Nova coalizão reajusta política externa alemã
14 de novembro de 2005O programa conjunto de governo da nova coalizão alemã passou nesta segunda-feira (14/11) pelo crivo dos dois maiores partidos alemães. A União Democrata Cristã (CDU) da futura chanceler federal Angela Merkel o aprovou com grande maioria em sua convenção partidária em Berlim: apenas três votos contra e uma abstenção, de um total de 116 delegados.
Na convenção do Partido Social Democrata (SPD), em Karlsruhe, o documento também passou com grande maioria: entre 518 delegados houve apenas 15 votos contra e cinco abstenções. Em Munique, os cerca de 200 delegados da União Social Cristã (CSU) votaram unanimemente, sem abstenções.
No que diz respeito às diretrizes para a futura política externa da Alemanha, houve como que um acerto de contas entre social-democratas e a bancada conservadora da futura chanceler federal Angela Merkel. Neste capítulo do programa, buscaram-se compromissos em quase todas as questões que por um longo tempo acirraram as diferenças entre as duas facções durante o governo de Gerhard Schröder.
Parceiros, mas soberanos
Um dos temas centrais é o resgate das relações com os Estados Unidos, abaladas em virtude da oposição de Schröder à invasão estadunidense no Iraque, com o apoio da França e da Rússia. Objetivo é "uma Europa autoconfiante, que se entende não por contrapeso, mas por parceira dos Estados Unidos", consta do documento.
A Alemanha deverá estreitar os laços transatlânticos especialmente na manutenção de um relacionamento próspero com o mundo islâmico, na luta pela paz e a estabilidade no Oriente Médio, contra a fome e o terrorismo, e em questões de segurança. Para tanto, até mesmo a participação das Forças Armadas alemãs será "levada em consideração".
Ao mesmo tempo, o documento de 15 páginas assegura o comprometimento alemão com a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) – "o principal pilar de nossa política de defesa e segurança" –, bem como com a política de defesa e segurança da União Européia.
Estabilidade perante a UE
Quanto à questão européia, CDU, CSU e SPD concordaram que a contribuição da Alemanha para o financiamento do orçamento da União Européia não ultrapassará 1% do PIB. Em contrapartida, a Alemanha se compromete a estabilizar suas finanças e respeitar o Pacto de Estabilidade do bloco, voltando a conter,a partir de 2007, o déficit orçamentário abaixo do limite estabelecido de 3% do PIB. Além disso, o documento inclui uma confirmação do programa europeu de subsídios agrários.
A grande coalizão confirmou também seu compromisso com o projeto da Constituição Européia, estacionado após as derrotas nos plebiscitos na França e na Holanda. O processo de ratificação nos países onde isso ainda não ocorreu deverá continuar na primeira metade de 2006, ganhando força quando a Alemanha assumir a presidência do Conselho Europeu no primeiro semestre de 2007.
Além disso, o governo continuará salientando a urgente necessidade de reformas na Organização das Nações Unidas: "A Alemanha continua disposta a assumir maiores responsabilidades ao receber uma vaga permanente no Conselho de Segurança, embora no futuro almeje uma vaga única para a União Européia".
Turquia ainda é pedra no sapato
Já o ingresso da Turquia na União Européia exigiu uma enorme habilidade lingüística dos partidos da coalizão, que, segundo o jornal International Herald Tribune, "concordaram em discordar". O processo de admissão da Turquia na UE, que teve início com a tomada das negociações em 3 de outubro último, foi descrito no papel como um desenvolvimento de final aberto.
Mesmo que conste do documento a possibilidade da admissão integral da Turquia no bloco, isso não se dará de forma nem automática, nem garantida. Para o caso negativo, a nova coalizão encontrou uma saída pela tangente: "Caso a Europa não esteja em condições de se expandir, ou a Turquia não esteja pronta para cumprir todas as condições impostas, ela deverá ser incorporada da melhor forma possível às estruturas européias, de modo a desenvolver sua relação privilegiada com a UE".
Não só a Rússia
Embora mantendo a parceria estratégica de laços estreitos que Schröder cultivou com a Rússia, o novo governo pretende acirrar suas cobranças ao vizinho, principalmente no que diz respeito aos conflitos na Chechênia e ao desenvolvimento da democracia, do Estado de direito e dos direitos humanos no país.
A tríplice aliança Alemanha-França-Rússia continuará desempenhando um papel central, embora ajustando sua atenção para outras nações do bloco, ao mesmo tempo que observando os interesses dos demais países do Leste Europeu.
Combate à pobreza mundial
Outro ponto-chave é a continuidade da ajuda a países em desenvolvimento e a implantação de medidas para a redução da pobreza com base nas Metas do Milênio da ONU.
A decisão do atual governo de elevar a contribuição financeira para projetos de auxílio a países em desenvolvimento a pelo menos 0,51% do PIB até 2010 foi mantida no novo programa. Além disso, a Alemanha pretende estabelecer "parcerias estratégicas com importantes países emergentes", embora o documento não cite detalhes.