Espaço para escolas de turno integral
18 de março de 2007Enquanto em muitos países europeus pais e mães estão acostumados a deixar seus filhos o dia todo sob a tutela da escola, na Alemanha esse hábito está apenas engatinhando. O normal no país é as aulas começarem às oito horas da manhã e as crianças já estarem em casa de volta para o almoço.
"Eu mal tenho tempo de tirar a mesa do café da manhã, antes de buscar minha filha às 11 horas na escola", disse Rosie Dragu, mãe de duas crianças e dona de casa. As escolas de meio período, matutinas na maioria das vezes, abarcam 85% dos alunos do país, enquanto as integrais, que estendem a jornada escolar até o fim da tarde, ainda são exceção.
Resultados do teste Pisa foram um choque
Mas a situação começa a mudar. A ministra da Família, Ursula von der Leyen, da União Democrata Cristã (CDU), está fazendo de tudo para que se ofereçam novas opções de educação, principalmente para as crianças pequenas. O número de alunos inscritos em escolas de turno integral cresceu mais de 100%, entre 2002 e 2005, alcançando 259.772. E continua aumentando, segundo estatísticas do próprio Ministério da Família.
A coalizão de governo anterior, formada pelos social-democratas e verdes, lançou a idéia de adotar o turno integral nas escolas, com o objetivo de melhorar a qualidade educacional no país. Em 2002, a Alemanha sofreu um forte choque com os resultados do teste Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos, parte das atividades da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OECD). O país teve uma colocação muito baixa, comparada com outras nações industriais.
Manter as crianças na escola ajuda os pais a encontrar um equilíbrio entre a dedicação ao trabalho e à família, acrescenta a ministra Von der Leyen, como argumento a favor do horário integral.
Dentro e fora das salas de aula
A questão é especialmente urgente diante do envelhecimento da sociedade alemã, decorrente da baixíssima taxa de natalidade no país. Esta é de 1,2 filho por mulher em idade fértil, muito inferior à de outros países onde as crianças passam mais tempo na escola. O paradoxo é que, por um lado, as mulheres precisam ter mais filhos, por outro, sua força de trabalho é cada vez mais exigida.
Os pequenos ingleses e franceses na faixa etária entre os sete e oito anos, por exemplo, têm 880 horas-aula por ano, enquanto na Alemanha, a média é de apenas 630 horas-aula. Esses países adotam um planejamento de horários que intercala as aulas normais com atividades extra-classe, como esportes e artes. No caso alemão, as crianças passam as manhãs nas salas de aula e depois têm as tardes livres para fazer o que quiserem.
De acordo com Cristina Allemann-Ghionda, professora de Educação Comparada da Universidade de Colônia, o maior desafio para a ampliação da jornada escolar é a resistência em mudar uma tradição que remonta à sociedade baseada na economia agrária.
Naquela época, as crianças precisavam estar em casa para ajudar a família no campo. "O maior obstáculo à reforma é a sociedade ser profundamente conservadora, no tocante à educação", comentou. "As mães sofrem uma tremenda pressão social para ficar em casa."
Lugar de mulher é em casa
Johannes Ross-Klein, diretor da Escola Otto Hahn, instituição de tempo integral da cidade de Bitburg, confronta-se com essa pressão todos os dias, pois 22% de seus alunos são criados por mães solteiras.
"Uma mulher que escolhe inscrever o filho numa escola de tempo integral ainda é vista como mãe ruim", comentou, acrescentando que a visão é de que as escolas integrais estão roubando as crianças das famílias.
Entretanto, ele ameniza sua crítica, acrescentando que o programa de tempo integral recebeu um apoio imenso de pais e professores. Ross-Klein acredita que cada vez mais a sociedade alemã vai aderir à idéia.
Avanço de mentalidade
Andreas Schleicher, coordenador dos estudos Pisa da OECD, concordou que ainda é preciso tempo para que os alemães se acostumem e aceitem a idéia de uma escola de tempo integral. Ele também ressaltou o fato de que o país está passando por uma grande mudança de mentalidade.
"Há cinco anos, seria impossível levar à frente um debate acerca de escolas de tempo integral sem um enxame de críticas condenando a proposta", disse. Em contrapartida, a discussão atual na Alemanha é sobre como colocar o plano na prática, e não sobre a ideologia da escola de tempo integral em si.
"Mesmo entre os políticos mais conservadores, a questão é como implementar o conceito, como fazer isso direito", resumiu o especialista em ensino.