Madeireiros são expulsos de reserva dos índios Awá no Maranhão
26 de fevereiro de 2014Tratores desfazem construções, cercas e estradas. Após uma intensa campanha internacional, tudo o que foi erguido ilegalmente por madeireiros e fazendeiros está sendo removido das terras pertencentes aos índios da etnia Awá-Guajá, no interior do Maranhão.
As tropas da Força Nacional acompanham as ações de despejo que devem ser cumpridas até o dia 9 de março. Na última segunda-feira (24/02), expirou o prazo de 40 dias dado pela Justiça Federal para que os invasores da reserva homologada em 2005 deixassem o local de forma voluntária.
O território dos Awá fica entre os municípios de Centro Novo Maranhão, Governador Newton Bello, São João do Caru e Zé Doca, no noroeste do estado. Apesar de o direito dos 399 índios da etnia a essas terras ser reconhecido desde 1961, eles sofrem ameaças. O principal motivo é a construção da Estrada de Ferro Carajás, que abriu caminho para a chegada de madeireiros ilegais e outros invasores na década de 1980.
A operação realizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) encontra a resistência de trabalhadores rurais, mas não houve confrontos violentos. O dono de uma propriedade destruiu uma ponte que dava acesso ao terreno e uma moradora que tentou agredir servidores públicos foi detida.
De acordo com o Incra, 224 das 427 famílias que viviam no território dos Awá serão assentadas em terras da reforma agrária nos municípios de Parnarama e Coroatá e terão acesso ao Programa Minha Casa Minha Vida Rural.
Uma nova invasão
Ainda assim, o temor de entidades que trabalham pelos direitos dos povos indígenas é que os posseiros voltem a ocupar as reservas, como já aconteceu com outros povos. Em janeiro, a Justiça Federal do Mato Grosso solicitou o envio da Força Nacional à reserva de Marãiwatsédé, pertencente aos Xavantes, que depois de um ano da desocupação, voltou a ser invadida pelos posseiros. Um dos motivos seria a demora do Incra para reassentar as famílias.
"Como o programa é falho, a tendência é que eles voltem. Temos cobrado da Funai um plano de controle para haver uma fiscalização permanente, mas não temos resposta", diz Madalena Borges, membro do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Maranhão.
Falta de fiscalização
Além de fazer a operação de desintrusão – a retirada de não-índios e de suas edificações e benfeitorias –, a Funai obstruiu ramais e estradas de acesso à reserva indígena. Uma estrada periférica que passa apenas pela base de proteção etnoambienal da Funai, instalada no entorno da área pertencente aos índios, ainda será construída.
"O servidor da Funai que vai ficar na base de proteção dos Awá vai desenvolver a atividade de vigilância após o serviço de desintrusão", explica o coordenador-geral de Índios Isolados e Recém-Contatados do órgão, Carlos Travassos. "Qualquer outro acesso que for feito no sentido de corromper o interior da terra indígena vai ser identificado e os órgãos de segurança vão atuar."
Entidades como o Cimi, no entanto, alegam que a fiscalização feita pela base de proteção etnoambiental não é suficiente para conter as invasões. Apesar das operações de retirada de posseiros, as terras dos índios Cricati, no sudoeste do Maranhão, por exemplo, são constantemente invadidas.
Outra preocupação é com o reflorestamento das reservas. Com um terço da área foi devastada pelos posseiros, o território dos índios Awá terá de passar por um processo de recuperação ambiental. "Serão levantados os impactos e definidas ações prioritárias de reflorestamento e recuperação de nascentes. O trabalho começa em abril", prevê Travassos.
Campanha internacional
Os Awá são uma das últimas tribos nômades de caçadores do Brasil que vivem essencialmente da coleta e da caça na floresta. Em 2012, a ONG Survival International, que trabalha pelos direitos dos povos indígenas, iniciou uma campanha internacional em prol da etnia considerada uma das mais ameaçadas do mundo.
O aclamado fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado publicou um ensaio na revista norte-americana Vanity Fair para que a situação dos índios Awá fosse conhecida globalmente. O Ministério da Justiça recebeu 56 mil mensagens com pedidos para que a reserva fosse protegida. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos também exigiu respostas do governo brasileiro.
Segundo o Ibama, a área devastada nas áreas de maior porte ultrapassa 2 mil hectares. Imagens de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que, entre 2000 e 2009, a invasão de posseiros provocou o desmatamento de 30% da área florestal, o equivalente a 36 mil hectares.