Vício no mundo dos RPGs
11 de janeiro de 2009Muitas vezes o alter ego tem mais sucesso que a própria pessoa, principalmente no mundo virtual. Ao assumirem papéis em jogos de interpretação online (RPG, na sigla em inglês para Role-Playing Game), os usuários alcançam o reconhecimento e a recompensa que não têm na vida real, dizem especialistas.
"Muitos jovens vivem na internet o sucesso que não têm na vida real", afirma a pedagoga de mídia e assessora de educação, Sabine Schattenfroh.
O sucesso virtual traz felicidade e proporciona uma sensação boa aos jogadores. "É aí que reside o risco de vício dos jogos online de interpretação de papéis", afirma o psicólogo Manfred Beuel, diretor da Clínica de Medicina Psicossomática e Psicoterapia da Universidade Johannes Guttenberg, de Mainz.
Mundo virtual
Mais de 10 milhões de usuários estão cadastrados no maior jogo online de interpretação de papéis do mundo, o World of Warcraft. Nele, os jogadores constroem os seus avatares, os alter egos, que vivem aventuras e acumulam poder a cada fase ultrapassada. Com o jogo, os usuários se movem num mundo sem limites sem sair da frente do computador.
"No ambiente virtual, não há cercas como nas praças e parques", diz Schattenfroh. O jogo não tem pausas nem fim e funciona segundo um princípio de recompensa: cada jogador tem o controle sobre sua personalidade virtual, pois quanto mais tempo investe no jogo, mais forte será a personalidade da identidade criada.
Na opinião de especialistas, os jogadores mergulham num mundo no qual têm controle sobre os acontecimentos e podem viver seus sonhos e desejos. Porém, o cotidiano dessas pessoas passa a ser orientado pelo jogo e o uso deste torna-se excessivo.
Os mais atingidos são adolescentes e jovens do sexo masculino, diz Beutel. Isso foi comprovado por um estudo da Universidade Humboldt de Berlim com 5.200 jovens com média de idade de 16 anos.
"Entre os entrevistados, 4% podem ser classificados como usuários excessivos", afirmou o psicólogo da Universidade de Münster Ralf Demmel. "O grupo mais afetado são os jovens na faixa etária entre 14 e 17 anos, na qual o percentual atinge 6%."
Será um vício?
Desde março de 2008, Beutel coordena numa clínica de Mainz um projeto-modelo para o tratamento de viciados em jogos de computador e internet. Em três meses, o projeto já atendeu mais de 200 pessoas, sendo que a procura está aumentando. Mas há um problema: a Organização Mundial de Saúde (OMS) não reconhece esse vício como uma doença e, portanto, os seguros de saúde da Alemanha não cobrem os custos do tratamento.
Ainda há discussões quanto à definição de dependência quando se trata de jogos eletrônicos e internet. Nesse contexto, a noção de vício é controversa e ainda não foi reconhecida. "O uso excessivo da internet começa após cerca de cinco horas por dia", sustenta Beutel. Porém, a ânsia de alguns jogadores por seu alter ego é tão grande que eles chegam a passar mais de sete horas por dia à frente do computador.
Para definir a dependência, Beutel enumera os seguintes critérios: compulsão irrefreável, baixo autocontrole e sintomas de abstinência, como nervosismo, falta de concentração e abandono das relações sociais e de outros interesses.
Prevenir é melhor que remediar
Para que as crianças fiquem longe de tal situação, a pedagoga de mídia Schattenfroh diz que os pais devem tomar cuidados na educação. Mas, segundo ela, frequentemente faltam, na família, cuidado e atenção com as crianças.
Schattenfroh, que tem dois filhos, trabalha como conselheira educacional para a iniciativa "Pais e Mídia", da Autoridade Central de Mídia do Estado da Renânia do Norte-Vestfália, órgão responsável pela supervisão das emissoras privadas de rádio e televisão.
Ela defende que os pais apresentem às crianças alternativas aos jogos eletrônicos e observa que, muitas vezes, a família faz do computador um meio para se livrar de discussões. "Enquanto as crianças estão diante do computador, não há conflitos", argumenta.
Schattenfroh ressalta que é importante que os pais observem que uso seus filhos fazem da mídia. "Além de ler, escrever e contar, os pequenos deveriam aprender desde o início na escola a lidar com a mídia", afirma.