Moscou, Praça Pushkin, domingo 25 de fevereiro de 2017: durante horas, a reivindicação "Rússia sem Putin" ressoa em meio à capital. Durante a passeata em homenagem ao crítico do Kremlin Boris Nemtsov, assassinado há dois anos, um coro de milhares também entoa "Deixem em paz os tártaros da Crimeia!".
A polícia assiste, não intervém, deixa acontecer. A cena se repete em São Petersburgo, Níjni Novgorod, Novosibirsk. Ninguém é preso, ninguém é arrastado para fora das manifestações.
Ao mesmo tempo, em Barnaul, Sibéria, Ildar Dadin é libertado. Ele foi o primeiro preso político a pagar um ano e meio numa colônia penal por transgredir as restrições legais ao direito de reunião. Injustamente, terminam por declarar as autoridades. Dadin poderá ter direito a ressarcimento moral e material. Ele pretende continuar lutando, pelos direitos dos detentos, contra a tortura nas prisões.
Ecaterimburgo, nos Urais, igualmente no fim de semana: o oposicionista Alexei Navalny faz campanha eleitoral, cercado de gente jovem. Ele define o Kremlin como "um grupinho de camaradas mafiosos que vivem como xeiques e reis", quer combatê-los e se tornar presidente da Rússia, já em 2018. E afirma que ninguém poderá impedi-lo.
Coincidência? Ou de repente a primavera chegou à Rússia, em pleno fim de fevereiro? A primavera política?
Não. O país permanece frio e fechado. A passeata em memória de Nemtsov estava proibida de passar pelo local do assassinato do dissidente, ou seja, a ponte que leva à Praça Vermelha. Tal proximidade do Kremlin é demais para as autoridades. Em vez disso, à noite homens uniformizados destroem o memorial improvisado junto à ponte, onde durante o dia outros depositam flores.
Dadin é libertado porque a Justiça russa só reconhece formalmente os seus erros: erros no processo, mas não na legislação. A lei continua valendo, e os cidadãos da Rússia seguem temendo ir parar atrás das grades, caso protestem contra o sistema Putin.
Quanto a Navalny, é pagar para ver quanta liberdade de ação lhe será concedida. O Kremlin ainda não se posicionou em relação a ele. O inimigo da corrupção ainda pretende lutar por seus direitos constitucionais, apesar de ter sido condenado por suposta criminalidade econômica. Pois basta um pequeno, insignificante mesmo, pretexto, para que ele se veja novamente atrás das grades. E aí acabou-se a campanha eleitoral de Alexei Navalny.
É bem mais cômodo para os poderosos deixar alguns milhares marcharem pacificamente no centro moscovita, protestando contra um dos mais descarados atentados políticos dos tempos atuais. Mais cômodo do que dispersar com violência esses mesmos milhares, reforçando assim a imagem de um brutal Estado policial.
É bem mais cômodo liberar um oposicionista – afinal de contas, após um ano e meio de colônia penal –, o qual, com o seu destino, chamou a atenção da opinião pública por todo o mundo, que foi torturado. Mais cômodo do que continuar torturando esse homem no cárcere, horrorizando o mundo com as péssimas condições nas prisões russas, com sua desumanidade e brutalidade.
É muito mais cômodo manter a impressão de democracia, tolerando como candidato presidencial o único oposicionista de verdade do país. Mais cômodo do que mandar prendê-lo imediatamente. Por enquanto.