de Männer jederzeit in Ruh!

Die faulen Köppe wollen bloss poussieren,
und die Bescherung hast du dann zuletzt."
Da rief ick aus: "Ick lass ma nich verführen!"
Von mir wird jeder Mann doch nur versetzt!


Und trotzdem laufen kreuz und quer
doch stets de Kerle hinterher!
Mir hat ja die Natur verliehen,
de scheensten Beene von Berlin,

Nach meine Beene is ja janz Berlin verrückt,
mit meine Beene hab ich manchet Herz jeknickt,
und zeig ick meine Beene voller Intelljenz,
denn schlag ick ausm Felde jede Konkurrenz!


Im Lunapark besah ick mir dit Neuste.
Een Herr, der führte mir in‘t Wackeltopp.
Da wurde mir der Fatzke ziemlich dreiste,
drum jab ick ihm ne Schelle an‘n Kopp.


Er war nich bös und ging mit mir soupieren,
doch unterm Tisch – ach, denken Sie sich bloss! –
wollt er mit meine Beene gleich poussieren,
das Telegrafieren ohne Draht ging los.


Und voller Wut schrie ick wie toll:
"Bei ihnen, Mensch, da piept et wohl!
Sie haben wohl – tidelititi" –
da sagte er: "Isch bitte Sie!

Nach Ihre Beene is ja janz Berlin verrickt!
Mit ihre Beene ham Se mir mein Herz jeknickt!"
Da sacht ick janz jelassen zu dem Bösewicht: "Mit meine Beene machen Se die Dinger – nicht!"

Traduzindo para o alemão padrão…

Jüngst sprach zu mir mal meine alte Tante:
"Du, Mädchen, höre mal vernünftig zu,
ich rate Dir im Guten als Verwandte:
Lass bloss die Männer jederzeit in Ruh!

Die faulen Köpfe wollen bloss poussieren [gemeinsam ausgehen, knutschen],
und die Bescherung hast Du dann zuletzt!"
Da rief ich aus: "Ich lasse mich nicht verführen!
Von mir wird jeder Mann doch nur versetzt!"

Und trotzdem laufen kreuz und quer,
doch stets die Kerle hinterher.
Mir hat ja die Natur verliehen,
die schönsten Beine von Berlin!

Nach meinen Beinen ist ja ganz Berlin verrückt,
mit meinen Beinen hab ich manches Herz geknickt.
Und zeig ich meine Beine voller Intelligenz,
dann schlag ich aus dem Felde jede Konkurrenz!

Im Lunapark [Vergnügungspark] besah ich mir das Neueste.
Ein Herr, der führte mich ins Wackeltopp [frühes Kino – Kintopp],
da wurde mir der Fatzke [Schimpfwort für einen Mann] ziemlich dreist,
darum gab ich ihm eine Ohrfeige an den Kopf.

Er war nicht böse und ging mit mir soupieren [ins Lokal ausführen],
Doch unterm Tisch – ach, denken Sie sich bloss! –
wollte er mit meinen Beinen gleich poussieren,
das "Telegrafieren ohne Draht" [flirten] ging los.

Und voller Wut schrie ich wie toll:
"Bei Ihnen, Mensch, da piept es wohl!
Sie haben wohl – tidelititi –"
da sagte er: "Ich bitte Sie!

Nach Ihren Beinen ist ja ganz Berlin verrückt!
Mit Ihren Beinen habe Sie mir mein Herz geknickt!"
Da sagte ich ganz gelassen zu dem Bösewicht:
"Mit meinen Beinen machen Sie diese Dinge – nicht!"