Espanha observa com atenção crise grega
6 de julho de 2015A conta no Twitter do líder do partido espanhol Podemos, Pablo Iglesias, ficou bastante agitada, no domingo (05/07), quando ele explicava sua posição sobre a situação na Grécia. A foto do político de 36 anos – no dia em que os gregos votaram se aceitavam ou não os termos do acordo para um resgate – o mostrava abraçando o primeiro-ministro Alexis Tsipras.
“Hoje a democracia venceu na Grécia”, escreveu Iglesias na rede social, após a confirmação da expressiva vitória do “não”.
A foto foi tirada em janeiro, quando Iglesias visitou Atenas para apoiar a campanha do Syriza, o partido de Tsipras, nas eleições gerais da Grécia. Particularmente, Iglesias foi apoiar a posição contrária às medidas de austeridade econômica impostas pelos credores.
Com o futuro da Grécia em questão em meio à agitação provocada pelo referendo, espera-se que a Espanha seja um dos países mais vulneráveis em um suposto contágio nas próximas semanas e meses. Isto se deve em parte à sua situação econômica, mas também às incertezas políticas que a ascensão súbita do Podemos ajudou a gerar.
Blindagem contra oscilações
O governo espanhol insiste que a quarta maior economia da zona do euro está em muito melhor situação do que estava em 2012. Na época, solicitou ajuda de 100 bilhões de euros para a União Europeia (UE) a fim de reforçar o seu cambaleante setor financeiro, abalado pela crise.
A Espanha usou 41 bilhões de euros do montante e pôs a indústria bancária nos trilhos antes de retomar o crescimento. O Fundo Monetário Internacional espera que a economia espanhola cresça mais do que 3% neste ano, uma projeção que supera a média da UE.
“O que aconteceu na Grécia não vai acontecer na Espanha porque este é um país confiável”, disse o primeiro-ministro Mariano Rajoy na semana passada, quando recebeu a visita do ex-presidente francês Nicolas Sarkozy em Madri.
Conservador, Rajoy defende frequentemente as medidas de austeridade implementadas por seu governo nos últimos quatro anos – as quais descreve como uma blindagem eficiente contra choques econômicos futuros.
Nesta segunda-feira, o ministro da Economia, Luis de Gindos, tentou distanciar ainda mais Madri de Atenas, afirmando que “é inevitável que a Grécia leve adiante suas reformas.”
A Bolsa de Valores de Madri, no entanto, reagiu com nervosismo ao resultado do referendo e despencou nesta segunda-feira. A diferença de preço de compra e venda de ações – um indicador-chave da confiança internacional no país – atingiu um pico, sugerindo que, mesmo com a alegada nova fase da economia espanhola, a Espanha ainda não pode evitar ser atingida pela turbulência do mercado.
A reação da população
Nem todos os espanhóis compartilham da visão otimista de Rajoy sobre a economia. “A Espanha tem que observar o que está acontecendo na Grécia porque eu consigo facilmente ver as mesmas coisas acontecerem aqui também”, diz Manuela Gonzales, dona de uma banca de jornais na área central de Madri.
Ela lembra que a taxa de desemprego, atualmente em 24%, atinge 50% da população com menos de 25 anos. “Nós temos jovens que trabalham incrivelmente duro em turnos de 12 horas por dia por apenas 800 euros por mês. Isso não os permite fazer planos de longo prazo. E estes são os que têm um emprego”, afirma.
Outros estão animados com o resultado do referendo devido às suas possíveis implicações políticas. “Isso trás esperança. O 'não' foi um 'não' ao medo, às políticas de austeridade, à chantagem e à imoralidade”, opina o advogado desempregado Jose Angel Herencias.
As palavras de Herencias encontram eco em muitos líderes do Podemos. Ele diz que vai votar no partido, o equivalente espanhol do Podemos, nas próximas eleições gerais do final deste ano.
Com as pesquisas mostrando que o Podemos está um pouco atrás do governista Partido Popular (PP) e dos socialistas, os resultados das eleições são difíceis ainda de serem previstos. Em maio, no pleito local, o Podemos e outros partidos de esquerda assumiram a administração de muitas prefeituras e regiões do país.
Bandeira de luta
O cientista político Jose Fernandez-Albertos, do centro de estudos espanhol CSIC, acredita que os partidos da Espanha, particularmente o Podemos, podem fazer duas leituras sobre o referendo grego.
“O fato de a Grécia estar em uma situação econômica crítica é ruim para o Podemos porque gera medo entre os eleitores”, analisa Fernandes-Albertos, que escreveu um livro sobre o partido.
Por outro lado, afirma o especialista, a médio-prazo o Podemos está se apropriando, de forma bem-sucedida, da ideia de que é necessário um tipo diferente de Europa e assumindo um papel nas discussões em relação aos credores.
Fernandes-Albertos aponta, em comparação, que o PP e os socialistas fracassaram em montar uma agenda sobre esses temas, o que está acentuando a preocupação da população espanhola: “Se opor à austeridade é uma opinião comum crescente entre o povo”, sugere.