Inversão de papéis?
19 de janeiro de 2011Até pouco tempo, a estrada do desenvolvimento era de mão única. A vitalidade da economia dos países ricos era fundamental para que a situação nas outras partes do mundo também fosse favorável. Mas hoje o cenário é outro, e a dependência dos países emergentes em relação às nações ricas parece estar chegando ao fim.
Um estudo publicado pelo Centro de Pesquisas do Deutsche Bank chama a atenção para a mudança no panorama: "Com o crescente peso das economias emergentes na economia global, essa grande interação de mão única está se transformando numa maior interação de via dupla."
O documento assinado pelo economista Markus Jaeger se debruça sobre as trocas comerciais entre os dois grupos de países e aponta que os emergentes estão se saindo muito bem sozinhos. Enquanto os mais poderosos ainda engatinham para retomar o crescimento, os países em desenvolvimento ditam o ritmo da economia global.
A máxima de que um pequeno espirro do lado dos ricos era suficiente para provocar um resfriado no lado dos emergentes parece não valer mais. E o estudo sugere: "O desempenho recente das economias emergentes também mostra que talvez seja hora de repensar essa relação".
A corrida
Não é mais novidade o fato de os emergentes estarem crescendo numa velocidade superior à dos países ricos. Segundo estimativas da OCDE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, as riquezas acumuladas pelas nações em desenvolvimento corresponderão a 60% da produção mundial em 2030.
Brasil, Rússia, Índia e China merecem atenção especial. Graças à excelente performance do chamado BRIC nos últimos anos, economias tradicionalmente poderosas conseguiram respirar um pouco mais aliviadas depois da severa crise financeira de 2008.
Para os países que formam o G3, Alemanha, Japão e Estados Unidos, o BRIC está ficando cada vez mais importante. Esse grupo de países emergentes, para onde seguem até 20% das exportações do G3, transformou-se um mercado consumidor vital para as nações ricas.
A questão geográfica
No entanto, a Alemanha é a mais exposta ao humor do BRIC. A receita gerada com as exportações para os emergentes chega a 100 bilhões de dólares, 3% do Produto Interno Bruto (PIB) alemão. No caso do Japão e dos Estados Unidos, essa taxa é de 2,5% e 1% do PIB respectivamente.
Segundo o analista Markus Jaeger, não é difícil enxergar como a geografia tem um impacto na distribuição do comércio e dos investimentos do G3 nos países BRIC. No caso alemão, a dependência de recursos naturais e a produção de alta tecnologia ajudam a criar uma boa relação comercial com a Rússia, por sua vez rica em matéria-prima e dependente de importações de produtos manufaturados, além do interesse do governo russo em modernizar sua economia.
Japão e China se complementam bem, já que os japoneses buscam novos mercados e os chineses precisam de tecnologia – apesar de a relação ainda ser marcada pela rivalidade política.
No caso brasileiro
Os números ainda não foram consolidados, mas o crescimento do Brasil em 2010 foi de pelo menos 7,5%. Ao fim da era Lula, o país disputava com a Índia o segundo posto como economia que mais cresce no G20, atrás da China.
Estados Unidos, China e Argentina são os países que mais importam para o Brasil, com a Alemanha em quarto lugar, segundo dados do Ministério brasileiro de Desenvolvimento.
O último da fila
Os Estados Unidos se beneficiaram pouco da pujança do BRIC. O economista do Deutsche Bank atribui o fato ao "baixo grau de abertura comercial e à pequena reserva destinada a investimentos diretos no exterior em relação ao Produto Interno Bruto." Ou seja, "os Estados Unidos têm que correr atrás", diz o documento publicado esta semana.
A conclusão do estudo pode ser usada também como um conselho: "O papel do BRIC continuará crescendo na economia global, o comércio e os investimentos são os caminhos mais diretos para se tirar vantagem desse cenário".
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer