Há quem compare Angela Merkel a Günther Schabowski: no final da hoje lendária entrevista coletiva que ele deu em 9 de novembro de 1989 para falar sobre as novas leis de viagens ao exterior da Alemanha Oriental, Schabowski também não se deu conta do que acabara de pôr em movimento com suas declarações. Como resultado, naquela noite caiu o Muro de Berlim, embora o planejado fosse um processo burocrático nos moldes clássicos alemães, com requerimento, carimbo e burocracia.
Agora foi a vez de a chanceler federal alemã, sentada numa poltrona de couro pink a convite de uma revista feminina, falar que cogitava mudar sua atual postura sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo – mas no futuro, ou seja, depois da eleição de setembro. E, de repente – ou menos de quatro dias depois –, a Alemanha tem uma nova lei que torna exatamente isso possível.
Trata-se de uma revolução social, como muitos alardeiam? Claro que não! Desde 2001, gays e lésbicas podiam fechar uma chamada "união civil registrada", que foi gradativamente sendo equiparada – desde os benefícios fiscais até questões de herança – ao casamento. Apenas a adoção de crianças pelo casal é o novo direito decisivo para os casais do mesmo sexo, como também o nome da instituição – casamento em vez de união.
A verdadeira revolução já aconteceu bem antes, e não foi na política, mas na sociedade. Que até em famílias católicas do interior – a personificação mais exata do conservadorismo alemão – parceiros e parceiras do mesmo sexo possam ser levados para as festas de aniversários redondos da vovó seria realmente inimaginável há 40 anos. Mas hoje é normal, em muitos casos. Da mesma forma que alugar um apartamento para um casal gay ou lésbico. Ou que os colegas de trabalho saibam. Ainda na década de 1980, isso era risco de chantagem. Agora várias pesquisas de opinião mostram que a maioria dos alemães aprova a nova lei.
Mesmo assim não se pode falar de "um casamento para todos", como se alardeia em todo o país. A instituição do casamento foi aberta para os casais do mesmo sexo – não para grupos de mais de duas pessoas, como foi o caso recente da Colômbia, nem para o matrimônio com parentes, crianças, animais ou também consigo mesmo, com o intuito de obter vantagens fiscais. Podem me chamar de polemista ou homofóbico por causa dessa lista, como acontece com quase todo mundo que se posiciona de forma crítica perante a nova lei. Mas duas observações me devem ser permitidas.
Primeira: a mudança social continua. Assim como meus avós jamais teriam imaginado essa lei, também nós não sabemos o que a alegada maioria vai considerar oportuno em 50 anos. Talvez também algo que nós, hoje, consideraríamos incompatível com os nossos valores. Surpresas não estão descartadas.
Segunda: um privilégio – e é justamente disso que se trata quando a Lei Fundamental (Constituição alemã) coloca o casamento e a família sob a proteção especial do Estado – só é um privilégio quando ele não vale para todos. Entre muitos daqueles que hoje vivem dentro da "atual" definição de casamento e família, cresce a preocupação de que não se trata de eliminar discriminações, mas de eliminar privilégios. Porque, afinal, a política familiar custa muito dinheiro ao Estado. E, se olharmos para o desenvolvimento demográfico, não está trazendo nenhum benefício perceptível.
No final, restam estas duas perguntas:
Primeira: o que realmente se passa na cabeça de Angela Merkel? Uma mulher que, sem necessidade, coloca de uma hora para a outra a questão do casamento gay na agenda política e em seguida mostra, com o seu voto, que ela mesma não mudou de posição. Pessoas de valores conservadores na União Democrática Cristã (CDU), partido de Merkel, e sua legenda-irmã bávara, União Social Cristã (CSU), olham confusas para a chefe alemã de governo. Em todos os obituários, Helmut Kohl foi elogiado por se manter fiel aos seus princípios. Será que Merkel tem princípios?
Segundo: a nova lei vai passar pelo Tribunal Constitucional Federal? Porque uma coisa é certa: haverá uma queixa. Uma década atrás, a principal corte alemã definiu claramente o casamento como uma relação entre homem e mulher. Assim, a nova lei seria inconstitucional. Mas também veredictos dos juízes do tribunal de Karlsruhe já passaram por mudanças ao longo do tempo. Como diz o ditado alemão: "No tribunal e em alto mar, está-se nas mãos de Deus!" Surpresas não estão descartadas.