Governo sob pressão no caso dos espiões no Iraque
24 de fevereiro de 2006O relatório sobre as atividades do Serviço Federal alemão de Informações (BND) em Bagdá, apresentado nesta quinta-feira (23/02), contraria as afirmativas feitas por Berlim em janeiro último: durante a guerra no Iraque, dois agentes alemães do Serviço Federal de Informações (BND) efetivamente forneceram dados aos Estados Unidos.
As lideranças das bancadas parlamentares dos partidos da coalizão – CDU/CSU e SPD – tentam deixar claro à opinião pública que o documento coloca também o governo alemão diante de fatos novos.
Após mais de um mês de investigações, o grêmio parlamentar de controle trouxe algumas revelações espantosas. Entretanto, ao negar, em janeiro, qualquer colaboração com os EUA, o governo federal alemão baseara-se no saber de que dispunha.
Sem utilidade militar
O texto de 90 páginas – uma fração das 300 laudas de evidências, analisadas pelo grêmio de controle – incluía detalhes da decisão do diretor do BND, August Hanning, de manter dois agentes na capital iraquiana, apesar de todo o corpo diplomático alemão estar sendo evacuado.
A ordem é datada de 17 de março de 2003, apenas três dias antes do início da invasão liderada pelos EUA, com uma série de ataques aéreos "cirúrgicos" contra alvos seletos em Bagdá. Uma das alegações centrais do escândalo é que os espiões do serviço secreto alemão teriam como missão identificar esses alvos, o que Berlim continua negando terminantemente.
Olaf Scholz, do Partido Social Democrata (SPD), faz questão de sublinhar: "Nenhuma das informações fornecidas pôde ser empregada para fins militares. Não há como torcer este fato". Isto é: em nenhum dos casos tratou-se de coordenadas utilizáveis nos futuros bombardeios norte-americanos.
Troca de favores
O relatório confirma que as informações passadas pelos homens do BND limitaram-se, em geral, a sítios civis protegidos ou humanitários, tais como "sinagogas e rolos da Torá, ou a possível localização de pilos norte-americanos desaparecidos".
Consta também que os agentes alemães dependiam das forças invasoras para sua segurança e mobilidade para investigar: "Em vista da possível necessidade de medidas de evacuação ou descontaminação, os agentes do BND dependeriam da disposição das autoridades norte-americanas em cooperar", afirma o relatório.
Caso delicado
O incidente é especialmente delicado do ponto de vista político, devido à oposição aberta do então chanceler federal, Gerhard Schröder, à guerra no Iraque. Tal postura resultou, por um lado, num distanciamento do país em relação aos EUA; embora por outro lado tenha garantido a reeleição da coalizão social-democrata-verde na Alemanha.
O fato também reflete negativamente sobre a atual premiê, Angela Merkel, que neste meio tempo excluiu qualquer possibilidade de um envio de tropas alemãs para o Iraque.
A oposição, em especial o Partido Verde, rejeita os argumentos paliativos do governo, exigindo uma CPI na qual os antigos membros do governo teriam que testemunhar sob juramento. Isso mesmo diante do fato de, na última quarta-feira (23/02), o grêmio parlamentar de controle haver se pronunciado contra uma ação neste sentido.