Irã ataca bases usadas pelos EUA no Iraque
8 de janeiro de 2020O Irã lançou mísseis contra duas bases que abrigam tropas americanas no Iraque. Segundo os EUA, pelo menos 12 mísseis foram lançados a partir do Irã contra as bases de Al Asad e Erbil na madrugada desta quarta-feira (08/01) no horário local (noite de terça-feira no Brasil).
O anúncio do ataque foi originalmente divulgado pela imprensa estatal do Irã. Segundo o governo iraniano, a operação faz parte de uma campanha de retaliação contra os EUA pelo ataque que matou o general Qassim Soleimani na semana passada.
A operação, segundo a imprensa iraniana, foi batizada como "Mártir Soleimani" e foi conduzida pela divisão aeroespacial da Guarda Revolucionária, que lançou mísseis superfície-ar contra as bases.
"A vingança feroz da Guarda Revolucionária já começou", disse a Guarda Revolucionária Islâmica do Irã em um comunicado no Telegram, segundo o jornal The New York Times.
A base aérea de Al Asad fica a 120 quilômetros a oeste de Bagdá. Já a base de Erbil fica no norte do Iraque. Ainda não há informações oficiais sobre mortes e extensão dos danos, mas relatos iniciais indicam que nenhum americano ou membro das forças da coalizão que atua no Iraque foi morto ou ferido.
Pouco depois de o ataque ser anunciado pelos iranianos, o Pentágono confirmou a ação em um comunicado. "Aproximadamente às 17:30 (horário da costa leste dos EUA) de 7 de janeiro, o Irã lançou mais de uma dúzia de mísseis balísticos contra as forças militares dos EUA e da coalizão no Iraque. Está claro que esses mísseis foram lançados do Irã e tiveram como alvo pelo menos duas bases militares iraquianas que abrigam militares dos EUA e da coalizão em Al Asad e Erbil."
Segundo o Pentágono, as bases já estavam em alerta máximo por conta de "indicações de que o regime iraniano planejava atacar" forças americanas na região.
Além de tropas americanas, Erbil também abriga pelo menos 115 militares da Alemanha que atuam como consultores e no treinamento de forças iraquianas e curdas. A base de Al Asad, por sua vez, também abriga cerca de 70 militares da Noruega e foi visitada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, em 2018.
Segundo a agência de notícias alemã DPA, o comando local das Forças Armadas da Alemanha informou que nenhum soldado do país ficou ferido no ataque a Erbil. "Eles estão bem", disse um porta-voz.
Já a Casa Branca afirmou que o presidente dos EUA, Donald Trump, foi informado sobre os ataques.
"Estamos cientes dos relatos de ataques às instalações dos EUA no Iraque. O presidente foi informado e está monitorando a situação de perto e consultando sua equipe de segurança nacional", disse Stephanie Grisham, secretária de imprensa da Casa Branca.
A equipe do presidente Trump chegou a afirmar que o presidente estava se preparando para um possível pronunciamento ainda durante a noite, mas, depois, a Casa Branca informou que ele não falaria mais. Pelo Twitter, Trump disse que uma declaração oficial será divulgada na quarta-feira. "Até aqui tudo bem! Temos as Forças Armadas mais poderosas e bem equipadas do mundo!", escreveu o presidente, com uma retórica menos agressiva do que em tuítes publicados nos últimos dias.
Após o ataque, a Guarda Revolucionária do Irã ainda ameaçou envolver mais aliados dos EUA em sua vingança.
"Estamos alertando todos os aliados dos americanos que deram suas bases ao seu exército terrorista de que qualquer território que seja usado como ponto de partida de atos agressivos contra o Irã será alvo [de retaliação] ", diz um comunicado divulgado pela TV do Irã.
Nesta terça-feira, o Parlamento do Irã aprovou uma lei que designou as Forças Armadas dos EUA como "terroristas". A Guarda citou como possíveis alvos de uma retaliação as cidades de Haifa, em Israel, e de Dubai, nos Emirados Árabes.
O ataque ocorreu horas depois do sepultamento do comandante militar iraniano Qassim Soleimani, que foi morto em Bagdá na última sexta-feira durante um ataque americano conduzido por um drone.
Ainda nesta terça-feira, o secretário de Defesa dos EUA, Mark Esper, já havia dito que os EUA estavam esperando uma eventual retaliação do Irã pela morte de Soleimani.
"Acho que devemos esperar que eles retaliem de alguma forma", disse Esper em entrevista coletiva no Pentágono. "Estamos preparados para qualquer contingência. E então responderemos adequadamente ao que eles fizerem."
Os EUA têm cerca de 5 mil soldados no Iraque.
Após o ataque, o ministro das Relações Exteriores do Irã, Javad Zarif, disse que a operação contra as bases foi "concluída" e que a ação foi "proporcional" ao que prevê o artigo 51 da Carta das Nações Unidas, cujo texto autoriza países a agir em autodefesa. Segundo ele, a operação teve como alvo bases "usadas num ataque covarde" contra cidadãos do Irã.
