Nova etapa da crise global ameaça países emergentes
29 de junho de 2013Num passado não muito distante, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, protestava contra o afrouxamento da política monetária por parte dos Estados Unidos e de alguns países europeus – não raro usando a expressão “guerra cambial”. Na época, dólares e euros recém-impressos invadiam o mercado brasileiro de títulos, provocando a valorização do real e, de tabela, impondo uma ameaça às exportações do país.
A situação, agora, é justamente oposta. O Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) mal anunciara o fim do programa de compra de títulos, e os investidores já se retiraram em debandada das obrigações e ações de países emergentes. Até agora, o Brasil estava entre os países emergentes que eram financiados por fluxos financeiros de curto prazo.
"Trata-se de dinheiro que pode ser retirado rapidamente, o que pode ser tumultuoso dependendo das circunstâncias", opina o economista Hanno Beck.
Juros e tensão em alta
Embora nos últimos anos o Brasil tenha ascendido à sexta economia mundial, a classe média pouco se beneficiou. O fato de a inflação ter disparado para mais de 6% ao ano e o crescimento ter caído para cerca de 2% fez com que a juventude passasse a questionar o seu futuro.
Para controlar a inflação, a taxa de juros foi elevada para 8%, o que é um veneno para a conjuntura. No início de junho, o governo aboliu um imposto sobre a compra de títulos por investidores estrangeiros numa tentativa de mantê-los no país.
Mas o ceticismo em torno do Brasil aumenta justamente entre esses investidores. Isso não se deve somente aos protestos, mas também ao fraco crescimento econômico. Pois nos últimos anos, a escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 desencadeou um boom da construção civil financiado a crédito. Um estouro dessa bolha de crédito poderia ameaçar o sistema financeiro.
Também na Turquia, outro país emergente que já foi tratado como um dos favoritos dos investidores estrangeiros, o clima ameaça mudar. Lá também há protestos de jovens que se beneficiaram do rápido desenvolvimento do país nos últimos dez anos, mas que agora exigem o direito à participação política.
Emergentes, os dois países têm outro ponto vulnerável: o déficit em conta corrente – ou seja, ambas as economias importam mais que exportam. A Turquia chega mesmo a apresentar o maior déficit de todos os países do G20. A razão está na dependência da importação de petróleo e no descontrole dos empréstimos ao consumidor.
A terceira fase da longa crise
Quando um país como a Turquia vem pagando, há anos, suas importações com capital estrangeiro, isso pode vir a ser perigoso quando esse capital é retirado de uma só vez, diz Hanno Beck: "Eles não vão poder comprar mais nada porque não dispõem mais de divisas estrangeiras para poder pagar as importações."
Uma vez que o mercado de títulos de países emergentes ainda é relativamente pequeno, a retirada de capital poderia provocar um rápido aumento dos juros.
"O que observamos agora nos mercados de capitais é a incerteza sobre a taxação de títulos soberanos", diz o historiador da economia Harold James, da Universidade de Princeton, que explica que essa incerteza gira em torno de países altamente endividados e que durante muito tempo conseguiram fazer dívidas com uma baixa taxa de juros. "Mas assim que os juros dispararem, eles ficarão inadimplentes."
Segundo ele, esse problema atingiria principalmente o Brasil, a Turquia e alguns países da Europa Central e do Leste, que acumularam não somente um crescimento dinâmico nos últimos anos, mas também déficit em conta corrente através da importação de capitais.
Para o historiador, não se trata de uma nova crise, mas da terceira fase da crise que perdura desde 2007: "Primeiro veio a crise americana, que muitos na Europa acreditaram ser uma crise dos EUA. Isso aconteceu em 2007, 2008. Então veio a fase europeia da crise, principalmente desde 2010."
A terceira fase, no entanto, não deve atingir todos os países emergentes da mesma forma. A China, a maior economia emergente do planeta, será poupada, segundo James: "A China vivencia no momento uma desaceleração suave do crescimento econômico", afirma. Embora os últimos dados econômicos não sejam muito animadores, continua o especialista, a China não depende de capital externo, afirmou o professor britânico.
Apesar de todos os cenários de crise, Maria Laura Lanzeni, especialista em países emergentes do Deutsche Bank, diz que os mercados emergentes continuarão a registrar taxas de crescimento bem superiores às dos países industriais. “Essa diferença vai permanecer", prevê.