1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Mundo caminha para era de perigo, alerta Sipri

Ralf Bosen
23 de maio de 2022

Relatório do instituto sueco de pesquisa da paz traça quadro inquietante, mostrando como crises de segurança e ambientais se reforçam mutuamente. Ação preventiva e coragem para reformas são imprescindíveis.

https://p.dw.com/p/4BkOo
Tanque de guerra alemão
Conflitos armados dobraram em 2021 e 2020, apontam pesquisadoresFoto: Philipp Schulze/dpa/picture alliance

A humanidade se encontra numa "situação de emergência planetária": crises ambientais e de segurança se potencializam mutuamente, de modo perigoso. Desmatamento, derretimento de geleiras e poluição oceânica por plástico ocorrem simultaneamente ao aumento das mortes em conflitos, de gastos armamentistas e do número de seres humanos em risco de passar fome. A pandemia desencadeada pelo vírus Sars-Cov-2 gerou novos perigos.

Um exemplo é a Somália, país do Leste da África em que seca persistente, associada a pobreza, falta de assistência e um governo fraco, precipitaram a população nos braços do grupo extremista islâmico Al-Shabab. Também a América Central sofre: safras perdidas devido às mudanças climáticas, aliadas a violência e corrupção, provocaram êxodo em direção aos Estados Unidos. 

Falta um plano transnacional, o mundo "vai tropeçando" para uma nova e complexa situação de perigo.

Em sua análise Meio ambiente da paz: Segurança numa nova era de risco, a organização de pesquisa da paz Stockholm International Peace Research Institute (Sipri) traça um quadro da situação mundial perante crises cada vez mais complexas e imprevisíveis. De início inquietante ao extremo, o estudo conclui acenando com esperanças.

"Natureza e paz estão tão estreitamente ligadas, que os danos a uma prejudicam a outra, enquanto o fomento a uma fortalece a outra. É preciso agir, e a hora é agora", observou à DW Dan Smith, diretor do instituto sueco reconhecido mundialmente por seus relatórios anuais sobre exportações internacionais de armamentos.

Mais riqueza, mais insegurança

O Sipri divulgou seu novo estudo nesta segunda-feira (23/05), pouco antes da abertura no 9º Fórum de Estocolmo sobre Paz e Desenvolvimento como um toque de despertar para os políticos e outros tomadores de decisões. Pois alguns governos não reconheceram a gravidade da crise, olham para ou outro lado ou até mesmo acirraram a insegurança, aponta o instituto.

"Outros chefes de Estado e governo, por sua vez, gostariam de agir, mas têm outras prioridades que exigem urgentemente tempo e atenção, como a pandemia de covid-19 dos últimos dois anos, ou, atualmente, a guerra na Ucrânia", diz Smith.

Em suas 93 páginas, o estudo descreve as consequências globais que ocorrências regionais podem ter num mundo interconectado, quando catástrofes meteorológicas causadas pelas mudanças climáticas e pela pandemia de covid-19 ameaçam as cadeias de abastecimento mundiais.

Violência e destruição de safras tornam a vida insuportável para muitos agricultores, contribuindo para grandes ondas migratórias. Além disso, os conflitos armados entre nações dobraram em número entre 2010 e 2020, sendo atualmente 56.

Também dobrou o contingente de refugiados e desterrados, até 82,4 milhões. Além disso, em 2020 houve um incremento das ogivas nucleares, após anos de redução; e no ano seguinte pela primeira vez os gastos militares globais ultrapassaram a marca dos 2 trilhões de dólares.

Os principais atingidos, são "frequentemente países que já sofrem pela pobreza e má governança", advertem os 30 autores do instituto de pesquisa da paz e de outras instituições, acrescentando que "a sociedade humana pode estar mais rica do que antes, porém é inegavelmente mais insegura".

Memino anda por leito cimentado de cheio de dejetos de rio no Iraque
Falta de água e alimentos são efeitos e causas de conflitosFoto: Getty Images/AFP/H.M. Ali

Falta de prevenção agrava riscos

A análise também esboça uma situação ambiental catastrófica, com um terço das espécies vegetais e animais ameaçadas de extinção. A qualidade do solo decai, "enquanto a exploração de recursos naturais, como florestas e peixes, se mantém num nível insustentável", e a mudança climática global gera extremos meteorológicos cada vez mais frequentes e intensos.

Para a comissária da União Europeia do Meio Ambiente, Margot Wallström, a pandemia de covid-19 demonstrou "que risco corremos, se não nos prepararmos". Os governos "devem avaliar os riscos à frente, desenvolver a capacidade de lidar com eles e tornar mais resistentes as sociedades", apela a ex-ministra do Exterior da Suécia, que integra o grêmio internacional de especialistas que assessora a iniciativa "Meio ambiente da paz" do Sipri.

A Coreia do Sul deu um exemplo de como agir de forma preventiva, frisam os pesquisadores da paz: empregando as lições do surto do vírus Sars em 2002, ela conseguiu restringir sua taxa de mortalidade pela covid-19 a 10% da de outros Estados de população equivalente, evitando assim grande parte das sequelas econômicas e sociais sentidas em outros países "que não haviam se preparado devidamente para a pandemia".

Alemanha na vanguarda da guinada energética

Os autores do Sipri também indicam possíveis saídas para a crise global, como diretrizes para os tomadores de decisões políticas. Assim, são necessárias visões de longo prazo, mas também ações imediatas, a fim de enfrentar as ameaças comuns. E em todos os processos decisórios, desde os comunais até as Nações Unidas, deve-se sempre integrar os indivíduos mais atingidos.

Os chefes de Estado e governo precisam agir, até mesmo em interesse próprio: "Eles sabem que a destruição ambiental gera mais insegurança. Como necessitam segurança, precisão combater a destruição, e só podem fazer isso conjuntamente." Um exemplo positivo seria a declaração conjunta da China e EUA para cooperação na proteção climática, feita durante a Conferência do Clima da ONU (COP 26), em novembro último.

Dan Smith confere à Alemanha, enquanto grande potência econômica, um papel político importante na configuração das reformas necessárias. O país foi primeiro "que manifestou no Conselho de Segurança da ONU a conexão entre as mudanças climáticas e os riscos à segurança". Agora, ele pode liderar uma guinada energética "que se liberte não só dos combustíveis fósseis de origem russa, mas desses combustíveis em geral".