Ele também disse que seu país "não busca agravar" a situação ou provocar uma guerra, mas que Teerã "vai se defender contra qualquer agressão", aparentemente sugerindo que o Irã não deve tomar novas ações retaliatórias por enquanto e que vai aguardar a reação americana.
Já Saeed Jalili, um conselheiro do líder supremo do Irã. Ali Khamenei, publicou no Twitter uma imagem com a bandeira do Irã.
A publicação parece uma referência a uma mensagem que Donald Trump publicou na última sexta-feira, após a morte do general Soleimani, que mostrava uma bandeira dos EUA.
O ministro das Telecomunicações do Irã, Mohammad-Javad Azari Jahromi, por sua vez, escreveu no Twitter: "Caiam fora da nossa região!"
O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, disse nesta quarta-feira que o ataque não foi suficiente para o país se vingar dos EUA e defendeu a expulsão de todas as tropas americanas da região do Oriente Médio.
"Eles ganharam um tapa na cara, mas tal ação militar não é suficiente. A presença corrupta dos EUA deve acabar", disse o líder, em um discurso na cidade de Qom, que foi transmitido pela televisão.
Khamenei disse ainda que os americanos levaram "guerra, revolta e destruição" para o Oriente Médio, diante de uma multidão que repetidamente gritava "morte aos EUA" e "morte a Israel". "A região não aceita a presença dos Estados Unidos", insistiu.
O líder supremo elogiou também Soleimani, descrevendo-o como "corajoso" e "grande combatente e revolucionário", comprometido com a Revolução Islâmica e o legado do aiatolá Ruhollah Khomeini.
O general Soleimani, de 62 anos, era líder da poderosa Força Quds da Guarda Revolucionária iraniana, unidade de elite responsável pelo serviço de inteligência e por conduzir operações militares secretas no exterior. Ele era considerado a segunda pessoa mais importante do Irã, atrás apenas do líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei.
O ataque foi criticado pela comunidade internacional. O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, condenou a ação militar iraniana e pediu que o Irã se abstenha do uso da violência.
O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, também defendeu a contenção e disse que o bombardeiro é mais um exemplo da escalada do confronto.
Além de criticar o ataque, a Alemanha, a França e o Reino Unido apelaram para a redução da violência na região. "A França continua determinada a trabalhar para aliviar as tensões e está em contato com todas as partes para encorajar a contenção e a responsabilidade", disse o ministro do Exterior francês, Jean-Yves Le Drian.
Já o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, disse que, se Israel for atacado, haverá retaliação. Ele chamou Soleimani de "chefe do terrorismo" no Irã.
Além de prometer vingança após a morte do general, o Irã anunciou que deixará de respeitar todos os limites impostos pelo acordo nuclear assinado em 2015.
Para justificar o bombardeiro que matou o general, os Estados Unidos o acusaram de matar soldados americanos e de estar planejando a ataques a tropas do país. A morte de Soleimani, por sua vez, ocorreu três dias depois de uma milícia iraquiana apoiada pelo Irã atacar a embaixada dos EUA em Bagdá.
Antes disso, o ano de 2019 já havia sido marcado por uma série de choques entre o Irã, os EUA e os aliados dos americanos na região. Os episódios de tensão incluíram o bombardeio de uma mega refinaria saudita, a derrubada de um drone americano e a tomada de um petroleiro britânico pelos iranianos. No ano passado, Trump afirmou ainda que cancelou na última hora um ataque iminente ao Irã.
As relações entre os EUA e o Irã, que são turbulentas desde 1980, voltaram a se deteriorar em 2018, quando os americanos se retiraram do acordo nuclear assinado com Teerã e voltaram a impor sanções contra os iranianos.
Em meio às ameaças de retaliação por parte de Teerã, o presidente dos EUA, Donald Trump, avisou que os militares dos EUA fizeram uma lista de 52 locais no Irã que podem ser atacados e que as forças americanas os atingiriam "muito rápido e com muita força" se a república islâmica atacasse pessoal ou bens americanos.
Devido à escalada na tensão no Oriente Médio, a Administração Federal de Aviação dos Estados Unidos (FAA) proibiu voos americanos sobre o espaço aéreo do Iraque, Irã e em algumas regiões do Golfo Pérsico. A agência alertou para o "potencial erro de cálculo ou identificação incorreta" de aeronaves civis.
As restrições de voo costumam ser preventivas para evitar que em zonas de conflitos aviões civis sejam confundidos com militares. A FAA disse que emitiu a proibição devido à "intensificação das atividades militares e ao aumento das tensões políticas no Oriente Médio".
Companhias aéreas e também suspenderam voos pelo espaço aéreo do Irã e do Iraque depois que um avião ucraniano caiu logo após decolar do aeroporto de Teerã. Investigações preliminares apontam que o incidente teria sido causado por uma falha mecânica.
Entre as empresa que estão evitando a rota estão a Lufthansa, Air France, Qantas, Malaysia Airlines e Singapore Airlines. A Lufthansa cancelou ainda voos diários entre Frankfurt e Teerã e um para Erbil, no Iraque, que estava programado para o próximo sábado.
JPS/CN/rtr/ap/afp/ots
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