O impacto do fator Lula nas eleições de 2022
9 de março de 2021Na tarde de segunda-feira, a vida política do Brasil foi fortemente abalada. De forma surpreendente, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin anulou quatro processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, abrindo caminho para uma nova candidatura do petista. "Se, de fato o Lula vier a ser candidato, o jogo de 2022 muda completamente", diz o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). "E aí fica quase certo que o segundo turno da eleição será entre Lula e Bolsonaro. Pelo menos esse é o cenário que a gente tem hoje."
Fachin, relator dos processos da Lava Jato no STF, cancelou todos as quatro processos judiciais envolvendo Lula em Curitiba, incluindo o sobre o tríplex no Guarujá, supostamente presenteado a Lula por uma construtora. Neste caso, Lula foi preso por 580 dias entre abril de 2018 e novembro de 2019, por corrupção e lavagem de dinheiro, não tendo podido concorrer às eleições de 2018, vencidas por Bolsonaro.
Notícia ruim para o centro
Em outro julgamento, Lula já foi condenado por corrupção envolvendo um sítio frequentando pelo petista em Atibaia. Dois outros processos, envolvendo o Instituto Lula, no entanto, ainda estão nos estágios iniciais. Ao anular os processos, considerando que os juízes curitibanos não são competentes para julgar Lula, encaminhando os processos para a Justiça Federal em Brasília, o petista recupera seus direitos políticos.
Praça ressalta, no entanto, que ainda não está totalmente claro se o duelo com o ex-militar Bolsonaro ocorrerá no final de 2022. Porque o Brasil está no meio de uma pandemia e de uma crise econômica, que podem enfraquecer Bolsonaro eleitoralmente.
A provável candidatura de Lula é uma péssima notícia menos para possíveis candidatos do centro, como o governador de São Paulo, João Doria, ou o apresentador Luciano Huck. O cientista político acredita que a entrada de Lula no jogo faz com que o segundo turno se torne um sonho mais distante para eles.
Batalha de extremos
Até agora, a oposição não conseguiu benefícios com os erros de Bolsonaro na política econômica e na luta contra a pandemia. Praça acredita, por isso, que uma candidatura de uma raposa política como Lula agrada muita gente. No entanto, sua candidatura também levaria a uma possível campanha eleitoral dos dois polos – com Bolsonaro na extrema direita e Lula na esquerda. Em última análise, esta é a melhor constelação tanto para Bolsonaro como para Lula, pois proporciona uma linha divisória clara entre os dois campos.
Em qualquer caso, Bolsonaro teria reagido com extrema tranquilidade ao cancelamento dos processos, de acordo com relatos da mídia. Porque em 2018 o sentimento anticorrupção contra Lula e seu PT o ajudou a vencer. "O anti-petismo ainda está presente, tem muita gente que nunca votaria no Lula”, diz Praça. Mas recentemente as pesquisas surpreenderam. Segundo sondagens, 44% afirmaram que definitivamente não votariam em Lula, mas a rejeição do Bolsonaro, de 56%, foi ainda maior.
Clima anti-PT se arrefece
Portanto, o auge do clima anti-PT parece ter ficado para trás. Muito pode ser atribuído às revelações depois que hackers terem invadido arquivos de mensagens de juízes e procuradores da Lava Jato em 2019, expondo conluios contra Lula. Além disso, muitos brasileiros têm boas lembranças do ex-presidente. "Acho que a impressão que fica sobre Lula, é que ele pode ter vindo de um partido corrupto e que podia ter tido corrupção no seu governo, mas que ele é um político competente", sublinha Praça, acrescentando ser algo que o diferencia do atual governante Jair Messias Bolsonaro, que é corrupto e, ao mesmo tempo, incompetente.
Muitos caminhos levam à candidatura
Pouco depois de anunciada a anulação dos julgamentos, a Procuradoria-Geral da República anunciou que entraria com recurso. Isso significa que a decisão de Fachin deve ser analisada pelo plenário do STF. Mas Fachin pode contar com o apoio da maioria de seus colegas, segundo o coordenador do Centro de Justiça e Sociedade (CJUS) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Michael Mohallem.
A candidatura de Lula também pode ser ameaçada pelo novo juiz em Brasília. Pelo menos em teoria, embora seja hipótese pouco provável, acredita Mohallem. "Mesmo que o novo juiz condene o Lula, não haverá tempo para as duas condenações", explica. Isso seria necessário para que Lula voltasse a ser considerado inelegível segundo a Lei da Ficha Limpa. O prazo para isso seria a data de inscrição para a candidatura de Lula, dentro de cerca de 16 meses.
"Não me parece que esse juiz vá querer cometer o mesmo erro de acelerar exageradamente o processo", opina Mohallem, que atualmente realiza uma investigação que mostra que os processos de Lula em Curitiba percorreram as instâncias com velocidade muito maior que o normal.