O que se sabe sobre os protestos antigoverno em Cuba
13 de julho de 2021Cuba vivenciou no domingo (11/07) suas maiores manifestações antigoverno em décadas, reprimidas por ordens do presidente Miguel Díaz-Canel. A seguir, uma panorâmica da motivação dos atos, o que eles significam para o Estado insular e como a comunidade internacional está reagindo.
Como é a situação atual em Cuba?
A polícia foi mobilizada em Havana e em outras cidades cubanas na segunda-feira. As ruas da capital estavam tranquilas, devido à presença policial reforçada. As autoridades bloquearam as plataformas de redes sociais, numa tentativa de censurar as informações sobre os protestos. Têm sido também frequentes as panes da internet móvel – o único acesso online para a população.
"Vimos como a campanha contra Cuba vinha crescendo nas redes sociais, nas últimas semanas", comentou Díaz-Canel na televisão. "É assim que se faz: tentar criar inconformismo, insatisfação, manipulando emoções e sentimentos."
Pelo menos 100 manifestantes, jornalistas e ativistas foram presos desde os protestos, segundo o Cubalex, um grupo de direitos humanos exilado.
Qual é a dimensão dos protestos?
Milhares de cubanos encheram as ruas de Havana e outras cidades no domingo, nas maiores manifestações contra o governo em quase 30 anos. Eles entoavam slogans como "Abaixo a ditadura", "Queremos liberdade" e "Não temos medo". Não houve um organizador formal.
Como confirmou à DW a jornalista Mónica Rivero Cabrera, os atos se estenderam por todo o país: "Começamos a cobrir desde o primeiro protesto, no oeste da ilha. E depois, pelas redes sociais, você podia ver que havia pelo menos uma manifestação em cada província. Foi realmente em dimensão nacional."
Um dos atos mais comentados ocorreu em San Antonio de los Baños, com 50 mil habitantes e situada a sudoeste da capital: ao aparecer pessoalmente ao evento, o presidente foi recebido com insultos pelos cidadãos irados.
Devido ao apagão das redes, fica difícil determinar se os protestos continuaram por um segundo dia. Algumas postagens não verificadas no Twitter mostram manifestações na segunda-feira na cidade de Holguín, no leste da ilha.
Por que os cubanos estão protestando?
Entre os motivos dos manifestantes estão as longas filas para compra de alimentos, a falta de medicamentos e a alta dos preços. "O problema é que o governo não tem divisas estrangeiras para importar comida, remédios ou combustível, então há escassez de todos os gêneros de primeira necessidade nas lojas", explica o especialista em assuntos latino-americanos William LeoGrande, professor da American University.
Além disso, "ocorrem blecautes de eletricidade que lembram os cubanos dos piores tempos dos anos 1990, depois do colapso da União Soviética; e o povo está frustrado com o alastramento da covid-19". Atualmente Cuba registra um recorde de contágios com o novo coronavírus.
As restrições às viagens ditadas pela pandemia devastaram o setor de turismo, um dos principais motores da economia cubana. O açúcar, que conta entre os mais importantes bens de exportação, também teve uma safra fraca em 2021.
"Os cidadãos estão ansiosos por liberdade econômica, por liberdade de expressão", acrescenta a jornalista Rivero Cabrera, "então é difícil dizer que haja só uma causa para essa agitação."
O que Havana diz dos distúrbios?
Diversas autoridades do país acusam os Estados Unidos de orquestrarem os distúrbios populares. Na segunda-feira, Miguel Díaz-Canel declarou que os americanos perseguem "uma política de sufocação econômica, a fim de provocar tumulto social". Desde 1962 os EUA impõem um embargo abrangente a Cuba, limitando as transações econômicas.
O mandatário também tuitou que "a contrarrevolução sonha com uma guerra entre os cubanos", e enfatizou a unidade nacional. Antes, ele conclamara os apoiadores comunistas a confrontarem as "provocações" partindo dos participantes dos protestos.
Rogelio Polanco Fuentes, um dos líderes do Partido Comunista de Cuba, afirmou que as manifestações seriam financiadas por Washington, visando fomentar "instabilidade e caos" na ilha, e as comparou aos protestos de 2019, com apoio americano, contra o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, um aliado de Cuba.
Como a comunidade internacional reage aos protestos?
Em comunicado nesta segunda-feira, o presidente dos EUA, Joe Biden, expressou solidariedade com os manifestantes: "Estamos do lado do povo cubano e de seu chamado pela liberdade e por um alívio das trágicas garras da pandemia e de décadas de repressão e sofrimento econômico a que eles têm sido sujeitos pelo regime autoritário de Cuba."
O professor LeoGrande crê que os distúrbios dificultarão ao governo Biden alterar a política linha-dura americana para com o Estado caribenho. Políticos cubano-americanos de destaque, como o senador republicano da Flórida Marco Rubio, condenaram as ações de Havana contra os manifestantes.
Usuários do Twitter partilharam a hashtag #SOSCuba a fim de conscientizar sobre a situação e apelar por apoio internacional. O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, pediu que o governo cubano "escute o descontentamento expresso pelos manifestantes".
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, manifestou "solidariedade" com os participantes dos protestos, ajuntando que Cuba se encontra sob uma "ditadura cruel".
Por sua vez, o México e a Rússia alertaram que a situação na ilha pode ser aproveitada como justificativa para interferência estrangeira nos assuntos cubanos. O chefe de Estado venezuelano, Nicolás Maduro, confirmou seu respaldo ao governo cubano, comentando que os dois países são "irmãos nos bons e nos maus tempos".