Adeus R.E.M
22 de setembro de 2011Dignidade e longevidade são palavras difíceis de colocar na mesma frase quando se fala de bandas que estão por décadas na ativa. Saber a hora de ir embora e evitar o fim de festa cheio de ilusões e glórias do passado: foi assim que o R.E.M. resolveu terminar uma carreira brilhante. "Encerramos com um grande senso de gratidão, finitude e perplexos com tudo que alcançamos", diz o comunicado no site oficial.
Para quem acompanhou a banda somente a partir do sucesso comercial no final dos anos 80, talvez seja difícil entender a importância do R.E.M. para a sonoridade do rock alternativo nos anos 80 e 90.
O R.E.M. transformou pós-punk em indie rock. A cena alternativa americana no começo da década de 80 era dominada pelo hardcore, e a banda adicionou à mistura um pouco de garage rock e principalmente pop. Com atitude punk e letras inteligentes e sensíveis, o R.E.M. soava tradicional e moderno. Um equilíbrio impressionante entre vitalidade e maturidade que acompanhou a banda desde seu single de estreia, Radio free europe, lançado em 1981.
Movimento rápido dos olhos
Com integrantes nascidos em diversos lugares dos Estados Unidos, o R.E.M se formou em Athens, Georgia, em 1980, quando Michael Stipe, Peter Buck, Mike Mills e Bill Berry estudavam na universidade local.
O nome da banda se refere ao movimento rápido dos olhos (rapid eye moviment), um estágio do sono com alto funcionamento dos neurônios, geralmente associado ao sonho.
O primeiro álbum, Murmur, foi lançado em 1983 e produzido num processo de negação, evitando incorporar à música clichês de rock como solos de guitarras e os então populares sintetizadores, tudo em busca de um sonoridade atemporal. O disco teve uma repercussão excelente entre a crítica na Europa e nos Estados Unidos, mas as vendas não impressionaram.
Nasceu assim o primeiro clássico da banda, que passou os próximos cinco anos fazendo turnês e a cada ano lançava um excelente disco. Mesmo sem superar a originalidade da estreia, a banda definiu sua sonoridade e continuou progredindo com discos como Lifes rich pageant e Document, esse com os primeiros sucessos The one I love e It's the end of the world as we know it.
Imagens e palavras
O sucesso da banda foi gradualmente aumentando, e em 1991 não foi só Nevermind, do Nirvana, que ajudou a mudar a música alternativa para sempre, entrando sem pedir licença no mainstream. Nesse mesmo ano, com as paradas dominadas pelo pop e dance music comerciais, o R.E.M lançou Out of time.
O disco vendeu mais de 12 milhões de cópias no mundo todo e Losing my religion foi a música que redefiniu a carreira da banda. A mágica não estava apenas no uso de instrumentos como órgão e bandolim, mas também no vídeo dirigido por Tarsem Singh. Inspirado em Caravaggio e Tarkovisky, o vídeo era um sonho poderoso e melodramático que ajudou a definir não só a sonoridade como também a imagem da banda.
No ano seguinte, o R.E.M. lançou seu último clássico, Automatic for the people. Apesar dos temas sombrios, o álbum foi um grande sucesso comercial. O videoclipe se incorporou como parte vital do processo de trabalho da banda. Vídeos como os de Everybody hurts e Nightswimming transformaram as músicas em obras-primas da solidão e da incompreensão humanas.
Assim o R.E.M continuou, e passou os anos 90 lançando discos interessantes, irregulares, mas sempre com algo para dizer. A banda também sempre deixou clara sua liberal posição política, se envolvendo em campanhas e shows beneficentes a favor de causas ambientais, direitos humanos e antidiscriminação.
A ultima década viu a banda lançando uma série de discos regulares, mas dignos. O R.E.M nunca envergonhou seu fãs. Sua influência continua viva até hoje em bandas como Radiohead e Coldplay.
O fim do R.E.M não é um motivo para tristeza. O seu legado cultural e o senso de saber parar na hora certa são motivo de alegria. Como a banda conclui no final de seu comunicado: "Para todos que já se sentiram tocados pela nossa música, nossos mais profundos agradecimentos por nos ouvir".
Os fãs é que agradecem.
Autor: Marco Sanchez
Revisão: Alexandre Schossler