Lei de proteção a prostitutas irrita profissionais do sexo
1 de fevereiro de 2015"Por um tempo, eu era super orgulhosa do trabalho com o sexo", conta Nadine, de 30 anos, cabelos cacheados louros e casaco negro felpudo. "Eu tinha orgulho dos meus clientes fixos. Você ganha 150 euros por uma 'rapidinha' e pensa: 'uau, isso é tudo de bom!'"
Embora ela tenha sentimentos ambivalentes em relação ao que chama de "cultura do bordel do plástico", durante dez anos, a prostituição foi a melhor forma de Nadine ganhar dinheiro.
Antes da lei da prostituição de 2002, o contrato entre cliente e profissional do sexo era classificado como atentado aos bons costumes na Alemanha. Os donos de bordéis corriam risco de ser autuados por rufianismo (exploração da prostituição).
Hoje, eles são estabelecimentos comerciais como qualquer outro, e a atividade é plenamente legal. As operárias do sexo, que sempre tiveram que pagar impostos no país, têm agora direito a seguro social e de saúde. A possibilidade teórica de um emprego fixo não encontrou aceitação no meio. Enquanto a maioria das prostitutas têm seguro de saúde, poucas pagam aposentadoria, conforme um estudo encomendado pelo governo alemão.
Lei liberal
A mudança na legislação estimulou Kerstin Berghäuser a abrir seu próprio bordel diurno em Berlim. Ela mesma já exercera a atividade durante oito anos, para pagar rapidamente suas dívidas, mas aí resolveu se tornar autônoma.
"O ponto decisivo foi a entrada em vigor da lei da prostituição, me dando a certeza de que eu não estava fazendo nada de proibido. Eu queria providenciar boas condições de trabalho para as mulheres. Antes, só ter preservativos na loja já era taxado de incentivo à prostituição."
A lei alemã sobre o assunto é uma das mais liberais do mundo. Ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, onde a atividade é ilegal. Ou da Suécia e a França, em que o comércio do sexo é proibido, e os clientes estão sujeitos a penalidades.
Movimento antiprostituição
O movimento antiprostituição da Alemanha também reivindica atualmente a criminalização da clientela. Seus argumentos centrais são de que o tráfico humano vem crescendo, e que a maior parte das mulheres seria forçada a se prostituir. Na realidade, porém, faltam estatísticas concretas sobre ambas as afirmativas.
Os opositores do movimento apontam dois aspectos. Primeiro, a lei da prostituição teria como objeto os serviços sexuais prestados voluntariamente. Quem constringe alguém ao sexo, por outro lado, está cometendo crime de estupro, rufianismo ou tráfico de pessoas com fins de exploração sexual ou de mão de obra.
Em segundo lugar, a legislação não poderia ter facilitado o tráfico humano, porque não trata dele. A socióloga Barbara Kavemann, que avaliou a lei de 2002, defende que o aumento do tráfico na Alemanha se deve, antes, à ampliação da União Europeia com os países do Leste.
Leis de imigração restringem possibilidades
A partir 2004, a UE integrou 13 novos Estados, sobretudo do Leste Europeu, antes sob domínio soviético. Desde então, as mulheres desses países têm permissão para ingressar e permanecer na Alemanha.
Paula é uma delas. A delicada búlgara, de cabelos longos quase negros, esperava poder trabalhar como cozinheira na Alemanha, mas foi deixada defronte a um prostíbulo, o que pode ser tomado por tráfico humano, já que Paula não falava alemão, não tinha dinheiro e não sabia a quem recorrer. De início, chorou e se recusou a trabalhar – mas acabou exercendo o ofício durante cinco anos, por necessidade financeira.
A dona do bordel a obrigava a trabalhar de 6h às 22h e ficava com metade dos ganhos. Algumas vezes, Paula voou para a Bulgária, mas acabou retornando à Alemanha. Não podendo ter emprego fixo, por ser búlgara, voltava a trabalhar no bordel. A lei de imigração alemã não lhe deixava alternativa. Mesmo assim, nunca aceitou ter um cafetão, defendendo-se sozinha dos clientes que não se comportavam ou que queriam sexo sem preservativo.
Mechthild Eickel, da central de aconselhamento para trabalhadoras sexuais Madonna, em Bochum, assegura que mesmo migrantes como Paula nem sempre são vítimas. "Muitas mulheres trabalham sob condições muito difíceis. Mas é uma decisão delas."
Berlim quer proteger prostitutas
Então, o sexo é uma atividade profissional como qualquer outra? Não, até mesmo porque quem a exerce continua sendo encarado com desprezo: apenas poucas podem declarar abertamente de onde vem seu dinheiro.
Mas, como afirma o slogan de um movimento da classe, "trabalho com sexo é trabalho", e as mulheres e homens que encaram a prostituição como uma forma de prestação de serviço, exigem boas condições para exercê-la.
A coalizão de governo em Berlim, formada por conservadores cristãos e social-democratas, está estudando no momento uma legislação de proteção aos profissionais do sexo. Ela prevê, entre outros pontos, idade mínima de 21 anos, cadastramento obrigatório e exames médicos compulsórios.
Profissionais de ambos os gêneros tem protestado, por exemplo, através da Federação Alemã de Serviços Eróticos e Sexuais (BesD). Representantes de outras organizações – como de combate à aids, auxílio a mulheres e das juristas alemãs – também argumentam que a lei poderia favorecer a estigmatização de quem se prostitui, obrigando-os a buscar a clandestinidade.
O escoteiro e a velhinha
Alvo de críticas também é a proposta de penalizar os clientes que conscientemente procurem vítimas de tráfico humano. Alega-se que os clientes muitas vezes fornecem informações anônimas à polícia: com a criminalização, isso supostamente não ocorreria mais.
Johanna Weber, da BesD, se declara a favor de padrões trabalhistas e de um status de permanência assegurado para suas colegas estrangeiras – mas não de uma lei de proteção à classe.
Ela compara a situação à piada do escoteiro que, para cumprir sua boa ação diária, ajuda uma velhinha a atravessar a rua. Só ao chegar do outro lado é que constata que a senhora queria ir na outra direção.
"É assim que lidam no momento conosco, prostitutas. Querem nos salvar todas. E nós temos que ficar dizendo, a cada cinco minutos: 'não, a gente não quer salva!'"