Mulheres dominam a mostra competitiva do festival de cinema
14 de fevereiro de 2013O imaginário cinematográfico é povoado por lindas e glamourosas mulheres. Marilyn Monroe e sua saia esvoaçante nas ruas de Nova York, Anita Ekberg e seu banho na Fontana di Trevi, em Roma. Porém, longe da sensualidade, o cinema ainda pode ser um lugar difícil para as mulheres. As diretoras ainda são minoria, e muitas atrizes têm dificuldade em achar papéis em que suas curvas não sejam mais importantes que suas palavras.
Neste ano, mesmo antes de saber quem vai levar para casa os principais prêmios da Berlinale, já se pode perceber que as mulheres são presença forte no Festival de Cinema de Berlim, com três diretoras concorrendo ao Urso de Ouro e grandes filmes centrados em grandes mulheres.
A única a ganhar o prêmio de melhor diretora no festival até hoje foi a dinamarquesa Astrid Henning-Jensen, por Vinterbørn, em 1979. O Urso de Ouro foi ainda entregue a três filmes dirigidos por mulheres: Adoção (1975), Ascenção (1977) e A Teta Assustada (2009).
Atrás das câmeras
A diretora polonesa Małgośka Szumowska pode ser considerada uma veterana na Berlinale, tendo em vista que dois de seus filmes já participaram da Mostra Panorama. Em sua estreia na competição, a cineasta aborda um universo masculino e controverso: o homossexualismo dentro da Igreja Católica.
No filme In The Name Of, Andrzej Chyra vive Adam, um padre que descobriu tardiamente sua vocação e hoje vive em um reformatório para jovens deliquentes em uma pequena vila na Polônia. O padre entrou para a igreja em sua luta contra a própria orientação sexual. Quando ele conhece o jovem Lukasz, a tentação se torna algo difícil de suportar.
Com uma direção segura e boas atuações, Szumowska cria um retrato sensível e forte do dilema de um homem, mas que reflete as consequências da fé na católica Polônia. Outro ponto positivo de In The Name Of é traçar uma linha bem clara, diferenciando pedofilia de homossexualidade.
Layla Fourie, de Pia Marais, é um suspense marcado pelo jogo entre a verdade e a mentira. Layla é uma mãe solteira sul-africana que trabalha como garçonete. Em busca de uma vida melhor, ela se torna uma poligrafista, pessoa que opera o detector de mentiras.
Em seu primeiro trabalho, ela tem que viajar para um resort e leva seu pequeno filho Kane. A viagem de carro à noite é tensa, e Layla acaba atropelando um homem branco. Com uma abordagem ambiciosa, tanto cinematográfica como intelectualmente, o filme tem como pano de fundo os conflitos raciais que até hoje marcam a África do Sul.
Forte Presença
O único filme latino-americano na competição é também um dos favoritos da crítica internacional. Glória, de Sebastián Lelio, acompanha a vida da personagem homônima em sua rotina em Santiago. Separada, bem sucedida e com dois filhos adultos, Glória lida com os problemas e os infortúnios de uma mulher de meia idade em busca de sexo e de companheirismo. O diretor mergulha com graça e inteligência na jornada da personagem, que ganha vida na primorosa interpretação de Paulina Garcia.
Uma forte concorrente para Garcia na disputa do prêmio de melhor atriz é Luminiţa Gheorghiu, presença central em Child's Pose. O filme do romeno Călin Peter Netzer é um drama psicológico e urgente sobre a relação patológica entre mãe e filho, mas em suas entrelinhas fala da situação atual da Romênia. Gheorghiu vive Cornelia, uma possessiva mãe que, depois de um acidente em que seu filho mata um menino, usa de todos os meios para fazer o jovem se livrar da cadeia.
O amor entre duas ex-presidiárias que tentam reconstruir sua vida é a premissa do estranho e visualmente intenso Vic+Flo Saw a Bear, do diretor franco-canadense Denis Côté. Já a adolescente Melanie é a alma de Paradies: Hoffnung. Sua carismática personagem trouxe doçura e esperança para o forte e pessimista cinema feito por Ulrich Seidl.
Grandes damas do cinema francês
A forte presença francesa na competição trouxe a Berlim as três maiores atrizes do cinema francês da atualidade. Camille Claudel 1915, de Bruno Dumont, mostra a artista em um hospício onde ela passou as últimas décadas de sua vida. Dumont é conhecido por um cinema hermético e difícil, com planos longos, poucos diálogos e imagens fortes. Camille Claudel 1915 é marcado por prolíferos e fortes diálogos, baseados na correspondência da artista com seu irmão, um religioso fervoroso – outro tema comum na filmografia do francês. A artista ganha vida na conturbada e brilhante atuação de Juliette Binoche, lutando com sua criatividade entre a sanidade e a loucura.
Loucura e clausura também são os cenário de La Religieuse, de Guillaume Nicloux. O filme se passa na França do século 18 e conta a história da jovem Suzanne, que é mandada para um convento. Sem vocação para ser freira, a jovem acaba sendo obrigada a fazer seus votos ao descobrir que é filha ilegítima. Ao tentar voltar atrás, a jovem freira acaba se tornando vítima da sádica e cruel madre superiora. A atuação de Pauline Etienne como Suzanne é o ponto alto do filme. Isabelle Huppert também está na produção em um pequeno, porém marcante papel.
As mulheres voltam ao centro dos holofotes nesta sexta-feira (15/02), último dia da competição em Berlim. Catherine Deneuve é a protagonista de Elle S'en Va da diretora francesa Emmanuelle Bercot. Já Nobody's Daughter Haewon, drama do sul-coreano Hong Sangsoo é centrado em uma estudante de cinema que se apaixona por um professor.
Nenhum filme ainda despontou como o grande favorito da Berlinale deste ano, mas o júri presidido por Wong Kar Wai terá trabalho para decidir qual dessas grandes atrizes vai levar para casa o Urso de Prata.
Autor: Marco Sanchez
Revisão: Francis França