O que une e separa Trump e Bolsonaro
18 de março de 2019A primeira viagem oficial do presidente Jair Bolsonaro provavelmente será também a mais importante. O encontro dele com o presidente dos EUA, Donald Trump, nesta terça-feira (19/03), cerca de cem dias após o início do mandato, marca uma reviravolta na política externa brasileira. Bolsonaro viaja a Washington para se oferecer como apoiador à "grande potência do norte": no governo dele, os EUA deverão ser o principal aliado do Brasil.
Isso é algo novo: nunca um presidente brasileiro havia reconhecido de tal maneira a supremacia dos Estados Unidos, não só na América Latina como também na política mundial. Mesmo durante a Guerra Fria, quando militares mandavam no país, estes mantiveram mais distância dos EUA do que Bolsonaro agora pretende. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, chegou a chamar Trump de "salvação do Ocidente".
No encontro entre Trump e Bolsonaro, a química pessoal entre os dois será decisiva, pois ambos são políticos impulsivos e coléricos. Eles não se deixam influenciar por seus assessores e raramente consideram estratégias de longo prazo ao agir. Se depender das semelhanças, o encontro tem tudo para ser um sucesso.
Afinal, Trump e o seu admirador dos trópicos são muito parecidos. Ambos usam com habilidade as redes sociais, que foram decisivas para convertê-los de outsiders a vencedores numa eleição presidencial. E ambos acabaram eleitos de forma surpreendente – também para si mesmos.
Assumir o aparato estatal foi, assim, um processo caótico em ambos os casos. As relações com o Congresso e o Judiciário são tensas – ambos consideram a divisão de poderes como supérflua e, no fundo, um estorvo. Os apoiadores os saúdam como salvadores que governam para o povo, ao contrário das odiadas elites políticas.
Tanto Trump como Bolsonaro utilizam, de forma consciente e estratégica, um linguajar antidemocrático, misógino, de desrespeito às minorias e de glorificação da violência para chamar a atenção, se impor na mídia e satisfazer seus apoiadores. Ambos glorificam o passado, quando tudo era supostamente melhor e mais bem ordenado. Ambos apoiam os lobbys das armas. São também antiglobalistas e não têm o menor pudor de chamar as mudanças climáticas de conto de fadas e as organizações internacionais, de importunas. Eles estão unidos no ódio e na rejeição às mídias tradicionais.
Ainda assim há grandes diferenças: Trump é um empresário e se apresenta como bem-sucedido e bilionário - ainda que ele esconda de propósito e de todas as maneiras suas reais posses da opinião pública. Ele é bem conectado, parte do establishment americano e uma celebridade da televisão. "Fechar acordo" é sua divisa máxima nos negócios – sempre com a intenção de levar vantagem, como expresso no slogan America first.
Bolsonaro, por sua vez, é um capitão da reserva de pouco sucesso na carreira militar. Quando já era capitão, passou 15 dias na prisão. Quando foi para a reserva, entrou para a política, onde passou décadas entre o chamado baixo clero e fez fama como defensor dos interesses dos militares aposentados, sem alcançar de fato destaque na política.
Ele não é exatamente bem conectado, com exceção dos militares e – pelo jeito – das milícias cariocas. Ao contrário de Trump, ele não tem o menor problema de dizer que não tem resposta para muitas perguntas.
Desproporcional é a imagem que um tem do outro: enquanto Bolsonaro admira Trump e não esconde isso, o americano não expressa a mesma veneração e encara o aliado inesperado como um presente, em defesa do qual ele não teve que, até agora, se expor. Isso deverá mudar agora.
À parte a admiração, Bolsonaro tem motivos políticos para sua visita: ele quer somar pontos junto a seus eleitores visitando "o homem mais poderoso do mundo", pois os evangélicos veem com bons olhos que ele vai também se encontrar com fiéis. Já os empresários e investidores que apostam em Bolsonaro esperam que Trump apoie a entrada do Brasil na OCDE. Os EUA, até agora, foram contra.
E os militares, que são maioria no governo Bolsonaro, esperam que o Brasil se torne um parceiro estreito fora da Otan, um major non-Nato-Ally (MNNA). Com isso, eles poderão ter melhor acesso e financiamento a equipamentos militares dos Estados Unidos. Uma operação conjunta da base de Alcântara também é bem vista pelos militares.
A lista de pedidos dos brasileiros é longa – a dos EUA, curta. Nela consta sobretudo um tópico: Venezuela. Para Trump, o fim do regime de Nicolás Maduro é importante para ganhar votos na próxima eleição presidencial americana, daqui a um ano e meio. Para isso, ele precisa de todo apoio logístico, talvez também militar, que o Brasil puder oferecer.
Devido à simpatia mútua, as chances de que os dois presidentes iniciem uma nova era nas relações entre Brasil e Estados Unidos são boas. Quanto tempo elas poderão durar e o que poderão significar para outras regiões, como a Europa e a China, é completamente incerto.
______________
A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos no Facebook | Twitter | YouTube
| WhatsApp | App | Instagram | Newsletter