Guerra síria vive estagnação no campo de batalha e na diplomacia
1 de novembro de 2013Desde que, em junho passado, as tropas do regime de Bashar al-Assad tomaram, com ajuda da milícia Hisbolá, a cidade de Al-Kusair, nenhuma das partes envolvidas no conflito clamou uma grande conquista territorial. Os frontes da guerra civil síria são, hoje, amplamente solidificados.
Em Deraa, no sul do país, os rebeldes dominaram o centro histórico, mas não conseguiram expulsar as forças de Assad da cidade. Situação similar vive a província de Deir al-Sor, rica em petróleo. Ali, só os radicais islamistas ampliaram sua zona de influência, ainda que às custas dos rebeldes.
Segundo Joshi Shashank, especialista em síria do Royal United Services Institute (Rusi), chegou-se a um impasse no campo de batalha. Todas as partes, afirma, reforçaram os postos já conquistados. O regime controla agora um corredor de Deraa, passando por algumas áreas de Homs e a oeste em zonas na costa do Mediterrâneo. Ao mesmo tempo, rebeldes estão cada vez mais fortes no noroeste, ao longo do rio Eufrates e da fronteira com o Iraque.
"A diferença no lado rebelde é que não há uma aliança uniforme que controle o território conquistado", diz Shashank. Curdos contra jihadistas ligados à Al-Qaeda são responsáveis, por exemplo, pelas maiores rixas interna entre a oposição.
Ceticismo sobre negociações
Apesar dos mais de dois anos e meio de guerra e das mais de 100 mil mortes, nenhum lado dá sinais de que vai se entregar. O regime de Assad, a propósito, parece se ver numa posição mais forte do que antes.
"O regime conta que os rebeldes vão acabar se cansando", diz Eyal Zisser, especialista em Síria da Universidade de Tel Aviv. "Quando se batalha pela vida, a questão da sobrevivência é um tipo de vitória."
Shashank diz que Assad de fato acredita ter uma posição mais favorável e faz uma comparação do panorama atual com meados de 2012, quando as tropas do regime pareciam estar perdendo terreno. "Fazendo essa comparação, o regime está indo muito bem", afirma o pesquisador do instituto Rusi.
Apesar das poucas mudanças no campo de batalha, o governo sírio pode comemorar avanços no campo diplomático. Ao aceitar a destruição de suas armas químicas, Damasco abriu um novo canal com a comunidade internacional – e afastou o risco de uma intervenção militar americana.
Shashank explica que o Ocidente está cada vez mais hesitante em apoiar uma oposição cada vez mais dividida e influenciada pelo crescimento dos islamistas. Por isso, afirma, Assad deveria considerar participar das negociações de paz marcadas para o próximo dia 23, em Genebra.
Albert Stahel, especialista em estudos estratégicos, ressalta que as conversas na Suíça podem levar a uma pressão para a renúncia de Assad, mas sem implicar uma transição fundamental de poder na Síria. "O regime não pode colapsar. Ninguém quer que isso aconteça", opina.
Um país dividido
Turquia e Arábia Saudita, explica o especialista, gostariam de ver o poder passado aos rebeldes. Todos os demais parecem concordar, apesar dos repetidos apelos para Assad renunciar, que o regime em Damasco deve ser mantido, em prol da estabilidade. E é nesse ponto que os interesses de EUA, Rússia e Irã convergem.
Por sua parte, os rebeldes dizem só parar de lutar após a renúncia de Assad, que rejeita categoricamente a ideia. Uma solução política parece distante – mesmo alas da própria oposição já disseram que não irão a Genebra. A Coalizão Nacional Síria, que agrupa várias facções anti-Assad, ainda não confirmou presença.
Na prática, a Síria é um país dividido – uma colcha de retalhos repartida entre grupos pró-regime, curdos, salafistas, islamistas e outros vários. Se nem a diplomacia, nem o combate podem levar a guerra a um fim, a comunidade internacional pode se ver forçada, eventualmente, a aceitar um país dividido. Albert Stahel, porém, duvida que a situação chegue a tal extremo.
Shashank, por sua vez, diz que há preocupação em alguns países de que a Síria venha a repetir alguns elementos da história recente iraquiana. Em 1991, parecia que Saddam Hussein estava prestes a sair do poder. O Iraque enfrentava, após a Primeira Guerra do Golfo, zonas de exclusão aérea, embargo ao petróleo e revoltas ao então cada vez mais fragilizado ditador. "Parecia que era o fim da linha, mas depois ele acabou aguentando por mais 12 anos", lembra.