Crise no Egito
1 de fevereiro de 2011Através de faixas e alto-falantes, os manifestantes reunidos na praça Tahrir, no centro da capital egípcia nesta terça-feira (01/02), voltaram a exigir a renúncia do presidente Hosni Mubarak.
No oitavo dia de protestos, a oposição pretendia reunir 1 milhão de pessoas para forçar Mubarak a renunciar. Segundo a emissora árabe Al Jazeera, essa meta fora atingida já ao meio-dia (hora local). Através da emissora de TV Arabiya, o líder do movimento de oposição, o Prêmio Nobel da Paz Mohamed El Baradei, deu a Mubarak um ultimato para renunciar até sexta-feira.
Em comunicado, outras 50 organizações de direitos humanos também exigiram a renúncia. "O presidente Mubarak deve respeitar o desejo do povo egípcio e renunciar, para evitar um derramamento de sangue". Elas também exigiram uma nova Constituição e novas eleições presidenciais.
No Cairo, as forças de segurança marcaram presença, mas não impediram o protesto. Em alguns momentos, o clima foi de tensão. Os militares retiraram agitadores e possíveis criminosos de circulação. Segundo a TV estatal egípcia, provocadores tentaram incitar discussões entre soldados e manifestantes.
Ao mesmo tempo em que distribuíam panfletos aos participantes dos protestos com os dizeres "vocês têm o direito de expressar sua opinião de maneira civilizada", os soldados advertiam para eventuais criminosos que poderiam estar entre os manifestantes, cujo objetivo seria semear pânico, roubar e fazer sabotagens. Neste caso, os militares prometeram agir com rigor. As pessoas que chegavam ao local dos protestos eram revistadas e seus documentos controlados.
Brigadas civis
Na segurança das ruas, os soldados substituíram os policiais, que caíram em descrédito devido à violência contra os manifestantes. Como os militares não conseguem garantir sozinhos a segurança, a ordem é mantida com a ajuda da própria população.
Nos cruzamentos, brigadas de civis ergueram espontaneamente postos de controle, para proteger lojas e residências de saqueadores. Armados de revólveres, facas e barras de ferro, os civis também controlam veículos à noite.
Mais de 70 postos de controle foram montados entre o aeroporto e o centro da capital egípcia. Frustrados com a situação econômica e a repressão, membros da classe média foram os primeiros a ir às ruas. Mas há muito que não são os únicos, também os islâmicos aderiram ao movimento.
Nos protestos desta terça-feira, chamou atenção a presença de um número maior de representantes da organização islâmica Irmandade Muçulmana. Apesar de estar proibida no Egito, a organização tem muitos membros e se dispõe a fazer parte de um novo governo.
Militares e Irmandade Muçulmana
Tanto os militares quanto a Irmandade Muçulmana exercerão um importante papel na era pós-Mubarak. Sem os primeiros, não se pode pensar em política no Egito. A Irmandade Muçulmana, por sua vez, é o movimento islâmico mais antigo no mundo árabe.
Apesar de reconhecer a legitimidade das exigências dos manifestantes e de ter agido ser usar violência, o Exército se encontra num dilema. Por um lado, é a garantia de estabilidade do regime e o seu maior beneficiado. Desde a queda da monarquia, em 1952, todos os presidentes do país vêm do Exército.
No entanto, caso as Forças Armadas continuem no poder, novos protestos já estão programados. Um derramamento de sangue iria abalar sua imagem, já que jamais se voltou contra a população.
Já a participação da Irmandade Muçulmana no poder no Cairo iria desagradar a norte-americanos, europeus e, sobretudo, a israelenses. Nas eleições parlamentares há seis anos, membros da organização conquistaram 88 mandatos.
Apesar de décadas de repressão por parte de Mubarak, que se apresentava ao Ocidente como baluarte contra os islâmicos, a Irmandade Muçulmana forma o movimento de oposição mais bem organizado do Egito. No caso de eleições livres, analistas acreditam que sairiam como a maior força, com 30 a 35% dos votos.
"Mubarak passou, mas o jogo está aberto"
Desde os anos 1950, a Irmandade Muçulmana jurou rejeição à violência, mas continua invariavelmente antiamericana e anti-israelense. No entanto, não se acredita que o Egito se transforme em uma nova república islâmica como o Irã.
Os líderes da Irmandade Muçulmana não são teólogos, possuindo outra formação superior. A maioria de seus membros vêm da classe média. Ao contrário do Irã, o Egito sob Mubarak foi um país relativamente liberal, que atraiu anualmente 12 milhões de turistas e muitos investidores estrangeiros.
Para cientistas políticos, a saída de Mubarak é certa. O especialista em África do Norte, Thomas Hasel, é da opinião de que "as lideranças do Exército o [Mubarak] convencerão a se exilar". Já a professora da Universidade Livre de Berlim, Cilja Harders, acha que "Mubarak passou, mas o jogo não está definido".
CA/dpa/afp/rtr
Revisão: Roselaine Wandscheer