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Misticismo baiano em solo alemão

Marion Andrea Strüssmann28 de janeiro de 2003

Depois de passar pelas cidades de Stuttgart e Berlim, a exposição itinerante “Bahia de todos os Santos” chega a Bonn. A mostra apresenta o trabalho de quatro artistas que fazem uma abordagem sobre o candomblé baiano.

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A foto de Pierre Verger revela os elementos da cultura africana no candombléFoto: ifa-Galerie Bonn

"O candomblé é bem mais do que uma religião", afirmou a alemã Karin Stempel, curadora da exposição Bahia de Todos os Santos, Schwarze Götter, weisse Heilige, promovida pelo Ifa, Institut für Auslandsbeziehungen. Graças à sua complexidade, o candomblé permite uma abordagem diversificada sobre o tema, baseada na experiência pessoal de cada um.

Reunir interpretações artísticas diferentes sobre o candomblé baiano, explicou Stempel, é a proposta básica desta mostra que exibe o trabalho de quatro artistas: os brasileiros Marepe, Eriel Araújo e Mario Cravo Neto e também o francês Pierre Verger (1902-1996), que adotou Salvador da Bahia como sua segunda pátria.

As fotografias em preto e branco do viajante e etnólogo francês, cedidas pela Fundação Pierre Verger, retratam o paralelo ainda existente entre os rituais do candomblé e a cultura africana. Para realizar tal estudo, o artista documentou diversos momentos da cerimônia baiana de culto aos deuses e orixás.

Depois, partiu para a África em busca das raízes trazidas há séculos pelos escravos. O resultado é impressionante. Verger prova que o candomblé continua baseado em elementos ainda hoje cultuados em certas regiões da África.

Uma outra perspectiva

Bahia-Ausstellung ifa-Galerie Bonn
Obra de MarepeFoto: ifa-Galerie Bonn

Marepe, por sua vez, apresenta a irreverência da arte contemporânea com o projeto Axé, que contou com a participação popular. O artista baiano deu início à sua obra com a recuperação de duas máquinas velhas de fazer algodão doce. Com a ajuda de crianças, Marepe produziu centenas de saquinhos coloridos de algodão doce que, posteriormente, foram afixados em uma palmeira localizada em praça pública e distribuídos à comunidade local.

Uma leitura completamente inusitada do candomblé, que também propõe a participação coletiva em prol de um mesmo objetivo. A documentação deste trabalho está sendo exibida ao público alemão através de fotos e um vídeo produzido por Marcondes Dourado.

Cores, som e imagem

O renomado artista Mário Cravo Neto, que possui o mérito de ter fotografias no acervo do Museu de Arte de Nova York, participa da exposição Bahia de Todos os Santos com uma instalação sonora e de grande impacto visual intitulada Laróyè, saudação de Exu no candomblé.

A série de diapositivos, projetada com o barulho indefinido do cotidiano, busca os rastros de Exu pelas ruas da Bahia através das cores, da música, da dança, das flores e de outros tantos elementos típicos.

Velas, eu e você

Bahia-Ausstellung ifa-Galerie Bonn
A busca dá imagem, de Eriel AraújoFoto: ifa-Galerie Bonn

Eriel Araújo foi o único artista presente à vernissage em Bonn. Sua instalação, A busca dá imagem, elaborada com o uso de velas, parafina, espelhos e mesas, depende da interação do público. "Eu defino minha obra como uma obra poética sobre a materialidade", revelou o baiano que está sendo apontado como a nova revelação da arte contemporânea brasileira.

Quando as velas que estão sob as mesas são acessas, a parafina que está no tampo derrete deixando transparecer o espelho que, por sua vez, reflete as imagens do ambiente.

"A obra é viva e sua memória está presente nas transformações dos elementos existentes bem como nos rastros deixados, seja em fragmentos das velas restantes, seja na mudança de coloração da parafina", disse Araújo, que observou ser menor a presença da religiosidade nos alemães do que nos brasileiros e, por isso, a leitura de sua obra na Alemanha adquire outro interesse. Ela é vista mais como arte em si do que um simbolismo espiritual.

Expondo pela primeira vez no exterior, Ariel Araújo garantiu que a experiência é gratificante. "Para mim foi bastante significativo pois é importante para o artista poder vislumbrar outros países e outras populações que possam dialogar de forma diferente com a obra. No caso, conhecer mais os alemães quebrou alguns tabus e algumas informações negativas. Se fosse possível, moraria algum tempo na Alemanha. Expor aqui é também uma oportunidade de mostrar que não somos só índios andando nus pelas florestas. O Brasil tem muita informação e é também arte contemporânea".

A exposição Bahia de Todos os Santos pode ser vista na Ifa-Galerie, em Bonn, até o dia 30 de março de 2003.