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Dilma joga última cartada e convoca Lula

Alexandre Schossler / Fernando Caulyt16 de março de 2016

Num gesto de elevado risco, presidente tenta dar sobrevida ao governo e coloca o seu antecessor na Casa Civil, com amplos poderes para a articulação política e a recuperação da economia.

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Foto: Reuters

Pressionada pela maior crise política e econômica das últimas décadas e por protestos gigantescos, a presidente Dilma Rousseff puxou da manga, nesta quarta-feira (16/03), a carta que há dias era anunciada pela imprensa: o ingresso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no governo, como chefe da Casa Civil.

Lula chega fazendo exigências: quer mudanças na composição do governo, com a entrada de nomes de peso e de sua confiança, e também na política econômica, para forçar com urgência a retomada do crescimento. Entre os primeiros nomes vazados para a imprensa está o de Celso Amorim, que poderia ir para o Ministério do Exterior. Também são consideradas mudanças na Fazenda e na Educação.

Se essa cartada arriscada vai dar certo ou não, só o tempo dirá. Claro mesmo é o que ela diz sobre o atual estado do governo: pode ser encarada como uma declaração de falência e incapacidade político-administrativa por parte da presidente, que na prática cede poder e instala no seu gabinete uma espécie de primeiro-ministro, numa tentativa desesperada de salvar um governo que, a cada dia que passa, aparenta ficar mais sem salvação.

Pela lógica do Palácio do Planalto, Lula ajudaria Dilma em dois pontos sensíveis de sua gestão: recuperação da economia e articulação política para tentar frear o processo de impeachment, que, como teme o Planalto, pode ser acelerado pelos protestos.

Luiz Inacio Lula da Silva und Dilma Rousseff
Pela lógica do Palácio do Planalto, Lula ajudaria Dilma em pontos sensíveis de sua gestãoFoto: Nelson Almeida/AFP/GettyImages

Ainda é possível manter o PMDB?

Uma das tarefas primeiras de Lula será a articulação política – e há sinais de que isso será mais difícil do que aparenta ser, mesmo para um político tarimbado na arte da negociação, como o ex-presidente. O PMDB, base sobre a qual se assenta o governo no Congresso, já deu sinais de que não é mais uma garantia de apoio. Muitos líderes do partido não acreditam mais que o governo tenha salvação, e líderes como Renan Calheiros e Eduardo Cunha culpam o governo por serem alvos da Operação Lava Jato.

Analistas políticos ouvidos pela DW Brasil se mostram cautelosos quanto à capacidade de Lula, nesta altura da crise, reunir apoio político para o governo. "A figura de Lula está muito desgastada, inclusive no meio político. A moral do governo, que já está baixa, vai se tornar ainda menor. Lula se torna mais um problema para Dilma, contaminando ainda mais o governo. Sua função de 'salvador' pode acabar tendo o efeito oposto", afirma Márcio Coimbra, do Ibmec/DF.

Para Cláudio Couto, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV), se Lula tivesse se tornado ministro há um ano, o cenário seria diferente. Mas agora, opina, talvez seja tarde demais. "Essa operação é de risco e parece um ato de desespero na frente política: pode ser percebida como um desaforo por parte da opinião pública", afirma.

Há o risco também de que a oposição reaja nas instâncias jurídicas após a nomeação de Lula. Os partidos DEM, PPS, PSDB e SD já ameaçaram protocolar, de forma conjunta, uma ação popular em 27 estados contra a entrada do ex-presidente no governo.

E o que os brasileiros vão pensar disso?

O que a opinião pública vai pensar da entrada de Lula no governo Dilma será decisivo para que essa jogada arriscada dê certo. Ao darem esse passo, tanto Dilma como Lula aceitaram o enorme ônus de que os brasileiros vejam isso como uma tentativa de fuga do ex-presidente, acusado no âmbito da Operação Lava Jato, e – ainda pior – como uma admissão de culpa. Na condição de ministro, Lula passaria a ter foro privilegiado, e as ações contra ele seriam julgadas no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Sem dúvida é uma forma de o ex-presidente se blindar das investigações da Lava Jato. O receio é que, sem esta blindagem, ele se torne vulnerável a um pedido de prisão do Ministério Público Federal", opina Coimbra. "É uma forma de blindagem, uma vez que não existe uma campanha contra ele, mas provas contundentes numa série de casos."

Por várias vezes, o ex-presidente reclamou com aliados sobre a atuação do Ministério Público na Lava Jato, afirmando que está sofrendo "perseguição política" e uma campanha de difamação. Lula foi o principal alvo da 24ª fase da operação, deflagrada no início deste mês. O ex-presidente foi obrigado a prestar depoimento à Polícia Federal, depois de um mandado de condução coercitiva expedido pelo juiz federal Sérgio Moro.

Paralelamente à Lava Jato, o Ministério Público de São Paulo pediu na semana passada a prisão preventiva do ex-presidente no caso envolvendo um triplex no Guarujá, no qual é acusado de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. O caso, porém, foi transferido para a Justiça Federal de Curitiba.

"Todos nós sabemos que o alvo principal da Operação Lava Jato é o ex-presidente. Ao mesmo tempo que é uma autodefesa, é também uma iniciativa política, com chances muito frágeis, de recompor o governo federal", afirma o cientista político Lúcio Flavio de Almeida, da PUC-SP.

Para Alejandro Salas, diretor para as Américas da Transparência Internacional, em Berlim, este não é o momento mais adequado para Lula assumir um ministério. "Se Lula está convencido de sua inocência, ele não deveria favorecer para que haja esse contexto político que segue gerando problemas e polarização. Ele deveria ter a estatura moral de enfrentar a Justiça e limpar seu nome, e depois seguir com sua carreira política", diz Salas.

Para as centenas de milhares de pessoas que foram às ruas no fim de semana passado protestar contra o governo e o PT, a entrada de Lula no governo será vista como uma provocação, que pode servir de estímulo para protestos ainda maiores.