Maratona de negociações no México
27 de maio de 2004O presidente da Câmara de Comércio Brasil-Alemanha de São Paulo, Ingo Plöger, compara as negociações deste fim de semana sobre a criação de uma zona de livre comércio transatlântica entre União Européia e Mercosul com uma maratona. "Faltam-nos, talvez, os últimos cinco quilômetros e isso significa que já superamos a maior parte, mesmo que no trecho restante eventualmente tenhamos que enfrentar uma montanha", disse às vèsperas da conferência UE-América Latina, nesta sexta-feira e sábado, em Guadalajara, no México.
Vice-presidente do Fórum Econômico UE-Mercosul, criado há cinco anos, na conferência do Rio, Plöger espera que as delegações européias bem como os representantes da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai não percam o fôlego. "Este risco sempre existe, sobretudo quando as forças diminuem e a resistência interna aumenta muito. Ambos os lados têm suas resistências, suas áreas sensíveis. O Fórum está convicto de que vale a pena realizar mais algumas rodadas de negociações com todo o empenho possível, porque esta maratona só pode ser vencida em conjunto, se os dois blocos atingirem a linha de chegada. Não basta que apenas um chegue ao final", disse à DW-WORLD.
Alemanha
Na sua avaliação, a Alemanha é o motor da corrida por uma zona de livre comércio de 675 milhões de consumidores, com um Produto Interno Bruto (PIB) de mais de 10 trilhões de euros. Já os dez novos países-membros da UE estariam encarando o assunto com certa lentidão, por serem fortemente agrícolas.
Segundo Plöger, a Alemanha desempenha um papel decisivo nas negociações, por ser tradicional parceira do Mercosul, não apenas no setor tecnológico, como ainda por ser sensível às questões relacionadas a produtos agrícolas. "Mas também na Alemanha existem dúvidas e resistências no setor agrário, que precisam ser superadas", diz.
América unida
A UE disputa com os Estados Unidos o acesso ao mercado latino-americano. Os EUA pretendem criar em 1º de janeiro de 2005 a maior zona de livre comércio do mundo, do Alasca até a Terra do Fogo, mas ainda enfrentam a resistência de países como o Brasil, a Argentina ou Venezuela. Ingo Plöger acredita, porém, que, de qualquer forma, haverá uma união dos dois subcontinentes.
"Continentes têm a tendência natural de se unirem. Isso vale tanto para a Europa quanto para a América. Portanto, mais cedo ou mais tarde, haverá uma América unida. A questão é, com que velocidade e de que forma.", afirma. Plöger acha que uma eventual eleição do democrata John Kerry para a presidência dos EUA, em 02 de novembro, poderá acelerá o processo.
Os europeus têm um trunfo para enfrentar a proximidade dos EUA com a América Latina. "A UE está de olho não só na política econômica e, sim, considera também aspectos de integração política, da segurança e da educação. Por isso almejamos uma rede mais ampla de integração com a União Européia, que também reconhece isso. E, como disse o presidente Lula, em sua campanha eleitoral, seu sonho é criar um modelo sulamericano semelhante à UE", lembra o teuto-brasileiro.
O governo brasileiro sabe que um acordo entre o Mercosul e a UE seria passo decisivo nessa direção. Segundo Ingo Plöger, a não concretização do acordo pode representar perdas equivalentes de 1% a 1,5% do PIB do Mercosul, ou seja, entre seis e nove bilhões de dólares por ano. A União Européia sofreria perdas de oportunidades semelhantes ou até maiores. Mas a UE é um parceiro estratégico e, por isso, não se deve perder de vista o objetivo", conclui.
Debate necessário
A discussão dos europeus e latino-americanos sobre a cooperação econômica, na cúpula do México, parece mais do que necessária. A balança comercial dos dois blocos poderia ser melhor. As importações pela UE de produtos dos principais países da região novamente aumentaram, no ano passado, mas as exportações recuam continuamente, nos últimos anos.
Também para o comércio exterior alemão, os países latino-americanos desempenham um papel quase insignificante, comparado com outras nações. Tanto nas importações quanto nas exportações, o país sulamericano melhor posicionado encontra-se em 26º lugar (importações: Brasil: exportações: México). Um quadro semelhante repete-se nas relações comerciais dos demais países europeus com a América do Sul.
Segundo Christof Römer, do Instituto da Economia Alemã, dois importantes países do Mercosul, o Brasil e Argentina, precisam se recuperar de sua profunda crise econômica e garantir a estabilidade. "Somente então podem esperar novos investimentos externos e aumentar o interesse por seus produtos na Europa", diz.
Para os bispos católicos da União Européia e da América Latina, esta não é a única saída. Em documento conjunto publicado nesta quinta-feira (27/06), em Bruxelas, eles conclamam os países industrializados a abrirem seus mercados para os produtos agrícolas dos latino-americanos. "Em parte, os mercados latino-americanos até são inundados com produtos agrícolas subvencionados dos países ricos", reclamam.