O governo Lula e o valor do salário mínimo em 2023
19 de janeiro de 2023A promessa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de retomar a política de valorização do salário mínimo não será implementada imediatamente.
Lula disse na campanha que o salário mínimo voltaria a ser reajustado não só pela inflação, mas também de acordo com a variação do Produto Interno Bruto (PIB) – se a economia cresce, o valor do salário mínimo também cresce acima da inflação.
Essa política foi adotada em 2007, no governo anterior do petista, e encerrada em 2019, na gestão de Michel Temer, e explica parte da redução da pobreza ocorrida no Brasil no período.
Após a vitória de Lula, o coordenador do núcleo de Orçamento da equipe de transição de governo, senador Wellington Dias (PT-PI), disse que o reajuste do salário mínimo consideraria, além da inflação, a variação média do PIB dos cinco anos anteriores, e que a medida poderia ser implementada já a partir de janeiro deste ano.
Mas o otimismo de Dias não se confirmou. Nesta quarta-feira (18/01), Lula reuniu-se com representantes de centrais sindicais em Brasília e não anunciou um novo valor para o salário mínimo, nem garantiu que ele será implementado em algum momento deste ano.
Valores em debate
O salário mínimo em vigor neste ano, definido no final do governo Jair Bolsonaro, é de R$ 1.302. O valor é 7,4% maior do que o do ano anterior, e já inclui um aumento de 1,6% acima da inflação de 2022 medida pelo IPCA. Foi o primeiro reajuste real do valor do salário mínimo desde 2019.
O valor do salário mínimo neste ano, segundo a proposta detalhada por Dias, seria de R$ 1.320, 8,9% maior do que o do ano anterior e 3,1% acima da inflação de 2022.
Na reunião com Lula, os sindicatos pediram um valor ainda maior, de R$ 1.343 – 10,8% maior do que o do ano passado, com aumento real de 5% acima da inflação.
O que aconteceu
O salário mínimo é o piso para os trabalhadores do setor formal e para beneficiários de algumas políticas previdenciárias e sociais, e serve de referência para o rendimento de 56,7 milhões de pessoas no Brasil, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Dessas, 24,2 milhões são beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), como aposentados e recebedores do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Por esse motivo, reajustes no salário mínimo têm grande impacto nos gastos públicos, e o governo federal está neste momento tentando cortar gastos e aumentar a arrecadação para reduzir o déficit primário. Na quinta-feira passada, o ministro da Economia, Fernando Haddad, apresentou um pacote de medidas de R$ 242,7 bilhões nesse sentido.
Além disso, a equipe econômica diz não ter ainda dados precisos sobre o quanto a folha de beneficiários do INSS cresceu no último ano, após o governo Bolsonaro ter acelerado a concessão de novos benefícios no período pré-eleitoral. Quanto maior a folha, maior o impacto do reajuste.
Lula então decidiu não aumentar agora o valor do salário mínimo. No lugar, ele determinou a criação de um grupo de trabalho com representantes do governo e dos sindicatos para discutir a política de valorização e apresentar uma proposta no prazo de 45 dias, prorrogável por mais 45 dias, apoiada pelo ministro do Trabalho, o sindicalista Luiz Marinho.
Reajustes do salário mínimo são propostos pelo governo, mas precisam ser aprovados pelo Congresso.
O que pode acontecer
O programa de governo de Lula definiu o aumento real do salário mínimo como uma medida essencial para a "recuperação do poder de compra" de trabalhadores e beneficiários de políticas previdenciárias e assistenciais.
A medida também tem impacto na dinamização da economia, em especial em pequenos municípios, nos quais a proporção de pessoas com rendimento de um salário mínimo é maior.
A depender da avaliação do Ministério da Economia sobre a folha de beneficiários do INSS e da evolução do cenário fiscal, é possível que Lula anuncie um novo valor do salário mínimo no dia 1º de maio, Dia do Trabalhador.
A medida foge da praxe, pois em geral os reajustes são anunciados no final do ano, para entrar em vigor no ano seguinte. Se isso ocorrer, o anúncio em uma data tradicional de mobilização dos trabalhadores poderia render dividendos políticos para Lula.
Outro cenário, que provocaria algum desgaste para o presidente, seria reajustar o salário mínimo apenas para o ano que vem, já sob a nova política de valorização a ser definida pelo governo.
Impacto na pobreza
Uma pesquisa realizada por Alessandra Scalioni Brito e Celia Lessa Kerstenetzky e publicada em fevereiro de 2019 na revista científica da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec) concluiu que a política de valorização do salário mínimo contribuiu com cerca de 40% da redução da pobreza no país medida entre 2002 e 2013.
Mas reajustar o salário mínimo não é necessariamente a forma mais eficaz de combater a pobreza, em termos de custo para os cofres públicos e impacto na miséria, escreveu o economista Marcelo Medeiros, professor-visitante da Universidade Columbia, em Nova York, em artigo no jornal Nexo. Se o objetivo for reduzir a pobreza no curto prazo, a melhor medida é a transferência direta de recursos focalizada nos mais pobres.
bl (ots)