Exposição sobre fronteiras usa trecho do Muro de Berlim como mural
23 de julho de 2013Em Bagdá, uma edificação de concreto divide a cidade em duas partes. Erigido pelos Estados Unidos no ano de 2006 como proteção contra ataques, o muro de Bagdá divide os bairros residenciais dos xiitas das áreas onde moram os sunitas. Uma muralha que impede a violência, mas também o contato entre pessoas de crenças distintas.
"Um muro jamais poderá resolver um conflito político", diz o fotógrafo Kai Wiedenhöfer, que documentou o local. "Nós, alemães, sabemos disso melhor que ninguém", completa.
Na condição de jovem estudante, Wiedenhöfer documentou a queda do Muro de Berlim com sua câmera – o acontecimento político mais emocionante já vivido por ele, segundo suas próprias palavras.
Para muitas pessoas, era um sinal de esperança: se a Cortina de Ferro caíra na Europa, outros muros poderiam cair mundo afora. Mas, em vez disso, novos foram surgindo. Wiedenhöfer, então já definitivamente interessado pelo tema, resolveu fotografá-los.
De Belfast a Bagdá, do México à Coreia
Documentar fronteiras marcadas por muros e vigilância militar não é uma tarefa fácil. Wiedenhöfer viajou até a cerca que divide os Estados Unidos do México, pulada por um sem número de pessoas diariamente, e também para a Coreia do Norte, onde fica aquele que, na opinião do fotógrafo, é o muro mais intransponível do mundo.
O alemão seguiu, ainda, para Ceuta e Melilla, onde cercas de arame farpado foram instaladas para deter refugiados africanos. E depois para Israel, que cerceia com seu muro os movimentos dos moradores da Cisjordânia. Wiedenhöfer foi ainda até Belfast, na Irlanda do Norte, e à capital cipriota Nicósia, onde ficam os últimos muros de uma Europa que, de resto, aboliu as fronteiras.
As autoridades responsáveis nem sempre viram com bons olhos a intenção de Wiedenhöfer de fotografar áreas fronteiriças, mas acabaram permitindo o acesso do artista. Aos estrangeiros é permitido cruzar esses muros, ao contrário do que acontece com o moradores locais.
As fotografias resultantes foram expostas numa "moldura" que não poderia ser mais simbólica: o que sobrou do antigo Muro de Berlim. Wiedenhöfer afixou suas fotos panorâmicas numa extensão de 364 metros, do outro lado da chamada East Side Gallery, um mural pintado por artistas sobre restos do antigo Muro de Berlim.
"Para o formato largo das fotos, esse é o lugar perfeito", diz o artista. "Além disso, aqui elas podem ser vistas por qualquer pessoa, incluindo aquelas que nunca frequentam exposições."
Visões críticas
Até a concretização do projeto, transcorreram nada menos que seis anos. Pois nem todo mundo achava a ideia de um "muro sobre o muro" tão boa quanto o próprio Wiedenhöfer. Houve resistências, sobretudo por parte dos artistas da East Side Gallery. "É uma falsificação", reclamou Kani Alav, presidente da iniciativa de artistas responsável pela East Side Gallery. "O lugar tem que permanecer autêntico", argumentou.
Para Wiedenhöfer, esse tipo de postura não é compreensível. "O Muro não tem mais a aparência que tinha nos tempos de uma Alemanha dividida", observa o fotógrafo, apontando para os diversos grafites existentes sobre a superfície de concreto.
"Mensagem para o mundo"
Polêmica à parte, a arte sobre o Muro tem atraído visitantes. "As fotos são muito legais. E, nesse tamanho, são realmente impressionantes", elogia uma jovem de Munique.
Pouco depois da inauguração já surgiram os primeiros a quererem ser fotografados com as imagens ao fundo, sejam estas de soldados coreanos de fronteira ou de uma mulher com véu muçulmano em Bagdá. E debates sobre muros e seus efeitos sobre as pessoas são frequentes.
Algo que faz jus ao espírito de Berlim. "Aqui conseguimos superar um muro", diz Franz Schulz, administrador regional do bairro onde ficam os restos do Muro. "Queremos, com esta exposição, chamar a atenção para o fato de que isso, infelizmente, ainda não aconteceu em vários lugares", completa.
Ou seja, a mostra não é apenas uma exposição de fotografias, mas também uma mensagem, como acrescenta a curadora Adrienne Goehler: "É um convite para que o mundo faça o mesmo".