Crise orçamentária grega
29 de dezembro de 2009A agência de rating Standard & Poor's baixou a idoneidade de crédito da Grécia, diante das altas dívidas estatais do país. Com um novo endividamento correspondente a 12,7% do PIB e 300 bilhões de euros de dívidas públicas, a Grécia ultrapassa em muito o limite máximo estipulado pelo pacto de estabilidade do euro.
Para a moeda única europeia, isso parece ser uma prova de fogo. Desde a crise financeira e econômica, a situação da Grécia é tão grave que alguns analistas não excluem mais a possibilidade de ruptura da união monetária.
Em 1997, quatro professores catedráticos alemães entraram com um recurso junto ao Tribunal Constitucional Federal, a fim de impedir o Tratado de Amsterdã, que selou a introdução do euro no continente. Joachim Starbatty, um dos professores dessa iniciativa, vê seus argumentos da época confirmados hoje.
"Quando se fundamentou o euro, começaram a vir países com diferentes identidades político-econômicas. Entre eles estavam alguns que já tinham mostrado desempenho no sentido de uma estabilização econômica; em outros casos, esse desempenho era duvidável. Foi para isso que se criaram critérios para o ingresso na união monetária. No entanto, esses critérios foram interpretados de forma muito frouxa e negligente; em parte, eles nem sequer foram controlados. E assim acabaram se juntando países que, em sua disparidade econômica e sócio-política, não combinam bem", argumenta Joachim Starbatty.
Discrepâncias monetárias se tornam problemas nacionais
Para Helmut Schlesinger, ex-presidente do Banco Central Alemão, a união monetária europeia exclui por definição alterações de cotação, mas, por outro lado, acaba transferindo o problema de equiparação para as economias nacionais. "As economias nacionais têm que se empenhar em prosseguir no mesmo ritmo que outros parceiros, seja quanto à inflação, aos aumentos salariais ou à solidez das finanças do Estado."
Para Peter Hampe, da União Alemã de Formação Política, a união monetária implica a impossibilidade de corrigir diferentes tendências monetárias ou inflacionárias através da cotação das moedas. Essa equiparação fica a cargo da política financeira, salarial e social de cada país. "No início, nem todos entenderam que essa seria a consequência da união monetária. Se algum país não se ater às regras do jogo, certamente vai ter problemas", explica ele.
Irreversibilidade da união monetária
Segundo Starbatty, as tendências dos últimos anos mostram que os índices de desvalorização são notáveis. Ele avalia que a Itália deveria sofrer uma desvalorização monetária de 40%, a Espanha por volta de 30%, enquanto a Grécia e Portugal ficariam entre ambas as cifras.
No entanto, a válvula de escape da cotação monetária está obstruída. Resta saber se, do ponto de vista dos países em situação crítica, seria sensato se excluir da união monetária e se submeter a uma desvalorização, a fim de impulsionar uma política monetária nacional expansiva.
Para Matthes, isso não é muito realista. Ele considera o ingresso de um país na união monetária europeia praticamente irreversível. "Afinal, justamente na atual situação, em que os mercados financeiros se tornam cada vez mais inseguros, a exclusão de um país da união monetária significaria se expor a um perigo ainda mais grave de crise econômica"
Ao que tudo indica, a zona do euro não é apenas uma comunidade monetária, mas também um caminho de mão única. Nesse caso, o que poderia ajudar os países menos estáveis do sul da Europa? Para certos analistas, a única saída seria sair do buraco com as próprias forças, por meio de uma disciplina ferrenha na política salarial e financeira.
Não custa reiterar que não foi a crise financeira mundial que desencadeou esses desequilíbrios na zona do euro. Os erros foram cometidos muito antes. No entanto, a atual crise torna bem mais difícil fazer o que seria necessário, ou seja, economizar ao máximo e vincular os salários à produtividade real. Numa época em que quase todos os governos lançaram pacotes conjunturais gigantescos, os países em crise no sul da Europa deveriam ter feito exatamente o oposto. No entanto, isso os teria levado a uma recessão ainda mais profunda. Um beco sem saída, portanto.
Crise provocada pela Grécia escamoteia baixa do dólar
Investidores internacionais percebem tudo isso muito bem. Para comprar títulos do governo italiano ou espanhol, eles exigem que os juros incluam taxas de risco de aproximadamente 1,5% em comparação com títulos do Estado alemão com prazo de dez anos. E o Estado grego precisa oferecer até 3% de juros, se quiser vender seus títulos. À primeira vista, isso parece pouco; no entanto, a soma atinge rapidamente marcas altíssimas. Afinal, trata-se de dívidas de países inteiros.
Só essas diferenças de juros, denominadas spreads, já fazem muitos analistas acreditar que a união monetária europeia vai entrar em colapso em breve. No entanto, coisas como essa não acontecem assim tão rápido. Apesar de desequilíbrios e tensões, o euro continua sendo uma moeda estável e atraente.
O Banco Central Europeu considera altamente improvável que a crise orçamentária grega possa levar o país a abandonar a união monetária. Apesar de uma medida dessas ser tecnicamente possível, o consultor de questões jurídicas do banco, Phoebus Athanassiou, garante que as implicações legais e práticas tornam uma eventual exclusão altamente improvável.
É evidente que os problemas financeiros dos países do sul da Europa, sobretudo a Grécia, têm consequências para o euro. Diante da persistente desvalorização da moeda norte-americana, a cotação do euro em meados deste ano era de 1,5 dólar. Hoje, o euro já está abaixo dessa marca, cotado em 1,43 dólar.
Em outras palavras, o dólar continua fraco, porque os investidores internacionais sabem que os EUA vivem há anos acima de suas posses. Os graves problemas financeiros da Grécia só escamotearam um pouco a baixa do dólar. Resta saber quem conseguirá resolver seus desequilíbrios financeiros antes: os países do sul da Europa ou os EUA.
Autor: Rolf Wenkel
Revisão: Soraia Vilela