O papel do STF no processo de impeachment de Dilma
1 de abril de 2016A questão do impeachment não tem despertado opiniões contundentes apenas no cenário político e nas ruas do país. Até mesmo integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) têm sido levados a dar palpites sobre a legitimidade do impeachment, e elas variam desde considerar o mecanismo perfeitamente normal até expressar o temor de "golpe". Alguns, como o ministro Luís Roberto Barroso, foram mais longe e chegaram (ainda que acidentalmente) a opinar sobre as figuras que podem vir a suceder a presidente Dilma Rousseff.
As declarações dos ministros do STF estão sendo acompanhadas com atenção no meio político, já que nos últimos anos o tribunal tem assumido cada vez mais um papel de instância superior das disputas políticas brasileiras, que passam por um processo de "judicialização", no qual os grandes conflitos não estão sendo mais resolvidos no Congresso, mas no plenário do Supremo.
Se essa tendência continuar, é provável que Dilma venha a contestar no tribunal qualquer decisão desfavorável a ela na Câmara sobre o impeachment. O Supremo seria, assim, o último recurso que a presidente poderia usar para impedir sua destituição. "A oposição não teria razão para apelar ao STF caso perdesse a votação, mas a presidente levaria questionamentos sobre o mérito do pedido, contestando se ele caracteriza mesmo crime de responsabilidade", afirma o professor de direito constitucional Oscar Vilhena Vieira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), citando as "pedaladas fiscais", que são a base do pedido.
Golpe ou não?
E no meio disso estão as opiniões dos 11 ministros do STF, que podem dar pistas sobre como cada um pode vir a se comportar caso o futuro de Dilma venha mesmo a ser decidido no tribunal. No caso mais recente, o ministro Marco Aurélio Mello pareceu concordar com a presidente, que vem afirmando que o uso das "pedaladas fiscais" configuram uma tentativa de "golpe".
"Se não houver fato jurídico que respalde o processo de impedimento, esse processo não se enquadra em figurino legal e transparece como golpe", disse Marco Aurélio nesta quarta-feira (30/03), indicando que o STF deve analisar o mérito do pedido e não apenas fiscalizar se o processo está seguindo corretamente o rito.
Marco Aurélio também opinou sobre eventuais consequências de uma eventual queda de Dilma. "Nós não teremos a solução e o afastamento das mazelas do Brasil apeando a presidente da República", afirmou.
Outro ministro, Luís Roberto Barroso, mostrou posição contrária. Ao falar com um grupo de deputados, na segunda-feira, deixou claro que não cabe ao STF discutir o mérito do processo. "O que os senhores decidirem na Câmara e depois o que o Senado decidir é o que vai prevalecer. Quer dizer, o Supremo não tem nenhuma pretensão de juízos de mérito nessa matéria”, afirmou. "Eu acho que o impeachment não é golpe. É um mecanismo previsto na Constituição para o afastamento de um presidente", afirmou.
No entanto, Barroso, sem saber que estava sendo gravado, também deixou escorregar para um grupo de estudantes, nesta quinta-feira, o que pensa sobre o PMDB, o partido do vice-presidente Michel Temer, que pode vir a suceder Dilma. "Quando, anteontem, o jornal exibia que o PMDB desembarcou do governo e mostrava as pessoas que erguiam as mãos, eu olhei e disse: 'Meu Deus do céu! Essa é a nossa alternativa de poder'", declarou Barroso na ocasião.
Comportamento inadequado
O ministro Celso de Mello, o mais antigo do tribunal, também entrou no coro de que o impeachment não é golpe, mas evitou falar dos méritos do pedido. "A figura do impeachment não pode ser reduzida à condição de mero golpe de Estado porque é um instrumento previsto na Constituição."
Já o ministro Gilmar Mendes, que rotineiramente é alvo de críticas por sua proximidade com figuras das oposição, já havia dito em dezembro que cabe só ao Congresso decidir se as "pedaladas fiscais" são crime. Outros ministros, como o presidente do STF, Ricardo Lewansdosvki, não mostraram posição clara. "Golpe é uma expressão que pertence ao mundo da política. E nós aqui usamos apenas expressões do mundo jurídico", disse.
Para Vilhena, é inadequado que alguns ministros, especialmente Marco Aurélio, estejam adiantando posições. "Eles não deveriam estar se pronunciando de antemão sobre um caso que pode eventualmente ser julgado pela corte. Barroso, por exemplo, adiantou que não acha que a corte deva entrar no mérito. Mas acho mais preocupante Marco Aurélio não só indicar que a corte deve entrar no mérito, como dar a entender que as pedaladas não configuram crime de responsabilidade. Tudo isso quando uma análise pelo STF ainda é hipotética", afirmou.
Ele disse achar difícil a oposição reunir os 342 votos necessários para levar o impeachment ao Senado, mas que, caso isso aconteça, será difícil o STF entrar no mérito do pedido. Dessa forma, posições como a de Marco Aurélio não devem prevalecer.
"O julgamento de crime de responsabilidade cabe ao Congresso, e não ao STF. Eles vão seguir a tendência de 1992, no processo contra Fernando Collor, que é o entendimento que se trata de um processo político e não jurídico. Basta lembrar que Collor perdeu o mandato, mas depois foi posteriormente absolvido pelo Supremo", argumentou.