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O que é e como funciona a delação premiada?

Jean-Philip Struck25 de maio de 2016

Em conversa gravada, Renan Calheiros defende mudanças na lei que regulamenta instrumento, que tem sido uma peça central para o andamento da Operação Lava Jato.

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Abzeichen der rasilianischen Bundespolizei
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt

Nesta quarta-feira (25/05), uma gravação mostrou que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), quer mudar a lei que trata da delação premiada. Desde o início da Operação Lava Jato, em 2014, o mecanismo tem sido uma peça central para o andamento das investigações.

A fala de Renan, que foi registrada por Sérgio Machado – ex-diretor da Transpetro que fechou um acordo de delação – reforçou as suspeitas de que parte do mundo político brasileiro está se movimentando para sabotar a Lava Jato. No áudio, Renan afirmou ser favorável a mudar a lei para impedir que pessoas presas possam fazer acordos de delação. O peemedebista já foi citado em delações de Delcídio do Amaral e Paulo Roberto da Costa.

A delação premiada existe desde os anos 90, mas foi só a partir da Lava Jato que ela se tornou mais conhecida. Essencialmente, o mecanismo é um acordo, firmado entre um suspeito ou réu com o Ministério Público, em que o primeiro se compromete a colaborar. O acordo prevê denunciar outros membros de uma organização criminosa e fornecer detalhes sobre o funcionamento do esquema. Se as informações se revelarem úteis para as investigações, o denunciante recebe em troca benefícios, como uma eventual redução da pena.

O funcionamento pode ser explicado pela teoria dos jogos. Um exemplo envolve duas pessoas interrogadas individualmente. Se não falarem, elas serão condenadas a um ano de prisão cada, com base nas provas já obtidas. Se uma delas falar, a pena desta é reduzida. Já a outra vai cumprir uma pena ainda maior porque vão ser reveladas mais provas. Antes do surgimento da lei, era mais vantajoso para ambos permanecerem em silêncio. Com ela, tornou-se mais interessante ser o primeiro a falar, já que um dos interrogados não pode ter certeza de que será implicado pelo outro.

A partir de 2013, a Lei das Organizações Criminosas detalhou melhor uma das variantes da delação usada para combater quadrilhas. Neste caso, ela se chama colaboração premiada. Desde o início da Lava Jato, 49 pessoas envolvidas no esquema de corrupção de Petrobras fecharam acordos do tipo.

Pela lei, os delatores devem identificar outros membros da organização e detalhar os crimes praticados por eles. Também devem revelar a hierarquia e a função de cada um. A colaboração também prevê prevenir crimes que possam vir a ser praticados e devolver o dinheiro desviado. Segundo os procuradores da Lava Jato, o instrumento permitiu acelerar as investigações e encontrar outras provas.

Ataques à delação

Em sua crítica, Renan afirmou ser contra o acerto de delações quando o suspeito está preso. Já a presidente Dilma Rousseff atacou a própria natureza das delações quando foi citada por um executivo, invocando uma espécie de noção de desprezo por "dedo-duros". "Não respeito delator", disse em junho de 2015.

A ofensiva contra a delação não é apenas verbal. Em março, o deputado Wadih Damous (PT-RJ) apresentou projeto estabelecendo que as delações possam ser apenas negociadas quando o suspeito estiver em liberdade. Segundo ele, no atual modelo "prende-se para forçar a depoimento".

Antes disso, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI) apresentou projeto que prevê que o delator deve revelar tudo o que sabe no primeiro depoimento, sem possibilidade de adendos. Se o projeto estivesse em vigor, a delação que implicou o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não seria possível. O lobista Júlio Camargo, que acabou citou o deputado pela primeira vez, não disse seu nome nos primeiros depoimentos. Segundo sua advogada, à época ele estava com medo. Fortes é um aliado de Cunha.

Membros da força-tarefa da Lava Jato afirmam que se não fossem os acordos de colaboração, a Lava Jato não teria alcançado evidências de corrupção para além daquelas envolvendo Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras, preso em março de 2014. Em setembro do mesmo ano, Costa fechou um acordo e passou a listar o nome de diversos políticos, entre eles Renan Calheiros. Os procuradores afirmam também que, das 49 pessoas que fecharam acordos de delação, apenas 12 estavam presas quando falaram. Sérgio Machado, que grampeou Renan, não estava na cadeia quando negociou sua delação.