O que mudou na França desde os ataques ao "Charlie Hebdo"
7 de janeiro de 201624 de junho de 2015: mais poderes de vigilância para os serviços secretos
O Parlamento francês aprovou um projeto de lei que dá mais poderes aos serviços secretos. A nova legislação permite que câmeras, grampos telefônicos, microfones escondidos e uma série de outros dispositivos sejam usados, por exemplo, em residências ou veículos de suspeitos, sem necessidade de autorização judicial.
Empresas de comunicação e internet também são obrigadas a permitir que os serviços secretos instalem equipamentos para coletar os chamados metadados de todos os usuários na França. Metadados são informações como horário e duração de uma conexão ou ligação, mas não o conteúdo.
Críticos afirmam que a lei agride a privacidade dos cidadãos e dizem temer que ela legitime um sistema de vigilância em massa dentro da sociedade francesa. A eficiência da lei foi questionada depois dos atentados de 13 de Novembro em Paris. Os Estados Unidos aprovaram lei semelhante após os ataques de 11 de Setembro.
16 de novembro de 2015: retirar a cidadania francesa de terroristas com dupla nacionalidade
O governo quer retirar a cidadania francesa de pessoas condenadas por terrorismo e que tenham dupla nacionalidade. O projeto conta com amplo apoio popular, com pesquisas indicando que de 80% a 90% da população o aprovam.
Pela atual legislação francesa, a cidadania somente pode ser retirada de pessoas que se naturalizaram francesas e não de cidadãos que são franceses natos. A nova regra ampliaria essa possibilidade para todos que tiverem dupla cidadania.
Porém, a cidadania não poderia ser retirada de terroristas que possuam apenas a cidadania francesa, já que o direito internacional impede um Estado de tornar seus cidadãos apátridas.
Críticos consideram que a mudança vai criar duas classes de cidadãos: a dos que podem perder a cidadania francesa e a dos que não podem. Segundo eles, isso contraria o princípio de igualdade previsto na Constituição. Além disso, eles afirmam que a mudança seria inócua no combate ao terrorismo.
Entre os críticos estão muitos aliados do governo socialista. Já adversários políticos dos socialistas, como a extrema direita, apoiam a ideia.
A questão também é sensível porque, durante a Segunda Guerra Mundial, o regime Vichy, que colaborava com as autoridades nazistas, revogou a cidadania de judeus e membros da Resistência, incluindo mais de 15 mil naturalizados e 500 natos. Um deles era o general Charles de Gaulle.
A mudança necessita de reforma constitucional e da aprovação de três quintos dos deputados e dos senadores. A Assembleia Nacional (câmara baixa do Parlamento) deverá começar a analisá-la em fevereiro, e o Senado, em março.
A França tem cerca de 3,5 milhões de cidadãos com dupla nacionalidade.
23 de dezembro de 2015: incluir estado de emergência na Constituição
Para combater a ameaça terrorista, o governo francês pretende inscrever na Constituição o regime de estado de emergência, que hoje é regulamentado por uma lei comum.
O estado de emergência é uma situação de exceção, na qual alguns direitos e liberdades são suspensos. Ele foi decretado na França depois dos ataques de 13 de Novembro, que deixaram 130 mortos e foram reivindicados pelo grupo terrorista "Estado Islâmico" (EI). O Parlamento francês aprovou o atual estado de emergência por quase unanimidade e ele vale até 20 de fevereiro.
Na França, o estado de emergência permite aos representantes do Estado efetuar buscas, ordenar prisões domiciliares e dissolver associações sem necessidade de autorização judicial, baseando-se na simples suspeita de uma ameaça para a segurança pública.
Hoje, esse regime de exceção é regulamentado por uma lei comum na França, o que o torna suscetível de ser contestado perante o Conselho Constitucional (corte constitucional francesa). Se a reforma almejada pelo Executivo for realizada, isso não será mais possível.
Para a reforma ser aprovada, ela necessita de três quintos dos votos dos deputados e dos senadores.
7 de janeiro de 2016: mais poderes para a polícia
No aniversário de um ano dos ataques ao jornal Charlie Hebdo, o presidente francês, François Hollande, afirmou que o governo planeja aprovar novas leis. Uma delas deve permitir que policiais fora de serviço portem armas.
Além disso, a polícia deve ganhar mais poderes para abordar e revistar suspeitos, e a comunicação entre as forças policiais deve ser ampliada.
Hollande também pediu maior vigilância aos cidadãos radicalizados que aderem ao "Estado Islâmico" e outros grupos jihadistas no Iraque e na Síria, para depois retornarem à França.
AS/afp/ap/rtr