Guerra contra narcotráfico no México está longe de ter fim
6 de novembro de 2014Falando ao jornal El Universal nesta terça-feira (04/11), o presidente do México, Enrique Peña Nieto, prometeu que nos próximos dias vai "convocar representantes do Estado mexicano, partidos políticos e organizações sociais a firmarem um pacto nacional pela segurança".
Todos deverão se comprometer a mudanças fundamentais e a garantir a constitucionalidade do país, afirmou o presidente. "Ocorrências como o massacre de Iguala não podem se repetir."
Na noite de 26 para 27 de setembro último, na localidade de Iguala, estado de Guerrero, 43 estudantes de magistério foram vistos pela última vez. Oficialmente, eles estão registrados como "desaparecidos".
Foram encontrados 28 cadáveres carbonizados em seis valas comuns, porém, tudo indica não se tratarem dos jovens em questão. No dia 9 de outubro, descobriram-se outras quatro fossas contendo restos humanos.
Já foram presos 58 suspeitos de envolvimento do desaparecimento dos estudantes, entre eles policiais, agentes de segurança municipal e criminosos ligados ao narcotráfico.
Prisão do prefeito: uma vitória
Cerca de 150 mil pessoas já foram vitimadas pela guerra contra o narcotráfico no México, iniciada há oito anos. Nesta terça-feira, a promotoria pública anunciou mais um morto, o general Ricardo César Niño Villarreal. O alto funcionário da polícia, responsável pela segurança no norte do estado de Tamaulipas, foi executado com mais de 100 tiros. Por fazer fronteira com os Estados Unidos, a região é disputada pelos cartéis do narcotráfico.
No caso dos estudantes, as autoridades mexicanas registraram um primeiro sucesso com a prisão do foragido ex-prefeito de Iguala, José Luis Abarca, e de sua esposa, María de los Ángeles Pineda, num apartamento da Cidade do México.
Abarca é acusado de ter ordenado a prisão dos 43 estudantes da escola normal, a fim de impedir que perturbassem um discurso público de sua mulher. Após a detenção, os rapazes teriam sido entregues a membros de um cartel local e "desaparecido".
Ainda não há qualquer indício do paradeiro dos estudantes de magistério. Para Abel Barrera, fundador do centro de direitos humanos Tlachinollan, é "incompreensível" que eles "continuem desaparecidos, apesar de já terem sido detidos 58 suspeitos". Barrera, que em 2011 recebeu o Prêmio de Direitos Humanos da Anistia Internacional da Alemanha, acompanha e apoia os familiares das vítimas.
Cartéis em transformação
O abalo causado pelo presumível massacre de Iguale reacendeu no México o debate sobre o envolvimento entre instituições estatais e o crime organizado. Já em 2008, em seu livro La reina del pacifico (A rainha do Pacífico), a ex-líder do narcotráfico Sandra Ávila Beltrán revelava que, em alguns estados, a máfia controla até um terço dos prefeitos.
A guerra contra o narcotráfico se exacerbou desde a posse de Peña Nieto, em 2012. A captura de diversos chefes levou ao enfraquecimento de cartéis estabelecidos. Os grandes sindicatos do crime se esfacelaram e, no nível local, acirrou-se a disputa por rotas e regiões lucrativas.
"O perfil dos cartéis se modifica constantemente, de modo que estão sempre havendo confrontos pelo controle de certos territórios", explica Günther Maihold, vice-diretor do Instituto Alemão de Política Internacional e de Segurança (SWP). "Por isso, esses choques são mais visíveis no México do que em outros países."
Luta contra estruturas corruptas
Entretanto, Sandra Weiss, especializada em assuntos mexicanos, consegue ver um aspecto positivo nos desdobramentos atuais. "A pulverização dos cartéis em células pequenas, autônomas, deverá restringir seu poder a médio prazo."
Contanto que essa dinâmica seja acompanhada por uma ampliação maciça da presença estatal – não só das forças de segurança, mas também dos investimentos em educação, saúde e ofertas de lazer para a juventude –, o México poderá reconquistar a soberania em várias regiões, especula a especialista.
Para os familiares dos mortos e desaparecidos, tais perspectivas são um parco consolo. Eles atravessam a pé os 197 quilômetros entre Iguala e a Cidade do México para, no próximo domingo, mais uma vez exigirem do governo o esclarecimento do crime.
"Na guerra contra a máfia das drogas, há mais de 26 mil desaparecidos", aponta o ativista Abel Barrera Hernandez, que acompanha a marcha de protesto. "O governo quer modernizar o nosso país, mas nada mudou nas estruturas corruptas e no entrelaçamento entre o Estado e o crime organizado. Como é que isso vai dar certo?", questiona.