Mesmo com Copa, turismo no Brasil não decola
16 de outubro de 2014Um país de diversidade continental, com mais de 7 mil quilômetros de costa, flora e fauna únicas, culinária e paisagens que arrancam suspiros de visitantes. Mesmo assim, o Brasil, por uma série de fatores, continua com dificuldades de fazer o turismo decolar de vez.
A escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos serviu para projetar a imagem do país no exterior. Mas os números mostram que o turismo brasileiro ainda caminha a passos lentos.
Segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), o Brasil foi o 49º do mundo em 2013 em número de visitas de estrangeiros. O crescimento de 2012 para o ano passado foi de 2,4%, abaixo da média mundial (4,8%) e da sul-americana (2,7%).
Na comparação com vizinhos, o Brasil está na frente, mas muito aquém de seu potencial. Foram cerca de 6 milhões de turistas, número não muito superior ao da Argentina, por exemplo, que foi de 5,5 milhões. O Chile, terceiro na América do Sul, teve mais de 3,5 milhões de visitas estrangeiras.
"Pelo tamanho, o Brasil deveria receber muito mais turistas em comparação com Argentina e Chile", diz Leonel Rossi, diretor de relações internacionais da Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav Nacional). "Mas temos algumas barreiras, como o preço e a falta de promoção do Brasil no exterior. Existe pouca verba do Ministério do Turismo para isso."
A verba do Ministério do Turismo caiu 37% desde 2011. Naquele ano, foi de 188,4 milhões de reais, e em 2014 está em 117,3 milhões. Houve um complemento de cerca 30 milhões por parte de outros órgãos do governo, mas, segundo especialistas, há ainda problemas que vão além da questão orçamentária.
Entre os fatores estão a distância em relação aos grandes polos emissores, como Europa e América do Norte; grande carga tributária, que eleva preço de hotéis e restaurantes; falta de investimento em publicidade sobre o país no exterior; a necessidade de visto para algumas nacionalidades; e a valorização do real.
Câmbio valorizado
Enquanto um real valorizado facilita a viagem de brasileiros para o exterior, os turistas estrangeiros pagam mais caro para fazer a conversão de suas moedas. De acordo com a Abav Nacional, o número de viagens internacionais de brasileiros aumentou 20% durante a Copa em relação ao mesmo período de férias de 2013.
Para Marco Ferraz, presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa), um câmbio valorizado demais é ruim para o turismo receptivo, pois o país fica pouco competitivo. Ele destaca, também, que o Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, e isso impacta no preço final de hotéis, restaurantes e outros serviços.
"Além disso, nossos vizinhos não têm tanta capacidade de enviar turistas ao Brasil, como ocorre no turismo entre países europeus", explica Marco. "A Argentina, que é o maior emissor, manda 1,7 milhão de pessoas, sendo que muitos deles são turistas de negócios e que vêm mais de uma vez para o país."
Por conta da crise econômica no vizinho, os próximos estudos deverão detectar a diminuição do envio de turistas argentinos para o Brasil. Alguns dos motivos - e não só para os argentinos, que têm uma moeda mais desvalorizada - são os preços de uma viagem ao Brasil e o custo de vida no país.
Como exemplo, um pacote de quatro dias, com hotel e voo para o Rio de Janeiro custa 1,5 mil euros (cerca de 4,5 mil reais) numa agência alemã. Em contrapartida, o mesmo pacote para Pukhet, na Tailândia, custa a metade: cerca de 700 euros. Em voo direto, os dois destinos levam cerca de 11 horas a partir de Frankfurt.
Para Gianfranco Beting "Panda", diretor de comunicação da Azul Linhas Aéreas e especialista em aviação, o Brasil goza de uma excelente imagem no exterior, mas o turista, antes de mais nada, é muito pragmático e faz a conta. Se eles chegam à conclusão de que a Tailândia é mais barato do que o Brasil, vão para a Ásia, e não para a América do Sul.
"O Brasil tem que desonerar o setor, e muito desse ônus poderia ser resolvido por meio de uma simples 'canetada' do presidente para diminuir os impostos que afligem as empresas aéreas, hotéis e toda a cadeia de turismo", diz Beting. "Se fizessem isso, poderíamos recuperar o volume de turistas que estamos deixando de receber."
Reciprocidade quanto ao visto
Um dos problemas citados pelos analistas é a obrigatoriedade de visto para alguns dos maiores emissores de viajantes, como os EUA. Segundo dados do Ministério do Turismo, o país é o segundo que mais envia turistas para o Brasil – em 2013 foram quase 600 mil, cerca de 10% do total.
Mesmo com a necessidade de visto, os EUA foram o país que mais compraram ingressos para a Copa do Mundo de 2014 – quase 200 mil ingressos – e perderam somente para os brasileiros, que compraram cerca de 1,4 milhão. Outra nação que comprou muitas entradas foi a Austrália (cerca de 52 mil) – que também precisa de visto.
De acordo com um estudo da OMT, a necessidade de visto continua a afetar de forma significativa o turismo global. Em 2012, cerca de 63% da população mundial precisava de visto antes de iniciar sua viagem.
Para viajar para um país emergente, 61% da população mundial necessitam de visto. Já para países desenvolvidos, 73% precisam pedir com antecedência a autorização.
"É difícil abrir os céus para quem quer visitar o Brasil. Felizmente ou infelizmente, o país exige a reciprocidade, em que se a outra nação exige visto, o Brasil também faz o mesmo", diz Ferraz, da Braztoa. "Mas isso deveria ser flexibilizado. Se na Copa fosse assim, teríamos tido mais visitantes se não exigíssemos visto para americanos e canadenses."
O repórter viajou a convite da ABAV Nacional para participar da 42ª ABAV – Expo Internacional do Turismo, em São Paulo.