Merkel vê "profundas divergências" com Erdogan
28 de setembro de 2018As posições conflitantes dos governos da Alemanha e da Turquia em relação a temas como direitos humanos e liberdade de imprensa ficaram claras nesta sexta-feira (29/09), em Berlim, durante uma entrevista conjunta da chanceler federal Angela Merkel e do presidente Recep Tayyip Erdogan.
Ao lado de Merkel, Erdogan exigiu que a Alemanha extradite o jornalista turco Can Dündar, que vive há dois anos no país, e confirmou um pedido de extradição feito dias antes. O líder turco classificou Dündar de agente que revelou segredos de Estado e disse que, por isso, foi condenado a cinco anos e dez meses de prisão pela Justiça turca.
A entrevista esteve próxima de não ocorrer, pois Erdogan ameaçou não participar caso Dündar estivesse presente. Momentos antes do evento, Dündar anunciou que não compareceria para evitar que houvesse um cancelamento e para que "outros jornalistas pudessem fazer perguntas críticas a Erdogan".
Pouco antes do encontro entre os dois líderes foi revelado também que a Turquia enviou à Alemanha uma lista com 69 pessoas que são procuradas pelas autoridades turcas. Entre elas está Dündar, ex-diretor de redação do jornal oposicionista Cumhuriyet e que é procurado por ter publicado uma reportagem sobre o envio secreto de armas da Turquia para rebeldes na Síria.
O presidente turco também pediu a extradição de apoiadores do clérigo Fetullah Gülen que vivem na Alemanha. O movimento é responsabilizado por Erdogan pelo golpe de Estado fracassado de 2016. Merkel disse que as autoridades alemãs ainda necessitam de mais informações para decidir se incluem o movimento de Gülen na lista de organizações proibidas no país.
A líder alemã, por sua vez, exigiu uma solução rápida para os casos dos cidadãos alemães que estão detidos na Turquia, muitos deles sob acusação de pertencerem a organizações terroristas. Ela disse estar satisfeita por alguns casos terem sido solucionados e que vai continuar se empenhando pela libertação dos demais.
Segundo o Ministério alemão do Exterior, há cinco alemães detidos por motivações políticas na Turquia, sob vagas acusações de pertenceram a organizações terroristas.
Merkel disse haver profundas diferenças entre os dois governos, mas destacou que também há interesses comuns, incluindo a parceria no âmbito da Otan, questões migratórias e o combate ao terrorismo. Ela disse que uma reunião de cúpula sobre a Síria está sendo preparada e deve incluir, além de ela e Erdogan, os presidentes da França e da Rússia.
A entrevista na Chancelaria Federal também foi marcada pelo protesto de um jornalista turco-alemão de Hamburgo, que acabou sendo retirado do local por vestir uma camiseta com uma inscrição pedindo liberdade para jornalistas.
O jornal pró-Ancara Yeni Asir informou nesta sexta-feira que o governo turco pediu a extradição de Dündar pouco antes da visita de Erdogan, junto com uma "lista de terroristas" com 69 nomes de pessoas procuradas por autoridades turcas. A imprensa alemã confirmou a informação e acrescentou que o pedido chegou ao Ministério do Exterior da Alemanha na segunda-feira.
Em março, a Suprema Corte de Ancara anulou um veredicto contra Dündar e decidiu que o processo dele deveria ser ampliado para cobrir o crime de espionagem. Em abril, um tribunal de Istambul emitiu um mandado de prisão contra Dündar e pediu ao Ministério da Justiça que solicitasse uma busca internacional à Interpol.
Em julho, a solicitação foi enviada, mas negada pela Interpol por suspeita de perseguição política. Dündar é procurado por espionagem, traição de segredos de Estado e propaganda. Sua esposa vive na Turquia e está proibida de deixar o país.
Horas antes do encontro com Merkel, Erdogan foi recebido com honras militares pelo presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier. O presidente alemão abordou casos concretos de presos políticos na Turquia, tanto alemães como turcos. Liberdade de imprensa e de expressão, assim como questões do Estado de Direito, estavam no centro da conversa de cerca de 75 minutos.
Pouco antes da visita de Erdogan, Steinmeier disse que a recepção ao presidente turco não expressava nenhuma normalização nas relações entre Alemanha e Turquia, mas "poderia ser um começo".
A visita de Erdogan, que começou na quinta-feira e termina neste sábado, com a abertura oficial de uma mesquita em Colônia, provocou inúmeros protestos contra a detenção de jornalistas e críticos do governo turco, que tem ocorrido desde o golpe fracassado de 2016.
Os organizadores de um grande protesto na praça Potsdam, em Berlim, que será realizado nesta sexta-feira sob o lema "Erdogan não é bem-vindo", esperam a participação de cerca de 10 mil pessoas.
PV/AS/ard/dpa/afp
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