Soros fortalece mídia oposicionista na Polônia
1 de março de 2019O grupo midiático polonês Agora, que detém o diário de maior circulação da Polônia, a Gazeta Wyborcza, assinou recentemente um acordo para comprar 40% da Eurozet, pelo correspondente a 30 milhões de euros, da Czech Media Invest (CMI), empresa sediada em Praga e que tem o bilionário tcheco Daniel Kretinsky entre seus proprietários.
A Eurozet é proprietária da Radio Zet, a segunda maior estação de rádio da Polônia, com 13% do mercado.
O fundo tcheco SFS Ventures está comprando os 60% restantes, com uma opção de compra futura dessas ações pelo Agora. O SFS Ventures é uma joint venture entre a Sourcefabric – fundada em Praga em 2010 para apoiar o jornalismo independente em todo o mundo – e o Media Development Investment Fund (MDIF), um fundo para mídia independente que recebeu financiamento do Open Society Institut, do filantropo bilionário húngaro-americano George Soros.
O MDIF disse que a compra não significará qualquer mudança na Radio Zet, que permaneceu independente mesmo depois que o partido governista Lei e Justiça (PiS) chegou ao poder, no final de 2015, e desde então tenta "repolonizar" a mídia pública e prejudicar financeiramente a mídia comercial independente.
Grupos de mídia pró-governo, alguns deles apoiados por garantias de empréstimos de bancos estatais, estavam na disputa para comprar a Eurozet, incluindo a Fratria, dona do site wpolityce.pl.
O PiS classificou o desfecho do negócio como uma ameaça à pluralidade da mídia polonesa. "O PiS, juntamente com seu presidente, Jaroslaw Kaczynski, acredita que o Estado deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que especuladores financeiros não aumentem sua influência sobre o mercado de mídia", afirmou Beata Mazurek, porta-voz da PiS, no Twitter.
A parlamentar do PiS Krystyna Pawlowicz escreveu um artigo afirmando que a ideia de uma mídia apolítica é um "mito idealizado e prejudicial" que torna "mais difícil governar".
Kaczynski não esconde sua antipatia pela Gazeta Wyborcza, e o sentimento é mútuo, dizem pessoas de dentro do jornal. Kaczynski disse em 2018 que o jornal divulga "liberalismo, antitradicionalismo, anticatolicismo" e é "contra a própria noção de nação". Ele acusou o veículo de usar a "pedagogia da vergonha".
Ministros do governo proibiram instituições governamentais de inserir publicidade no jornal e cancelaram assinaturas para os departamentos do governo e tribunais. Também tentaram privar financeiramente vários meios de comunicação impressos independentes, como Polityka e Newsweek Polska, restringindo a publicidade de fundos públicos. De acordo com a Freedom House, isso é parte de uma tentativa mais ampla de "enfraquecer o sistema de peso e contrapeso, silenciar vozes independentes e controlar a esfera pública".
No ano passado, a Agora registrou sua maior queda de receita desde 1989, principalmente devido a uma queda nas vendas de anúncios.
Pessoas ligadas à Gazeta Wyborcza afirmam temer que, se o PiS vencer a eleição deste ano, o governo seguirá os passos da repressão midiática do primeiro-ministro Viktor Orbán, na Hungria. A Gazeta Wyborcza recentemente publicou revelações que deram início a um escândalo envolvendo Kaczynski e teme ser duramente atingida se o PiS vencer as eleições marcadas para outubro.
Semanas depois de vencer as eleições parlamentares de 2015, o PiS aprovou uma lei de mídia que dava ao governo o controle direto sobre a radiodifusão pública e substituiu jornalistas que trabalhavam em rádios e TVs públicas.
Em abril de 2016, um projeto de lei previa o que chamava de transformação das emissoras públicas de rádio e televisão em "mídia nacional". O projeto queria obrigar a mídia pública a divulgar as opiniões do primeiro-ministro, do presidente e dos parlamentares e afirmava que a mídia pública deveria "preservar as tradições nacionais, os valores patrióticos e cristãos e fortalecer a comunidade nacional".
O comissário europeu para economia digital, Günther Oettinger, criticou a lei e alertou o governo de que ela poderia restringir a liberdade de expressão. A então primeira-ministra, Beata Szydlo, rejeitou as críticas e disse que seu governo não violara as leis polonesas ou da UE.
Em dezembro de 2016, o Tribunal Constitucional declarou partes da lei da mídia inconstitucionais, e quando Beata Szydlo foi substituída por Mateusz Morawiecki, em dezembro de 2017, foi anunciado que o novo chefe de governo iria parar com a propaganda do governo na mídia pública.
O panorama da mídia na Polônia é muito diversificado, mas altamente polarizado entre campos políticos e ideológicos.
Na mídia do país, a objetividade vem sendo substituída por um emergente "jornalismo de identidade" – narrativas ideologicamente engajadas, que ajudam a construir uma comunidade com ideias semelhantes –, desenvolvido e introduzido pela mídia de direita do país, de acordo com o especialista em mídia Krzysztof Dzieciolowski.
A mídia impressa e as estações de rádio polonesas são principalmente privadas e diversificadas em termos de propriedade. Porém, as empresas estrangeiras, especialmente as alemãs, controlam cerca de três quartos do mercado de mídia polonês, de acordo com o Centro Europeu de Jornalismo. O principal concorrente doméstico é o Agora.
As duas principais estações de rádio privadas estão nas mãos de empresas alemãs e francesas, respectivamente, mas veiculam principalmente música e entretenimento.
Das 19 empresas que publicam diários nacionais, nove são de capital estrangeiro e dez têm proprietários poloneses. Todas as principais publicações são de propriedade de capital polonês, incluindo as revistas semanais mais populares – com exceção da Newsweek e do tabloide mais popular, o Fakt, de propriedade alemã.
"O acordo da Eurozet significa que a Gazeta continua forte mesmo diante do redirecionamento, pelo PiS, dos fundos de publicidade das empresas estatais", diz Dzieciolowski. "E também que eles têm fortes apoiadores", frisa. "Isso é como uma fortaleza sendo defendida, dado o apetite do PiS pela grande mídia", acrescenta.
"A Radio Zet tem muitos problemas internos, uma audiência em queda, mas tem influência política e grande valor simbólico", continua Dzieciolowski. "Mas, a longo prazo, esse acordo só aumentará o nível de partidarismo e polarização entre os jornalistas poloneses. E não acho que haja jornalismo objetivo na Polônia atualmente."
Boguslaw Chrabota, editor-chefe do diário de centro-direita Rzeczpospolita, rejeita acusações de pressão política sobre o setor de mídia privada, dizendo recentemente, diante de uma plateia em Varsóvia, que "temos uma garantia formal e material de liberdade de expressão neste país, e não tenho a sensação de que há algum perigo para nossas operações".
O jornal de Chrabota teve uma queda de 20% em suas receitas desde que o governo impediu as empresas públicas de financiarem emissoras de notícias. Mas, graças a um modelo de receita diversificado, sofreu menos do que outras publicações, segundo ele. "A Gazeta Wyborcza está nas barricadas, e o problema é que eles perderam talvez de 50% a 60% de sua renda", afirma.
Roman Imielski, editor de notícias da Gazeta Wyborcza, diz que, se o PiS vencer a eleição deste ano, agirá de forma dura contra seu jornal. "Nós deixamos claro que as pessoas devem votar em quaisquer partidos, menos no PiS. Não para nos salvar, mas para salvar a democracia polonesa."
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