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O que o Brexit significa para a ciência

Fabian Schmidt (tam)28 de junho de 2016

Reino Unido e UE estão estritamente ligados no campo da pesquisa científica, em relação ao intercâmbio de cientistas, ao financiamento e ao estabelecimento de padrões. O que acontece com a saída dos britânicos do bloco?

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Tubos de ensaio em laboratório
Foto: Fotolia/Tom

O referendo histórico do último dia 23 de junho, em que a maioria dos britânicos votou a favor da saída do Reino Unido da União Europeia (UE), sacudiu a comunidade científica internacional, provocando temores quanto ao futuro das parcerias entre o país e o bloco europeu.

"Agora, cientistas britânicos têm que dar duro para exigir que decisores políticos promovam a continuidade de colaborações científicas", afirmou Grame Reid, chefe de Política para Ciência e Pesquisa da University College London, em artigo de opinião publicado pela revista Science nesta segunda-feira (27/06).

Reid destaca a cultura internacional como um dos fortes da ciência no Reino Unido. "Deixar a UE não significa o fim dessa qualidade, mas requer mudanças profundas quanto aos aspectos práticos por trás dela", alerta.

Confira alguns dos impactos que o Brexit pode ter sobre a pesquisa científica na Europa:

Qual é a importância do financiamento da UE para instituições de pesquisa britânicas?

Embora em geral o Reino Unido pague mais à UE do que recebe dela, a ciência é uma exceção. O motivo: trata-se de um país líder em pesquisa, com instituições de ótima reputação. Essa relevância pode ser medida pelo número de publicações. Um em cada seis dos artigos científicos mais citados no mundo tem ao menos um autor britânico.

E agora, Brexit?

Por meio do programa Horizon 2020, a UE destinará à pesquisa científica um total de 80 bilhões de euros ao longo de sete anos – de 2014 a 2020. No programa anterior, instituições britânicas receberam do bloco um total de sete bilhões de euros em subsídios a pesquisa.

"Apenas tentando visualizar a pesquisa no Reino Unido sem os fundos da UE, e a pesquisa na UE sem os pesquisadores britânicos. O Brexit vai destruir as universidades do Reino Unido", escreveu este usuário do Twitter.

Qual será o efeito do Brexit para universidades do Reino Unido?

Deixar a UE criará um imenso buraco no orçamento das universidades. Algumas delas têm mais de 10% de seu fundo de pesquisa abastecido pelo bloco europeu. O governo britânico teria que compensar essas perdas usando recursos que deixaria de encaminhar a Bruxelas.

Entretanto, há uma enorme incerteza em relação ao desempenho econômico do país no longo prazo. Se o Reino Unido entrar em recessão, a verba economizada com o fim dos repasses à UE pode secar rapidamente. A defasagem nos orçamentos das universidades britânicas pode chegar a 930 milhões de euros por ano.

O que vai acontecer com cooperações em andamento?

Em primeiro lugar, os detalhes da saída do Reino Unido da UE terão que ser negociados. Nesse meio tempo, os acordos de financiamento com a UE que estão em vigor serão mantidos e é provável que continuem no futuro. Pesquisadores britânicos também não precisam temer serem excluídos de repente de projetos em parceria com outros parceiros do bloco.

No entanto, uma questão segue sem resposta, em relação às permissões de residência dos dois lados do Canal da Mancha. Espera-se que sejam encontradas soluções pragmáticas.

"Acabo de conversar com cientistas em Manchester. Eles disseram, em termos inequívocos, o Brexit é um desastre total para a ciência e a tecnologia no Reino Unido", disse esta usuária do Twitter.

Quais efeitos o Brexit terá para estudantes?

Britânicos que estudam em algum país da UE que esclarecer sua situação em relação à permissão de residência e visto antes do Brexit. Ainda não está claro se haverá um programa de isenção de visto para os afetados.

