Rio 2016
13 de março de 2010Belo, deslumbrante, contagiante, maravilhoso. São os adjetivos que acompanham a proposta de uma cidade candidata a sede de grandes eventos esportivos – e são os mais citados no vídeo de apresentação do Rio de Janeiro, que receberá as Olimpíadas em 2016.
E quando a movimentação trazida pelo esporte vai embora e a cidade volta à rotina, os resultados não são exatamente positivos. É o que aponta o relatório da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada, redigido pela urbanista brasileira Raquel Rolnik.
Em entrevista à Deutsche Welle, Rolnik falou sobre os efeitos que a cidade brasileira deve vivenciar até 2016. "Infelizmente, na proposta que o Rio fez, e venceu, não está claro qual será o destino das comunidades diretamente atingidas pelos jogos." Segundo a urbanista, as obras de preparação na cidade afetarão mais de 30 comunidades pobres.
A maior parte do complexo olímpico ficará na Barra da Tijuca e, no caminho da grande ambição de transformar a cidade em paisagem perfeita para o público internacional, estão assentamentos carentes, como a Vila do Autódromo.
"Houve uma tentativa de remover os moradores por causa do Pan [Jogos Panamericanos de 2007], o que acabou não acontecendo, em razão da resistência da comunidade. E agora, novamente, a Vila do Autódromo está ameaçada de remoção", afirma a relatora.
Moradores das favelas instaladas em regiões como Pedra Branca, Restinga, Cortado e Canal do Anil estão apavorados com a perspectiva de remoção.
Procurada pela Deutsche Welle, a Secretaria de Habitação do Rio de Janeiro não se manifestou sobre a questão.
Histórico de impactos
Há ainda outras questões relacionadas à moradia que se escondem por trás da organização de grandes eventos esportivos. "Tudo isso afeta o mercado imobiliário, os preços, são os efeitos indiretos", pontua Rolnik.
Segundo a relatora da ONU, o fenômeno acontece porque, cada vez mais, o setor privado está envolvido na organização. "Os jogos olímpicos passam a ser uma vitrine para vender a cidade e para vender oportunidades de negócios na cidade para além dos próprios jogos."
Nas Olimpíadas de Barcelona, em 2000, o problema ficou mais em evidência: a cidade sofreu uma reestruturação urbanística total, que trouxe um grande desenvolvimento. Por outro lado, 200 famílias foram despejadas para construção de novas vias e houve aumento de 131% no mercado imobiliário no período de cinco anos que cercou os jogos.
Esconderijo como opção
Sejam as Olimpíadas ou a Copa do Mundo, as cidades que recebem o evento promovem verdadeiras operações de "embelezamento". E, segundo afirma Raquel Rolnik "a ideia vigente é que os assentamentos de baixa renda degradam, denigrem a imagem da cidade".
Quando as autoridades encontram resistência, recorrem a outros métodos. Como aconteceu em Atenas, em 2004: para tirar da vista dos visitantes um conjunto habitacional antigo e não muito atraente, foi construído um muro para esconder os prédios.
E na África do Sul, que recebe a Copa em 2010, mais de 20 mil pessoas foram removidas de um bairro pobre, o Joe Slovo, em função de obras para a competição.
Oportunidade ou mais do mesmo
Sobre o processo de transformação do Rio de Janeiro, a relatora acredita que a cidade tem uma grande oportunidade para promover moradia adequada pra todos.
No entanto, Raquel Rolnik – que também já atuou no ministério das Cidades do governo Lula – confessa: "O Brasil pode fazer diferente, mas infelizmente nós vamos fazer mais do mesmo".
Segundo dados divulgados pela Secretaria da Fazenda do Rio de Janeiro, o investimento em infraestrutura e melhorias na cidade deve consumir 11 bilhões de reais.
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Augusto Valente