Intelectuais apóiam Schröder contra a guerra
23 de janeiro de 2003Ante os preparativos para uma guerra e o temor de que o governo alemão acabe dizendo sim na hora agá, um grupo de intelectuais, liderado pelo artista gráfico Klaus Staeck, criador da iniciativa "Ação por mais Democracia", pediu uma audiência com Schröder e foi imediatamente atendido.
Schröder mostra firmeza
Em parte por sua posição cada vez mais firme, desta vez o chanceler esteve bem mais à vontade do que em um encontro semelhante, em novembro de 2001, quando o tema era a presença alemã no Afeganistão. A Alemanha apenas enviou tropas para policiamento na fase de reconstrução, mas as palavras de Schröder na época, principalmente sua "solidariedade irrestrita" com os EUA, causaram mal-estar entre os intelectuais.
"Já não se disse tudo o que havia para dizer e não dá mais para deter a máquina de guerra?", teria perguntado cética a alemã oriental Christa Wolf, segundo o semanário Der Spiegel, um dos poucos órgãos da imprensa que teve acesso ao diálogo.
Reeleito opondo-se à guerra, o social-democrata Gerhard Schröder tratou de desfazer a impressão de insegurança, criada por declarações desencontradas de membros do seu governo: "Quem crê que a minha decisão foi tomada apenas por tática, está enganado."
"Alemanha não está isolada"
O governo alemão, segundo o chanceler, tem o direito e a obrigação de ter opinião própria. Mas não está isolado na questão do Iraque, pois conta com o apoio de 80% dos alemães e observa como outros governos europeus estão cada vez mais "sensíveis" às discussões em seus países. Uma maioria tão expressiva contra a guerra na Alemanha é de "importância histórica". "Estou orgulhoso disso", acrescentou.
O compositor Wolfgang Niedecken, a cantora Katja Ebstein, os diretores de cinema e tevê Hark Bohm e Hans Geissendörfer escutaram com muito interesse as ponderações de Schröder sobre o que se pode fazer para evitar uma guerra. Ganhar tempo, por exemplo, faz parte da tática.
O dilema alemão: independência x solidariedade
Por mais firme que esteja o "não" da Alemanha, persiste o dilema de um país entre a sua independência e os compromissos como membro da OTAN. Schröder não é contra a atuação de tripulantes alemães nos aviões de reconhecimento, desde que seja em defesa de um aliado. Mas seu uso para rastrear alvos no Iraque, "isso já seria participação na guerra", objetou. Por outro lado, o chanceler pediu a compreensão do grupo para o fato de não poder negar aos EUA o uso de suas bases na Alemanha ou o direito de sobrevoar território alemão.
Os intelectuais concordaram com essa visão diferenciada e até Staeck, que não é precisamente um fã de Schröder, elogiou a posição do governo: "Nós somos os melhores alunos dos EUA, no que diz respeito à democracia: nos damos ao luxo de ter opinião própria." Tanto ele como Grass, porém, insistiram em que se deve "cobrir uma retirada pacífica", isto é, encontrar uma forma de levar os EUA a "mudarem o roteiro da guerra", como expressou-se um dos autores da mais famosa série policial da TV alemã, Fred Beinersdorfer, "sem perder o brio".
Às ruas contra a resignação
Mesmo cabendo a decisão aos americanos, é preciso tirar as pessoas da resignação de que a guerra é inevitável, exigiram Christa Wolf e o pastor Friedrich Schorlemmer, uma das principais figuras do movimento pacifista no leste da Alemanha. O encontro, na noite de segunda-feira (20), na chancelaria em Berlim, acabou com constatação unânime de que políticos e artistas precisam ganhar as ruas juntamente com a população.
O Nobel de literatura Günter Grass sugeriu um encontro na Igreja de São Paulo, em Frankfurt, para unir as forças contra a guerra. O compositor Wolfgang Niedecken propôs que isso seja feito em sua cidade, na Catedral de Colônia, um símbolo da paz, por ter sido preservada nos bombardeios da Segunda Guerra. E a intervenção das cabeças críticas do país parece haver dado novo alento a Schröder, que na terça-feira (21) confirmou, pela primeira vez, que a Alemanha não votará pela guerra no Conselho de Segurança.