Londres um ano após os atentados
7 de julho de 2006No dia 7 de julho de 2005, Rachel North ia da estação de metrô Kings Cross até a Russell Square, quando uma bomba explodiu a seu lado. O momento mudou sua vida, conta North hoje, um ano depois do ocorrido.
"Gostaria de nunca mais pensar nisso, poder ir ao trabalho, ao cabelereireio, sair de férias, fazer, enfim, tudo o que eu costumava fazer antes, sem ter que me lembrar daquele dia. Mas a verdade é que havia pessoas estraçalhadas ao meu lado", recorda North em entrevista à DW-WORLD.
North, que prefere dar seu depoimento usando um peseudônimo, deu início a um blog de sobreviventes do atentado, auxiliou na fundação do grupo de apoio Kings Cross United, e encaminhou uma petição online, com a intenção de forçar o governo a conduzir investigações públicas sobre o caso.
Correndo riscos
"Não se trata de colocar a culpa em alguém ou numa ação política. As grandes questões da nossa época, como liberdade, medo e segurança, têm que ser debatidas publicamente, com a participação de todos. E mesmo que o governo não ache bom, somos nós que estamos arcando com os custos. Nós é que estamos correndo riscos em trens, ônibus e nas ruas todos os dias. Queremos saber o que aconteceu e por que aconteceu", diz North.
Encontrar respostas para essas perguntas é tarefa difícil. O governo britânico insiste em afirmar que uma investigação dessas iria sair cara demais e seria um desperdício de recursos no combate ao terrorismo.
Comunicação desastrosa
Esclarecer o que aconteceu exatamente naquela tarde tumultuada de Londres há um ano atrás – quando quatro homens-bomba explodiram três trens da linha urbana de metrô e um ônibus de dois andares, deixando um saldo de 52 mortos e centenas de feridos – é apenas uma das reivindicações das vítimas.
A constatação de que os sistemas de comunicação da cidade desmoronaram, aumentando ainda mais o caos nas horas que se seguiram aos atentados, aumentou a sensação de frustração entre sobreviventes e especialistas em segurança.
"Já se sabia há 14 anos que os sistemas de comunicação não funcionam de maneira apropriada, mas as autoridades não dispenderam os recursos necessários para repará-los. As primeiras reações de base foram imediatas, mas os superiores pisaram na bola", diz Robert Ayers, analista de segurança da Chatham House, instituto de política externa sediado em Londres.
Nos dias e meses que sucederam ao atentado, as autoridades britânicas foram à caça de uma horda de conspiradores de todos os tipos, prenderam possíveis suspeitos e aprovaram leis, que, em tese, deveriam aumentar a segurança e ajudar os investigadores a encontrar supostos terroristas. Especialistas no assunto acreditam, porém, que os esforços do governo neste sentido foram vãos.
Medidas insuficientes
Ao contrário dos EUA, que depois do 11 de setembro iniciaram uma campanha antiterrorista mais bem coordenada e centralizada, os serviços britânicos continuaram à mesa, apontam especialistas.
"Há uma tentativa de cooperação, mas nenhuma organização com autoridade superior e nenhum orçamento ou administração central. E não houve uma melhoria na coordenação. Não se pode tomar instituições diferentes, que trabalham cada uma de um jeito, a partir de princípios diversos, e querer que elas respondam de forma eficiente num momento de caos", diz Ayers.
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Respeito aos direitos civis
Depois dos atentados, o governo britânico ainda aprovou outras leis de combate e prevenção ao terrorismo. Estas ampliam o poder da política para deter e inquirir os cidadãos com mais facilidade e sobem para 28 o número de dias que suspeitos podem ficar detidos sem comprovação de provas.
Além disso, passou a ser considerada crime a "glorificação" do terrorismo. Suspeitos também podem ser obrigados a permanecer por 18 horas dentro de casa, sem uso de celulares ou acesso à internet.
Questionamento de táticas
Essas medidas geraram várias críticas, que apontam um cerceamento perigoso dos direitos civis do cidadão. Uma corte britânica deu, na última semana, seu veredicto a respeito, confirmando que tais medidas de controle violam a Convenção Européia no tocante ao respeito aos direitos humanos. Até mesmo instâncias governamentais vêm questionando tais táticas.
"Medidas de combate ao terrorismo devem ser usadas para fins relacionados ao terrorismo. Caso contrário, sua credibilidade acaba caindo por terra", escreveu Lord Carlile, encarregado do governo para questões relacionadas ao terror, em seu relatório anual, publicado em junho último.
"Numa comunidade que se caracteriza pela diversidade cultural, o uso errôneo do poder contra pessoas inocentes pode causar danos às relações pessoais", completa o especialista.
Poucos resultados e muita tensão
O que realmente aconteceu? Centenas de detenções e dezenas de buscas em casas de muçulmanos que vivem no Reino Unido trouxeram poucos resultados concretos, mas definitivamente aumentaram a tensão dentro da comunidade, afirmam as autoridades.
De acordo com um editorial do jornal mensal Muslim News, publicado pela comunidade muçulmana no país, este tipo de comportamento não é melhor do que "as políticas de punição coletiva ao estilo de Israel, a partir das quais os membros da comunidade muçulmana vêm sendo sacrificados e condenados a viver sob o medo de ser, a qualquer momento, procurados ou revistados pela polícia".
E agora esta comunidade, ao lado de sobreviventes e da opinião pública, insiste no pedido de esclarecimento público dos atentados, que deveria dar lugar aos relatórios difusos oferecidos pelo governo.
Em busca de justiça
Robert Ayers diz que uma investigação pública, como a conduzida nos EUA após o 11 de setembro, é necessária para esclarecer a situação e permitir às vítimas encerrar este capítulo em suas vidas.
"Há uma desconfiança inata da opinião pública em relação ao que realmente aconteceu e ao que o governo diz que aconteceu. Um investigação correta poderia por um fim às teses, hipóteses e teorias de conspiração que vêm circulando. E poderia ajudar a aliviar o sofrimento dos sobreviventes, fornecendo a eles certezas sobre os fatos", analisa Ayers.
Os sobreviventes, por sua vez, afirmam que não estão em busca de soluções que coloquem fim a seus problemas, mas de medidas que possam salvar vidas no futuro. "Esta realidade é muito dura para nós. Seria mais fácil colocar uma pedra em cima de tudo isso. Mas acreditamos que uma investigação possa trazer lições que venham a salvar a vida de inocentes no futuro. E por isso continuamos lutando por justiça" conclui North.