Munido de poderes especiais, Maduro quer tirar Venezuela da crise
20 de novembro de 2013Até mesmo o inventor do modelo começa a ficar cético. O cientista político alemão Heinz Dieterich criou o "socialismo do século 21" como a fórmula política para o líder venezuelano Hugo Chávez.
Hoje quem está no poder em Caracas é o herdeiro de Chávez, Nicolás Maduro. E o país sul-americano está mais atolado na crise do que nunca. Se continuar assim, Dieterich vê duas opções. "Ou os militares vão governar a partir de 2014 ou haverá eleições antecipadas, em que o movimento bolivariano perderá", analisa. E esse pode ser o fim do "socialismo do século 21".
A população vem sofrendo cada vez mais com esse experimento. No país, há falta de quase tudo que caracteriza a vida cotidiana, de alimentos básicos a papel higiênico. A inflação chegou a 54%. O bolívar, a moeda nacional, está enfraquecida, o mercado de câmbio paralelo floresce.
A indústria do petróleo, que tem de financiar 60% do orçamento do Estado, está sucateada e é ineficaz: após dez anos de controles de preços e uma política econômica que sufoca na raiz qualquer forma de produção privada, a Venezuela ameaça mergulhar no caos.
Maduro não é o único responsável por tudo isso. Mas, em contraste com o seu carismático antecessor, Chávez, não consegue dar conta do cargo que ocupa. Já nas primeiras semanas de sua gestão, promoveu situações embaraçosas com histórias de viés espiritual sobre seu mentor político.
Mais recentemente, decidiu antecipar o Natal e criar um Vice-Ministério para a Suprema Felicidade Social, além de obrigar uma rede varejista a reduzir de uma vez em até 75% os preços de eletrodomésticos. Pelo menos isso fez alguns venezuelanos um pouco mais felizes por alguns dias.
Guerra econômica
Como Maduro sabe que esse tipo de felicidade não pode durar muito, ele resolveu recorrer a um novo meio para garantir seu poder. Através da chamada Lei Habilitante, o presidente poderá, nos próximos 12 meses, governar por decreto, sem controle do Legislativo.
Segundo acusações da oposição, a fim de assegurar os necessários três quintos de maioria na Assembleia Nacional, uma deputada que ameaçava não votar com o governo foi rapidamente substituída por outro deputado que, por sua vez, foi ameaçado de ter sua empresa expropriada caso fosse contra o projeto de lei.
Mas não é só a aprovação da lei que tem características pouco democráticas. Maduro agora tem carta branca para a "guerra econômica" que ele acusa as empresas privadas de travar contra a Venezuela, com o apoio de potências estrangeiras.
Presentes para as eleições municipais
O presidente quer agora lutar contra a corrupção e a especulação, definir salários e preços que julga "razoáveis" e limitar os lucros de empresas. Tudo isso, claro, apenas para o bem e a felicidade do povo venezuelano.
Mas Maduro também quer beneficiar a si mesmo com a lei. Porque os presentes populistas que vai distribuir nas próximas semanas devem render dividendos já no início de dezembro. É quando a Venezuela elegerá novos prefeitos e vereadores, num primeiro teste para o presidente depois de sua eleição, em abril.
O economista e psicólogo Axel Capriles, da Universidade Andrés Bello, em Caracas, acha que o plano pode dar certo. "A sociedade venezuelana vive para o momento. Ela não vê os impactos que uma medida econômica de hoje pode ter no próximo mês."
Injeção de glicose
A longo prazo, nem esta lei será capaz de disfarçar a incapacidade de Maduro. "Isso é como uma injeção de glicose", avalia o cientista político Edgard Gutierrez. "A curto prazo, ela vai proporcionar uma sensação boa em certos círculos. Mas o novo mal já espera na próxima esquina."
Mesmo chavistas convictos já reclamam de Maduro. O presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, já é considerado há algum tempo um rival interno de Maduro. E, ao contrário deste, Cabello tem boa relação com os militares.
Segundo um blogueiro venezuelano influente e bem relacionado com o Exército, os militares já planejam conter a grande influência de Cuba, incentivada e tolerada por Maduro. Para isso, um general venezuelano deve voar ainda esta semana para negociar em Havana.