No futuro, estudantes britânicos terão que passar pelo mesmo processo de candidatura por que passam outros cidadãos de países de fora da UE. Um dos pontos que ainda estão obscuros é se o Reino Unido continuará a fazer parte do famoso programa Erasmus, de intercâmbio estudantil, o que deve ser renegociado.

"Comecei uma petição para proteger o esquema Erasmus apesar do Brexit. Por favor, assine para demonstrar seu apoio", diz este outro tweet.

O que acontece com cientistas britânicos em instituições de pesquisa europeias?

Muitos pesquisadores que atuam há vários anos em instituições de pesquisa europeias estão seriamente considerando a opção de pedir cidadania nos países onde vivem, diz Annika Thies, diretora do escritório da associação científica alemã Helmholtz em Bruxelas.

Os institutos do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia estão todos localizados fora do Reino Unido. Ainda assim, o país está envolvido nessas instituições e precisará negociar individualmente a participação em projetos comuns após o Brexit.

Empregar britânicos em outras instituições de pesquisa pode ser menos problemático, especialmente se eles tiverem contratos de trabalho diretos com a respectiva entidade e não estiverem trabalhando como parte da contribuição britânica num acordo entre países-membros da UE.

"O Brexit vai excluir o Reino Unido da pesquisa europeia, do controle de doenças e da segurança alimentar e de medicamentos", alertou este outro usuário do Twitter.

Como ficará a cooperação em grandes instituições de pesquisa da Europa, como o Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN, na sigla em inglês)?

Instituições como o CERN têm uma estrutura que é internacional o suficiente para garantir a continuidade da participação do Reino Unido e de cientistas britânicos. O motivo: o CERN não é uma entidade da UE, mas uma instituição comum europeia, o que significa que inclui muitos países que não fazem parte do bloco. Ele funciona totalmente independentemente de decisões tomadas em Bruxelas ou Londres.

A situação é semelhante na Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês), uma organização intergovernamental que a cada ano negocia diretamente com os Estados-membros seus projetos e financiamentos. Alguns países europeus são apenas colaboradores, enquanto outros Estados e fora do bloco, como Suíça e Noruega, são membros plenos.

O Reino Unido pode enfrentar uma fuga de cérebros?

Nos últimos anos, o governo britânico tem feito cortes consideráveis no financiamento de pesquisa. Ao mesmo tempo, a alocação de recursos europeus cresceu constantemente. Essa é uma das razões por que pesquisadores do país frequentemente veem a UE de maneira positiva.

Se esses especialistas vão tentar a sorte no continente ou permanecer em seu país vai depender principalmente da habilidade de Londres de cobrir a lacuna financeira que deve surgir. De outro modo, universidades britânicas podem se tornar comparativamente menos atrativas.

Enfermeira com seringa
Regulamentação para estudos clínicos e organismos transgênicos pode ser afrouxadaFoto: picture-alliance/dpa/I.Zarembo

O Brexit trará alguma vantagem para cientistas do Reino Unido?

Na pesquisa médica básica, a saída dos britânicos do bloco europeu pode dar um novo ímpeto para pesquisadores. Isso porque a regulamentação europeia sobre a condução de testes clínicos é tão rígida que pequenas instituições de pesquisa muitas vezes não conseguem cumpri-la.

Algumas regras são tão complexas que, muitas vezes, apenas grandes companhias farmacêuticas têm condições de satisfazer as exigências. Isso levou a uma redução generalizada dos testes clínicos na UE, apontaram cientistas britânicos.

Na prática, muitos projetos de pequeno porte têm sido bloqueados. Caso o Reino Unido afrouxe essas regras, o cenário da pesquisa pode vir a se desenvolver de forma mais diversificada.

Também no campo dos organismos geneticamente modificados os britânicos poderiam amenizar alguns dos padrões rígidos da UE, o que tornaria suas universidades um lugar mais atraente para pesquisadores interessados no assunto.