Mia: chega de política
11 de agosto de 2006Em julho, foi a Copa do Mundo, quando a música pop na Alemanha ficou praticamente restrita às canções do evento e a outras de teor futebolístico. Em agosto, foi o festival de Bayreuth que roubou a cena. Mas aos poucos a coisa começa a voltar ao normal.
É até compreensível que muitos artistas prefiram esperar o rebuliço passar para lançar seus álbuns. Isso explicaria ao menos a quantidade. Para que ninguém se sinta sobrecarregado, a DW Antena preferiu resenhá-los em doses homeopáticas...
Primeiro, algumas novidades.
Deichkind lançará vídeos de fãs
A banda de electro-hiphop Deichkind havia pedido aos fãs que enviassem sugestões para o videoclipe da música “RemmiDemmi”. Agora, os rapazes de Hamburgo mandaram avisar que os cinco melhores (de aproximadamente cinqüenta!) já foram escolhidos e serão lançados com o próximo single em setembro.
Quem por algum motivo não encontrar o single – o que no Brasil será bem provável –, pode ver os vídeos no site que a banda criou só pra isso: www.remmidemmi.com. O vencedor – um berlinense – vai ganhar um prêmio genial: a banda prometeu tocar ao vivo em sua próxima festa.
Os primeiros anos de Robbie
Provavelmente ninguém um dia sonhou que Robbie Williams chegaria tão longe, a não ser ele mesmo. Nem mesmo seus companheiros do Take That devem ter apostado no sucesso do colega. Mas hoje a fama de Robbie é indiscutível, assim como sua presença nas paradas de sucesso.
Para lembrar desses dias em que o futuro não era tão certo assim, a The Berlin Rock Photo Gallery inaugurou a exposição “Robbie Williams – os primeiros anos”, baseada em tomadas de Fryderyk Gabowicz, fotógrafo da revista Bravo. Gabowicz, que fotografa Robbie desde 1993, retrata a transformação de Robert Peter Maximilian Williams em estrela internacional. Quem gostar e estiver na cidade, não perca. Até 24/07/2006.
Que Bela B.!
Não que isso tenha algo a ver com a onda de calor na Alemanha, mas duas personalidades da música pop alemã gravaram um videoclipe sensacional onde contracenam nus em um clube de swing.
Bela B. – na verdade baterista da banda Die Ärtzte (Os Médicos), que tem uma trajetória semelhante aos Titãs no Brasil – lançou em maio seu primeiro álbum solo, Bingo, e convidou a apresentadora de tevê Charlote Roche para gravar a faixa “1,2,3...”. Os dois são amigos de longa data.
Esta coluna recomenda o disco e o vídeo e se pergunta por que raios Bela B. ficou tanto tempo atrás da bateria já que...compõe tão bem!
Leia mais na próxima página sobre a banda berlinense Mia, as acusações de nacionalismo que os músicos sofreram e como esqueceram disso tudo em seu novo disco.
É difícil falar de Mia na Alemanha. Mas mais difícil ainda é gostar de Mia, ou pior ainda: assumir que se gosta de Mia. Quando o quinteto se formou, em meados de 1997, seus integrantes ainda estavam na escola e nada ou pouco podiam prever das acusações de nacionalismo e irresponsabilidade histórica que sofreriam mais tarde.
Pouco após criarem a banda, Mieze (voz), Andi (guitarra), Ingo (guitarra), Bob (baixo) e Gunnar (bateria) conheceram os responsáveis pelo selo R.O.T., junto a quem desenvolveram um plano de execução para aquele que seria a partir de agora seu principal produto: o Mia.
O primeiro single “Sugar My Skin”, distribuído pela major BMG em 1999, pouco contribuiu para o sucesso da banda. E o contrato com a BMG também foi pras cucuias por diferenças de opinião entre banda e gravadora. Mas não demorou para que a Sony estendesse seus longos braços para aparar a banda.
Foi com o segundo single, “Factory City”, de 2001, que muitos ouviram falar da banda pela primeira vez. Ao menos em pequenos círculos e graças a um remix do produtor da banda, Noah, que chegou até as pistas de dança.
O singelo sucesso fez com que revistas de música e a MTV alemã passassem a vender a banda como os representantes de uma nova geração electropunk que (segundo eles) despontava na capital.
O fantasma da Neue Deutsche Welle
A banda apostou nisso e, em 2002, quando foi lançado o primeiro álbum, Hieb- und Stichfest, os cinco já estavam completamente adaptados à nova imagem, com figurinos, penteados e atitudes obviamente influenciados pelo fantasma da Neue Deutsche Welle.
Foi o suficiente para os gostos se dividiram: era amar ou largar. E mesmo que a maioria tenha decidido odiar, ou pelo menos dizer que odiava, Mia era a banda do momento. A tal imagem bastou para que muitos odiassem a banda sem nunca ter escutado. Segundo o conservador Die Zeit, “engenheiros de imagem não poderiam criar uma banda mais neo-Berlim que Mia: barulhenta, histérica e inofensiva”.
Um golpe por trás
Mas o "inofensivo" saiu pela culatra. A letra de “Was es ist”, primeiro single do segundo álbum Stille Post (nome alemão para a velha brincadeira de telefone sem fio), de 2004, fez muita gente mudar de opinião.
A deixa para a composição foi a oposição veemente do ex-chanceler federal Gerhard Schröder à guerra no Iraque, que teria contribuído para alterar positivamente a imagem da Alemanha no exterior. Questiona-se se intencionalmente, mas Mia acabara de lançar um debate sobre uma nova identidade alemã e uma nova relação com a pátria e símbolos nacionais.
No clipe, a banda se vestiu de preto, amarelo e vermelho, cantando coisas como “Quando me perguntam de onde venho, não tenho mais pena de mim mesma/Eu arrisco algo pelo amor/Eu me sinto pronta”. O debate não demorou para estourar. E se muitos situavam a banda no espectro político de esquerda, a maioria passou a condená-la por um nacionalismo que julgavam estar fora de lugar.
A banda se defendeu dizendo que via a Alemanha não como nação, mas como a união de todos que de alguma forma se sentiam ligados ao país e que por isso haviam aprendido a elogiar o país onde vivem e a reivindicar o protesto construtivo como única forma possível de protesto.
Mas o episódio deixou um gosto amargo. Inúmeros sites de boicote à banda surgiram na internet, seus integrantes foram atingidos por ovos e tomates no palco e até shows foram cancelados.
Desde então, muitos pensam duas vezes antes de admitir que gostam do som do Mia. Principalmente porque o golpe veio por trás, tendo surgido dentro do espectro político da esquerda e pego muitos desprevenidos. De uma hora para outra, a revolta, a histeria e o visual agressivo deram lugar a um nacionalismo reacionário.
Bola pra frente
Isso foi em 2004. Dois anos se passaram e a banda agora volta com o terceiro álbum, Zirkus. Como disse o Spiegel Online: “nada de política, por favor”. Se foi essa mesmo a receita do quinteto, ela deu resultado: o disco entrou na parada alemã logo na segunda posição, provando que o público não guarda rancores.
Mas mostrou também que a banda veio para ficar e está disposta a se desenvolver tanto esteticamente, quanto musicalmente: as novas canções são mais maduras e ousadas, menos presas a modelos pré-fabricados. Mesmo que desta vez a maioria delas se restrinja a falar de amor.