Opinião: Missão cumprida no México? Longe disso
A notícia se espalhou como um rastilho de pólvora pela imprensa. Tão espetacular como a fuga, há seis meses, foi a recaptura. Ao tentar escapar pela rede de esgoto de Sinaloa, Joaquín "el Chapo" Guzmán, o traficante de drogas mais procurado do mundo, foi preso neste 8 de janeiro pela Marinha do México e pela DEA dos Estados Unidos. Sem dúvida, a história desse homem com predileção por túneis está destinada a virar filme.
Ele mesmo trabalhava, segundo a imprensa, num roteiro autobiográfico. Agora ele não poderá mais ser o ator principal, mas, de sua cela na prisão de segurança máxima de Almoloya, poderá acompanhar a estreia, nesta semana, da primeira parte de A fuga do século. Ele poderá fazer suas críticas e sugestões ao diretor – será uma saga de quatro capítulos, que, quem sabe, poderá ter alguns mais.
Os Estados Unidos pediram há muito tempo a extradição do "Chapo", que acusam de assassinato, sequestro e contrabando de drogas. A imprensa mexicana especula que pode demorar muito até que a extradição aconteça, se é que algum dia acontecerá. É tempo suficiente, portanto, para uma terceira fuga e alguns capítulos extras na saga do traficante. Ou, em outras palavras, mais circo para o público nacional e internacional. Por hora, isso é tudo que se tem.
Numa breve declaração à população, o presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, chamou a captura do fugitivo de "vitória do Estado de Direito e uma ação contra a impunidade". Ele acrescentou: "Hoje, nossas instituições demonstraram mais uma vez que os cidadãos podem confiar nelas."
"El Chapo" não é mais do que um nó – grande, sem dúvida, mas apenas um entre muitos – no emaranhado de um país cada vez mais dominado pelos traficantes. Sua recaptura é certamente um fato positivo, mas não muda nada: não diminui a venda de drogas, não reduz o número de sequestros, tampouco a violência.
Se o governo mexicano quiser realmente recuperar a confiança dos cidadãos em suas instituições, serão necessárias ações verdadeiras contra a impunidade. Ele poderia começar esclarecendo os acontecimentos de 30 de junho de 2014 em Tlatlaya, de 26 de setembro de 2014 em Ayotzinapa e de 6 de janeiro de 2015 em Apatzingán. Não são nem os mais obscuros nem os mais sangrentos, mas são os mais recentes e um bom início para enfrentar os crimes contra a humanidade que seguem impunes.
São necessários esforços muito maiores para superar o desprestígio do governo mexicano e recuperar o apoio de um povo cuja maior esperança é que se ponha um fim a essa longa saga de sangue. Só então será possível dizer "missão cumprida!".