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História

Onde o passado sombrio da Alemanha está armazenado

Emmanuelle Chaze
5 de setembro de 2019

Os Arquivos de Arolsen abrigam mais de 50 milhões de documentos sobre vítimas do nazismo e alguns de seus pertences. A repórter Emmanuelle Chaze visitou o local e descobriu o destino de seus familiares na Segunda Guerra.

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Objetos e documentos de vítimas do regime nazista guardados nos Arquivos de Arolsen
Parentes de vítimas da Segunda Guerra podem pesquisar e recuperar objetos de parentes perseguidos pelo regime nazistaFoto: picture-alliance/dpa/U. Zucchi

Bad Arolsen é uma pequena comunidade escondida numa região bucólica do estado alemão de Hessen, no centro da Alemanha. Na tranquila e pitoresca cidade ficam os Arquivos de Arolsen, cujo nome oficial é Centro Internacional de Perseguição Nazista, antes conhecido como Serviço Internacional de Rastreamento (ITS).

Algumas semanas atrás, antes do 80º aniversário do início da Segunda Guerra, acompanhei a DW na gravação de uma reportagem nos Arquivos de Arolsen, que abrigam mais de 50 milhões de documentos sobre o destino de cerca de 17 milhões de vítimas do regime nazista. Mal sabia o que me esperava quando fui lá naquele dia, mas, depois de conhecer um homem que tinha ido buscar os pertences pessoais de seu pai, decidi examinar mais profundamente a história da minha família na esperança de descobrir algo novo.

Jean-Paul Garcia, um francês de 60 anos de idade, veio de um vilarejo perto de Bordeaux para receber alguns objetos pessoais que pertenciam ao seu pai, Antonio Garcia, um prisioneiro de guerra. Ele havia fugido do regime de Francisco Franco na Espanha para apoiar a Resistência Francesa. Ele foi preso pelos nazistas em 1944 e enviado a um campo de trabalhos forçados.

Ao final da guerra, aproximadamente cinco mil objetos foram provisoriamente colocados sob a vigilância primeiramente da Cruz Vermelha, depois dos Arquivos de Arolsen. Relógios, joias, cupons, cartas e fotografias provenientes de campos de concentração ou de centros de transferência de prisioneiros, principalmente Neuengamme e Dachau. A central dos Arquivos de Arolsen não é proprietária legal dos objetos. A instituição apenas os salvaguarda na esperança de devolvê-los a seus donos por direito.

Atualmente, cerca de três mil bens pessoais de ex-detentos estão armazenados em Bad Arolsen, e uma equipe de pesquisadores trabalha incansavelmente para localizar e contatar os parentes das vítimas. A campanha Memória Roubada foi lançada em 2016 para redobrar os esforços de restabelecer os objetos pessoais. Com a ajuda de voluntários, centenas de famílias de vítimas puderam ser localizadas.

Um desses casos foi o de Garcia, cuja visita aos Arquivos de Arolsen foi muito emocionante – para ele e sua esposa, mas também para a equipe que conseguiu rastreá-lo para devolver os bens perdidos de seu pai: um relógio, um cupom de racionamento alimentar e um anel.

Arquivos de Arolsen guardam milhões de documentos e milhares de objetos de vítimas da Segunda Guerra
Os Arquivos de Arolsen abrigam mais de 50 milhões de documentos sobre cerca de 17 milhões de vítimas do nazismoFoto: ITS

Evidência contundente

Os nazistas fizeram de tudo para apagar, no final da Segunda Guerra, os vestígios físicos de seus crimes, mas sucumbiram perante o que a Alemanha possivelmente faz melhor do que qualquer outra nação: a burocracia. Os nazistas simplesmente não conseguiram se livrar de todas as evidências escritas de seus crimes.

Assim, em um antigo armazém à espera de um edifício permanente e mais seguro, prateleiras e mais prateleiras com arquivos de cor cinza e fichas amareladas são a prova dos crimes cometidos pelos seguidores de Hitler desde sua ascensão ao poder até a queda do Terceiro Reich.

Após a gravação naquele lugar solene e sombrio, e entusiasmado pela emoção do encontro com Garcia, perguntei se poderia verificar se havia algum traço de meus tios-tetravôs, sobre os quais sabia vagamente terem sido trabalhadores forçados durante a Segunda Guerra.

Devo dizer que sou da Alsácia, uma região que por muito tempo alternou entre domínio francês e alemão – e cuja história é, portanto, particularmente complexa quando se trata da Segunda Guerra. A maioria das famílias tem um passado doloroso – seja porque seus membros foram exilados, enviados para campos de trabalhos forçados ou porque colaboraram com os nazistas.

E, no entanto, em minha própria família, embora nada nunca tivesse sido dito de uma maneira ou de outra, eu sempre tive receio de cavar fundo demais por medo de descobrir algo feio sobre meus antepassados. Mas a arquivista em Arolsen se mostrou muito solícita em me ajudar. Ela pesquisou o sobrenome de meus parentes, um sobrenome peculiar que começa com a letra B e com poucas ocorrências na França.

Respostas do passado

Nem um minuto depois, ela ergueu os olhos da tela: os Arquivos de Arolsen digitalizaram mais de 13 milhões de documentos que agora são facilmente pesquisáveis no site. Basta digitar um nome ou um tópico. "Aqui estão...", disse ela com um sorriso. Ela então checou o resultado no fichário e finalmente tirou uma pequena pilha de cartões no arquivo com a letra B.

Para ela, não passa de rotina. E, de certa forma, isso não é novidade para mim: passei anos lendo correspondências particulares dos séculos 17 e 18 antes de me voltar para o jornalismo. Mas desta vez é diferente: eu sei que com aquele material ela pode vir a abrir uma porta para o meu passado.

"Veja: Ludwig, Anton, Pantaleon, Xaver... eles estão todos aqui!", disse ela no momento seguinte. Eu os conheço, exceto que essa é a versão germanizada de seus nomes originais: Louis, Antoine, Pantaleon e Xavier. Enquanto fazia pesquisas genealógicas anos atrás, descobri que eles haviam sido enviados para a Alemanha, sem nunca saber o porquê. Mas a arquivista tinha a resposta: "Temos registros! Espere um momento."

Ela abriu um arquivo grosso com registros copiados de minutas de julgamentos. Louis, junto com alguns amigos, foi julgado por ser comunista e ter distribuído folhetos. Isso lhe rendeu seis anos de prisão, a partir de 15 de abril de 1943.

Seus irmãos, cujas minutas de julgamento não encontrei, foram presos em novembro daquele ano e condenados a diferentes sentenças por terem participado de atividades de alta traição – nomeadamente, escutar uma rádio de Londres. Os três foram presos em Bruchsal, no estado de Baden-Württemberg.

Tirei fotografias de todos os documentos e já estava pensando em contar à minha família tudo o que havia descoberto quando a arquivista disse – para minha surpresa – que também havia muitas outras ocorrências do sobrenome em cartas – todas vindas da Polônia – e que alguns se estabeleceram em Berlim antes de serem deportados de volta para a Polônia.

Será então que Berlim, a cidade para a qual me mudei há quase uma década, também abrigara alguns parentes distantes que foram mortos pelos nazistas?

Ao ir para os Arquivos de Arolsen naquele dia, eu não fazia ideia de que encontraria pistas sobre o passado da minha própria família. Mas, nessa curta visita, aprendi mais do que jamais soube e descobri que ainda há muito a ser explorado.

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